3-𝙶𝚞𝚊𝚛𝚍𝚒𝚊̃

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Oymyakon -Rússia.

17:30 pm.

Ao colocar os pés para fora do hospital, o frio e sua corrente gelada passam por cada molécula do meu corpo. Contraio-me, apertando meus braços para me esquentar.

— Que frio, como odeio esse lugar. — resmungava a cada passo. Caminhávamos até o carro, e Brian nem se quer brigou pela minha reclamação diária, o que era completamente estranho vindo dele. Deixei passar esse detalhe. Quando fui pegar a maçaneta da porta do carro para abrir, assim que o fiz, ele diz:

— Por que você nunca se mudou? Acho que você teria grandes chances em solos americanos.

Fechei a porta novamente e ficamos ali parados no sereno, pensando sobre seu questionamento, eu do lado do passageiro e ele do lado do motorista, só que ambos de fora do carro.

— Nunca pensei de fato nessa possibilidade. Meio que cresci aqui e tenho minha mãe e irmã. Sinto que tenho um dever a cumprir, tipo um... — ele termina minha frase.

— Um pacto. Sei como é essa sensação. Na verdade, acho que você já reclamou tanto que hoje gosta daqui e não aguentaria viver um centímetro longe dessa cidade. — suas palavras foram como um estalo em meu cérebro, lembrando dos flashes que tive com a Cilia no espelho do banheiro.

— O que você disse? — fico espantado com essa coincidência, queria ter certeza de que ele disse mesmo aquilo.

— Qual parte não entendeu? Acho que é melhor você passar a noite aqui. Vamos voltar. — ele tranca o carro e vai em direção ao hospital, para ao perceber que não estava o acompanhando.

— Jake?

— Acho que estou ficando louco, não consigo conectar as coisas. Porqueeee, que droga. — grito, batendo os braços sobre o capô do carro e vou em direção ao Brian, disposto a contar tudo. Se não, iria acabar indo para um hospício. Não aguentava mais as charadas que o universo tem me dado, mas um impulso dentro de mim resiste em contar a ele. Enquanto ele me encara, esperando alguma resposta, tento diversas vezes falar e não consigo; as palavras simplesmente não saem como eu queria.

— Ei, seja o que for que esteja passando, você sabe que pode contar comigo, né? Vamos superar juntos. — aceno com a cabeça, confirmando que sim, desapontado por encobrir algo do único amigo que tenho.

Brian, sempre com seu jeito acolhedor e caloroso de ser, vem ao meu encontro e me abraça como um pássaro que esquenta seu filhote no inverno. Gosto da sua companhia e de seu jeito estranho de demonstrar afeto.

— Acho que está bom, seus minutos já passaram. — tento me afastar e ele nos balança pulando, espremendo-me com seu abraço de urso.

— Vou gritar por socorro, hein? — ao dizer isso, ele aperta cada vez mais, se divertindo com a situação.

Escuto um som ao fundo; é meu celular tocando. Peço um segundo para ele e verifico de quem veio a chamada, de alguém que nunca cogitei que ligaria para mim um dia.

— Esse dia não poderia ficar mais estranho. — falo ao atender.

— Jake, venha para o departamento agora e não traga o Brian. — nem tive a oportunidade de responder, pois ela já havia desligado. Era a Clark. Agora, como iria sair dessa saia justa com o Brian seria o difícil. Com essa ligação inesperada, algum motivo tinha; preferi não arriscar.

— Quem era? — fico sem reação. "Pensa, pensa, Jake."

— Era o Sr. Helman perguntando como estava. Pediu para dar uma passada lá. — Brian me conhecia demais para saber que estou mentindo. Começo a orar aos céus para que, pelo menos hoje, ele não interprete e saiba das minhas mentiras.

— Ele sabe que você acabou de ter alta, né? — como sou um idiota, um detetive que não sabe mentir.

— Faz assim: vai para minha casa e acalma os ânimos com minha mãe, e eu vou lá averiguar o que é de tão importante. — forço um sorriso engessado.

— Tudo bem, te deixo lá na porta. — quando ele vai andar, paro Brian com minha mão direita.

— Vou pegar um Uber, não se preocupe. — acho que deixei a situação um pouco suspeita, porém não tive escolha, tendo um melhor amigo que é curioso tanto quanto eu. Não é à toa que nos encontramos nessa profissão.

— Tá bom, te espero em sua casa. — ele rebate minha mão que estava o parando sobre o peito e entra no carro desconfiado. Vejo-o ajustar o retrovisor para me ver e aceno, despedindo-me enquanto ele segue seu caminho, olhando para o retrovisor. Agora tenho que pensar em duas alternativas: correr daqui até lá, o que seria percorrer 6 km, ou chamar o Uber e ter que aguardar ele chegar. Mas se for algo urgente, talvez demore. Por fim, decido ir correndo mesmo. Com meu físico, é quase como andar de bicicleta, mas o que incomoda é o frio que passa pelas minhas narinas, queimando a cada corrida que dou. Logo avistei a entrada do prédio do departamento; só havia um automóvel. Presumi que seria da Clark, já que ela às vezes fechava o local.

— Clark! — chamo por ela, mas não obtive resposta. Agacho, procurando fôlego, e a procuro pelo saguão, que estava completamente vazio, com as luzes desligadas. Caminho mais à frente para ver se avisto alguém e, de repente, sinto um chute vindo em minha direção. Cruzando os dois braços para defender-me do ataque, no entanto, a força do chute foi o suficiente para lançar meu corpo contra a parede. Consigo sustentar a queda e manter-me de pé, com os braços alinhados no ponto de defesa. Assim que vou avançar, uma lâmina é apontada para meu pescoço. Estava muito próxima para tentar escapar; foi tão rápido que não consegui prever os movimentos ou notar como essa pessoa chegou tão rápido. Seja quem for, sabia o que estava fazendo.

— Como vocês são estúpidos! Até quando temos que limpar a bagunça de vocês, Petrov? — pressiona a lâmina sobre meu pescoço. Essa voz era inconfundível, mas seus traços estavam mudados. Seus olhos, outrora castanhos, ficaram verdes reluzentes; era possível enxergá-los até mesmo no escuro, de tanto brilho que emanava do seu olhar. Sua veste cobria todo o seu corpo até a cabeça, como um manto; apenas seu rosto era visível.

— Clark?

Jᥲᥒᥱᥣᥲ᥉ d᥆ Tᥱ꧑ρ᥆Onde histórias criam vida. Descubra agora