CAPÍTULO 02: O início é sempre uma aventura infantil diante do mundo

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Segure-se
Aguente
Não tenha medo
Você nunca mudará o que aconteceu e o que já passou
Stop Crying Your Heart Out,
Oasis

...

VINTE E SEIS ANOS ANTES

Y A S M I N

Papai acaba de pegar e trazer as malas do carro até a nossa nova casa. Ainda não entendo o porquê da gente precisar se mudar de um dia para o outro — de novo —, mas ele disse apenas que era por causa da mamãe, então não fui contra e me calei como sempre. Quando finalmente comecei a fazer amigos na antiga nova escola, tive que ir embora e esquecer cada um como esqueci todos os outros.

Suspiro enquanto me debruço na varanda e olho para aquele lugar estranho, mas estranhamente bonitinho. É uma casa num campo ou numa fazenda, não sei, mas é realmente bonito. Aqui tem bastante grama, algumas árvores e animais que só via nos livros que a professora lia na escola.

— Não gostou do lugar, meu amor? Parece um pouco triste... — A voz de mamãe me faz olhar para trás e sorrir minimamente, não conseguindo esconder a minha própria decepção, já que ela mesma tinha um olhar preocupado, disfarçado pelo sorriso pequeno.

A cada dia, eu via minha mãe cada vez mais fraca, mas ainda não entendo o porquê... Às vezes ela deixa as coisas caírem do nada, dorme mais tempo que o normal, quase toda semana está fazendo exames em hospitais e toma tantos remédios que me assusto.

Um adulto precisa tomar isso tudo?

Já até perguntei a papai, mas ele só fala que a mamãe não está bem e que precisa de atenção e cuidado, nada mais. Além disso, ele disse que era coisa do trabalho dela, mas já faz alguns meses que ela não está mais trabalhando... Então por que a mamãe não melhorou? Eu só queria ela brincando comigo de novo e não sentada numa cadeira a maior parte do dia.

Faço bico.

— Aqui é bonito, mamãe. Mas ainda não entedi porque saímos de São Paulo... Eu gostava de lá, pensei que vocês também gostassem. — Suspiro, e mamãe vem até mim com um olhar carinhoso e se ajoelha para ficar da minha altura.

Ela segura minhas mãos.

— É complicado, meu amor... O papai acha que aqui em Santa Catarina terão melhores médicos para cuidar da mamãe, entende? — Balanço a cabeça para concordar, e ela sorri, fazendo um carinho no meu rosto. — Mas não se preocupe, está bem? Tenho uma boa impressão desse lugar... Sinto que fará boas amizades aqui.

Faço uma careta nenhum pouco discreta, não acreditando nisso.

As crianças da minha idade costumam dizer que sou estranha, então dificilmente faço amigos. Por que aqui seria diferente?

— É mais fácil o Papai Noel me dar laptop da Barbie do que eu fazer amigos, mamãe. Ninguém gosta de mim. — Mamãe franze as sobrancelhas por eu dizer isso com tanta certeza, mas é a verdade. — As crianças dizem que sou estranha.

— Bobagem! Eles que estão perdendo a menina de ouro que você é, querida. — Ela aperta as minhas bochechas e finalmente sorri de uma forma contagiante, a forma como ela sempre sorria a uns meses.

Eu sentia tanta falta desse sorriso...

Mamãe é a mulher mais linda que já vi! Seus cabelos são cacheados na altura dos ombros e sempre estão soltos. Já é pele, é pouca coisa mais clara que a minha, mas não deixa de ser linda. Por fim, a minha parte favorita dela é o sorriso, mas, nesses últimos tempos, ela vinha sorrindo cada vez menos... As pessoas dizem que somos bastante parecidas, mas às vezes me acho mais parecida com o papai — pelo menos no jeitinho de ser.

Corações & Erros || ✔Onde histórias criam vida. Descubra agora