A neta do vilão

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      A parte interna do castelo está em uma quietude tão grande que nem mesmo parece que uma guerra está ocorrendo lá fora. O saguão de entrada está fortemente iluminado pelas luzes do dia, que atravessam as imensas portas de vidro. Ele é tão amplo, tão vazio, que me faz sentir pequenininha. Há duas escadas longas, uma em cada extremidade da sala, que dão no mesmo lugar. Hellena, ofegando, vira-se para mim.

      — Emma — diz ela. — Temos que ir rápido. Antes que a guerra chegue aqui!

      Ela olha em torno, respirando pesadamente. Deve estar tão impressionada quanto eu — não é todo dia que se entra em um castelo, afinal.

      Antes que eu possa dizer qualquer coisa, no entanto, Hellena agarra meu pulso e recomeça a me arrastar como um saco velho, suas unhas beliscando minha pele. Eu até protestaria, mas estou ocupada demais tentando não tropeçar nos degraus e cair, já que eu sou um desastre ambulante. Na primeira curva da escada, mais ou menos pelo meio dela, avisto duas formas distantes — seus rostos colados na janela, suas mãos em concha aos lados do rosto e palavras aleatórias lançandas ao ar. Hellena hesita por um instante, mas então retoma seu rítmo, me levando consigo.

      Eu só constato que se trata de Will quando estamos a uns dez degraus de distância dele. A outra pessoa, porém, é uma garota que eu nunca vi na vida.

      — Ei! — grita Hellena para ele, subindo mais devagar. Will se afasta da janela e olha para baixo, diretamente para nós. A menina aparece por trás dele. — Ei, seu monte de merda! O que faz aqui?

      Will espera até cobrirmos a distância entre nós para responder. Quando chegamos, ele revira os olhos.

      — Ah, eu estava vendo como anda o movimento por aqui. Dua lindo, não? — ironiza. — É claro que estou me escondendo, sua tapada!

      Hellena lhe recompensa com um soco no braço, fazendo-o gemer.

      — Você é um covarde, William Dill Bouringor! — acusa ela, apontando para seu peito. A colega de Will arregala os olhos, assustada. — Seu irmão está morto! Ele morreu lutando! E você só fica se escondendo o tempo inteiro.

      Meus olhos se dirigem para a menina. Eu não tenho ideia do que ela faz aqui, ou de quem ela é. Eu naturalmente nunca a vi em qualquer outro momento da minha vida — só posso dizer que ela é nova demais e parece frágil demais para uma guerra. Seus cabelos azuis-elétricos caem como ondas pelas suas costas, com uma tiara caríssima sobre eles. Seus olhos grandes e pretos possuem longos cílios, e mudam de um lado para o outro tomados de terror. Seu rosto é fino e delicado, como porcelana, e ela é muito miúda, me deixando pensar que não pode ter mais que treze anos. Suas roupas são finas e esvoaçantes, mas não transparentes, e os braços magros estão adornados por jóias.

      — O que eu podia fazer? — protesta Will, num fio de voz, voltando as palmas das mãos para cima. — Que eu saiba, telepatia é inútil no campo de batalha e, embora eu tenha outros talentos, não sei usá-los! E eu perdi minha espada enquanto corria dos dragões! E, mesmo que não tivesse perdido, eu sempre fui péssimo com ela...

      Alterno olhares entre ele e sua nova amiga.

      — Mas o que faziam olhando pela janela? — gesticulo. —  Tipo, como se estivessem assistindo a um jogo de futebol? E... quem é essa menina?

      A garota desce um degrau, parando ao lado de Will. Ela está desconcertada, mas se apresenta mesmo assim.

      — Desculpe. Meu nome é Isie Hogfword, filha da princesa Oliz e neta do rei Vindre...

      Hellena voa na direção da menina tão rápido que mal consigo segurá-la. Ela se debate, tentando agarrar pescoço dela, mas Will se coloca entre as duas. Isie recua, apavorada.

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