Estou em uma câmara escura cercada de névoa. O coração martela no peito e eu quase me esqueço de como respirar. Não consigo ver nada além de um palmo a frente do nariz, e não sou capaz de dar um passo sequer.
— Eu sei que estou sonhando — falo, surpreendendo-me com o volume da minha voz. — Quem está aí?
Uma gargalhada maldosa faz os pelos da minha nuca se eriçarem. Giro nos calcanhares, procurando a fonte da risada, mas ela parece vir de todos os cantos da câmara. Cerro os punhos, me dando conta de que há apenas um manipulador na face da terra que invadiria minha mente para rir da minha cara.
— Birc.
— Ah! — ele diz, preguiçosamente. Sua voz zombeteira ecoando pela câmara, tornando impossível saber de onde vem. — Presumo que já estava doidinha de saudades de mim, não é mesmo?
Sinto a raiva tomando conta de mim. Encaro a névoa com uma vontade insana de encontrar Birc e socar seu rosto até os punhos sangrarem.
— O que você quer?
— Ora, princesa — detecto a nota de ironia na sua voz. — Tanto tempo sem me ver e é assim que me recebe? Bem. O que realmente acha que eu quero?
Tranco a mandíbula. Lágrimas quentes turvam minha visão e descem pelas minhas bochechas.
— Me deixa em paz — murmuro. — me deixa em paz, por favor.
— Ah — ele sussurra tão perto do meu ouvido, que me sobressalto. Mas ele não está aqui. Não fisicamente. — Vejamos como você muda de estratégia rapidamente. No nosso primeiro encontro, você parecia bem convicta quando me mandou ir para o inferno. Ainda que eu não saiba onde é esse tal inferno, devo supor que não é algo muito bom. E, agora, veja só. Chegamos ao ponto de implorar para que eu não mexa com você.
Minha boca tem um gosto amargo, então engulo em seco. Eu detesto Birc ainda mais que detesto Vindre ou Arismir. Confesso que tenho ainda mais medo dele do que dos outros, afinal, Birc é o sincero; é ele quem vem com as piores notícias, e é só ele que pode nos torturar a quilômetros de distância. Tudo o que eu quero, do fundo do coração, é não vê-lo nunca mais.
— VÁ EMBORA! — esbravejo. — VÁ EMBORA, AGORA!
Algo semelhante a um ronronar se faz ouvir no silêncio da câmara. É tão terrível, tão maldoso, que me faz estremecer. Pisco uma porção de vezes, me esforçando para ver além da branquitude, contudo é impossível. Birc solta outra de suas gargalhadas divertidas, mas maléficas, que geralmente desencadeiam um ódio mortal em mim, mas que dessa vez causa medo — quase pânico.
— Gosto mais de você assim — fala, no seu tom debochado. — No entanto, sinto dizer que não vou embora. Na verdade, eu tenho algumas coisas para te dizer antes.
Reúno toda a coragem e sarcasmo para conseguir me defender. Cruzo os braços.
— Ué, e por que tinha que ser em uma câmara cheia de neblina? — digo, ríspida. — Quer dar uma de supervilão misterioso ou só não quer mostrar seu rosto para eu não me assustar e acordar?
Mal acabo de proferir essas palavras, e já me arrependo. A câmara de neblina desaparece, e dá lugar ao pior cenário do mundo: a aldeia dos lobos; o palco da morte de Stive. O lugar está exatamente como eu me lembrava: carcaças semi-devoradas, troncos tombados cobertos de musgo, roupas em frangalhos recendendo a cachorro molhado e relva baixa manchada de sangue. Meu estômago revira com as nítidas lembranças da batalha com os lobos. Fecho os olhos e abano a cabeça; quando torno a abri-los, encontro Birc sentado de pernas cruzadas, com as costas encostadas em um dos troncos caídos.
VOCÊ ESTÁ LENDO
O país secreto.
FantasyEmma é uma jovem que gosta de fazer coisas diferentes, que fogem do cotidiano e quase sempre espera viver grandes aventuras com os irmãos e primos. Mas em uma tarde que parecia normal, Emma, seus irmãos, primos e amigos- Não necessariamente amigos...