Reencontro-os

125 13 1
                                    

      Depois de uma caminhada chata e exaustiva, chegamos a nosso destino. Eu, como sempre, vou direto para o riacho pegar água, e ele caçar o que comer. Como já disse, não me importo de ficar sozinha. Nessas duas semanas, tenho feito isso com mais frequência — na realidade, até gosto. Me dá tempo para pensar e posso usar a água para camuflar as lágrimas... Larm deve estar certo. Estou carregando mais peso do que posso suportar; sinto que mais cedo ou mais tarde serei obrigada a deixar tudo para trás. Não posso continuar aqui, como se nada estivesse acontecendo — devo ir ao resgate de meus primos, de meus irmãos e até mesmo... bem, Liam não tem muita importância, e talvez...

      Minha mão vai instintivamente para minha boca. É verdade, Liam não possui um dom e, por isso, deve estar morto. Não gosto de pensar assim — não posso. Além dele, ainda tenho que considerar Amélia, por mais que a odeie. Ela também pode ter sido morta. E Júnior. E meus parentes também. Todos.

      Abaixo-me para encher a garrafa, sentindo as lágrimas pinicarem meus olhos.

      — Eles estão vivos, Emma. — sussurro para mim mesma, balançando a cabeça. — Arismir não vai matá-los. Não vai.

      Mas o pensamento é vago demais até para eu mesma acreditar. Hoje, especialmente, amanheci com uma tristeza incontrolável. Juro que poderia, a qualquer momento, pular no riacho e me matar afogada.

      Teoricamente impossível, penso.

      Quando acabo de encher a garrafa e a colocar sobre o solo úmido, uma coisa chama minha atenção. Folhas farfalham atrás de mim, e isso me faz virar o pescoço bruscamente. Meu olhar, agora bem mais atento, vasculha o local, mas nada vejo de diferente além da folhagem agitando-se suavemente com a brisa.

      E, para piorar, está enlouquecendo. Sacudo a cabeça, me levantando e pegando a garrafa.

      Dou dois passos na direção oposta ao riacho. Não vou tomar banho aqui hoje — minha imaginação até pode estar me pregando uma peça, mas uma parte mais racional do meu cérebro diz para me afastar. Pode haver algum animal perigoso a espreita. Não estou em um paraíso, foi o que dissera Arismir. Talvez, a coisa mais sensata que ele disse em anos.

      Quando vou dar o terceiro passo, me detenho. O farfalhar, novamente, soando de algum ponto mais próximo que anteriormente. Minha respiração começa a pesar, e agora estou com medo. Em meu peito, o coração chacoalha. Tento executar meu poder, mas não consigo concentração o suficiente. O barulho se repete e giro nos tornozelos, procurando o que o causara e deparando-me com as moitas muito verdes intocadas.

      — Já estamos procurando há horas! — alguém diz, uma voz masculina preguiçosa estranhamente familiar que não soava tão distante assim.

      Humanos. É só o que consigo pensar. Meu primeiro instinto é correr até Larm, mas algo mantém meus pés cravados ao chão e os joelhos tensos. Talvez a familiaridade daquela voz, o esforço que meu cérebro fazia para identificar exatamente onde eu a ouvira antes.

      — Não seja idiota, não podemos parar um só instante. — uma vozinha fina e feminina diz, impaciente. — A morte se aproxima, 'tá sabendo?

      — Não me trate assim, não tenho culpa. — retruca ele, bem magoado. Seus passos amassando folhas e quebrando gravetos, indicando que eles se aproximam cada vez mais.

      — Querem calar a porcaria da boca? — uma terceira voz, também masculina e mais grave que a primeira, dispara irritado como se já não aguentasse mais estar na companhia dos dois.

      Meu coração acelera mais; é como ser esbofeteada, a realidade cai sobre mim me deixando perplexa. Como pude demorar tanto para reconhecer as vozes? De súbito, uma nuvem parece se abrir em minha cabeça, e o sol está lá, espreitando-me e me iluminando outra vez.

O país secreto. Onde histórias criam vida. Descubra agora