O duelo

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      Estar aqui nesse porão antigo e empoeirado é infinitamente melhor que passar meus dias e noites naquela caverna. Os guardiões são geniais, lutam como bons guerreiros e controlam perfeitamente bem seus dons. Não posso dizer a mesma coisa de mim. O fogo não me obedece como gostaria e já fui autora de inúmeros incêndios — nada que Jayssa não pudesse resolver. Demmie ficou responsável por treinar-nos com armas. E, céus, eles têm um monte delas! Punhais, espadas, escudos, adagas, facas, arcos, flechas e aljavas... Demmie domina tão bem arco e flecha que parece que foi treinada para isso sua vida toda. Vedir luta muito bem corporalmente. Ele conhece golpes impressionantes, é como se fosse tão leve quanto uma pluma. Todas as vezes que ele e meu irmão estão lutando é inevitável cair na gargalhada. Giroy trabalha com nossas mentes. Manipulando nossos sentidos, obrigando-nos a usar nossos poderes... não de uma maneira má. De uma maneira instrutiva. Já a luta com Jayssa é para aperfeiçoamento nos nossos dons. Nada a atinge, pois ela não é sólida como uma pessoa normal, apesar de parecer. Qualquer feitiço lançado nela passa direto, por isso podemos investir contra ela sem medo de machucá-la.

      Depois de três semanas, fazemos coisas surpreendentes. Somos... selvagens.

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      Hellena me encara com fúria no olhar. Seus cabelos estão completamente descoloridos, a pele anormalmente pálida, os lábios arroxeados e os olhos inteiramente negros. Sua roupa normalmente é um vestido vermelho desbotado, mas agora há cristais presos em sua superfície. Ela está com aquela aparência, a que geralmente me deixava desconfortável, mas agora não mais. Eu também estou bizarra, sei disso. Assim como todas as vezes que usei meu dom. Os cabelos chamuscam, alterando do vermelho ao laranja e logo ao amarelo. O vestido roxo está faiscando, mas ele nunca queima de fato. A pele está avermelhada, os olhos vermelhos como os de Demmie.

      Gelo e fogo em um duelo perigoso.

      Os outros formam um círculo em volta de nós, observando atentamente. Tudo o que esperamos é um sinal para começarmos — e Doquo, nosso avô, dá esse sinal. Ele assobia alto o suficiente para nós duas ouvirmos.

      Detecto um sorriso maldoso surgindo no rosto cristalizado de Hellena.

      — Pronta, priminha?

      — Eu já nasci pronta. — respondo, reunindo uma bola de fogo na minha mão.

Projetar uma bola de fogo não é tão simples. Posso sentir as fisgadas nas pontas dos dedos enquanto a energia flui pelo meu corpo, agitando minhas veias; eu teria ficado exausta antes, não fosse o treinamento intensivo e, talvez, teria pensado dez vezes antes de jogar aquilo em Hellena. A Emma de agora, no entanto, sequer hesita em tomar impulso e lançá-la, como se estivesse jogando basebol.

      Ela vai em direção à Hellena, a toda velocidade, chamuscando como um meteorito. Porém, quando está a centímetros de chocar-se contra seu rosto e desfigurá-lo, ela a para. Estreito os olhos, incrédula. Me surpreendo com o que vejo.

      Cristais de gelo envolvem minha bola de fogo e formam uma camada tão grossa e pesada, que ela cai no chão como uma inocente bola de gelo.

      — Fogo não deveria derreter gelo? — franzo o cenho, pensando alto.

      — Você é boba.

      Ela investe contra mim. Vem correndo e me dá uma rasteira. Eu caio na grama, matando todas as que toco, mas me levanto com agilidade. Ela já vem com socos e golpes, porém bloqueio grande parte deles. Chuto sua canela, e ela geme. Tenta agarrar meu cabelo, entretando o toque a faz recuar. As chamas ferem sua mão e ela se revolta ainda mais. Com mais energia ainda, Hellena luta ferozmente, corpo a corpo, e no fim é capaz de me imobilizar no chão.

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