Capítulo 23

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As duas horas em ponto, toco a campainha.

Raika quem abriu, num sorriso tão singelo e demonstrando tanta alegria em me ver, que me perguntei se era eu mesma que estava diante dela na porta. Me esforço para não olhar para trás.

— Oi Melissa — Fala num tom alegre — Ernest e eu estamos na cozinha fazendo pudim — A forma com ela falou foi engraçada, imaginei que ela estava dizendo a palavra pela primeira vez — Não tenho muito o que fazer aqui, então Ernest me mantém ocupada, me ensinando coisas do seu mundo.

Tive vontade de perguntar se em Andaluz não tem pudim, mas se tivesse devia ter outro nome. Somente sorri solidaria.

— Seu sorriso é lindo — Raika me elogia — Já te disseram isso?

Eu recebendo um elogio da rainha da beleza? Fiquei tão sem graça que ela percebeu.

— Desculpe, eu não queria te constranger, é que me lembro de papai com seu sorriso — ela abaixa os olhos — Já estou começando a sentir saudades de casa — Sua voz saiu um pouco embargada.

— Tudo bem — respondo tentando ser gentil — Eu é que sou muito tímida.

— Vamos à cozinha terminar o pudim? — me olha fraternal.

— Marquei com Leo, uma espécie de treinamento — Eu esperava, sinceramente, que cozinhar não estivesse em seus planos — Onde ele está?

— Na sala do terceiro andar. Quer que eu te acompanhe até lá?

— Não precisa, vá terminar seu pudim com Ernest.

— Então tá. Bom treino Melissa — E se foi para a cozinha.

Quando cheguei a sala de treino, encontro Leo sentado no chão, com as pernas cruzadas, numa espécie de meditação ou transe. Não sabia se devia chama-lo, entrar na sala ou ficar na porta. Ele parecia tão absorto que não quis interromper.

Vi seus lábios cerrados formando um sorriso, seus olhos estavam fechados, mas notei que ele percebeu minha presença.

Melissa — Sua voz doce ecoou na minha cabeça — nós não vamos ensaiar nenhum passo de dança.

Vesti um conjunto que comprei a um tempo atrás, planejando voltar as aulas de dança, que frequentava desde os oito anos de idade. O que abandonei à mais ou menos um ano. Eu gostava das aulas, era variada, englobava vários ritmos, e até pares de dança. Mas quando prepararam uma apresentação da academia, na qual me indicaram como Étoile, desisti. Quando pessoas querem me obrigar a dançar em público, eu pulo fora. A roupa é bem confortável e me daria bastante mobilidade. Como não sabia o que me esperava, então...

Ou talvez sim... Venha aqui e sente-se na minha frente.

Me sento no chão abraçando as pernas e colocando o queixo no joelho. Fico quieta olhando para ele, esperando por alguma instrução, até ficar impaciente.

Mudo de posição várias vezes, até doer as costas, adormecer as pernas e ficar entediada.

Ele não se moveu. Nem um fio de sua sobrancelha.

Sei lá quanto tempo depois, me deito próximo a ele e, já que não havia sinal de que ele iria se mover, aproveito para venerar sua perfeição. Assim, estático, pude admirá-lo como a um quadro. Mirei seus lábios que tem um M desenhado na parte superior e brinquei com isso, é o M de Melissa. Nessa hora ele respirou fundo, sem mover um músculo sequer do rosto, só seu peito movimentou, subindo e descendo e voltando novamente a inércia. Esperei mais alguns minutos para ver se ele abriria os olhos e nada. Ameacei levantar.

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