Capítulo 30

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Só percebi que ainda estava no mundo, quando um toque delicado sobre minha cabeça e uma voz macia ao meu ouvido, me fez reagir à consciência.

— Melissa fala comigo — Era a voz de Raika.

Me senti tão fraca, que nem mesmo parei para pensar em como ela teria entrado em minha casa e nem ao menos consegui sentir o ódio que devia ter nutrido por ela.

— Melissa — Sua voz saiu alarmada e ela se esforçava para me erguer do chão — não acredito nisso. Dois dias... você ainda está com a mesma roupa e parece que não comeu nem bebeu nada por todo esse tempo.

Eu devia ter desmaiado ou entrado em estado de choque, ou quem sabe morrido durante esse período.

Ela me levou até o banheiro e me deixou sentada debaixo do chuveiro enquanto conversava comigo. Eu não falava, não via, nem piscava. Não havia vida em mim. Catatônica.

— Melissa reaja. Eu vim para te ver, estava preocupada com você e com razão. Eu teria vindo antes, mas Ernest não deixou, ele achou que seria melhor você ficar sozinha por um tempo. Se eu soubesse como você está, teria vindo cuidar de você, como cuidou de mim.

Me sinto como uma boneca em frangalhos. A água morna escorrendo pelo meu corpo só torna mais evidente, que a dor ainda não tinha passado. A anestesia mental na qual eu havia mergulhado esses dois dias, estava passando, e comecei a tremer debaixo daquele chuveiro. Raika desligou a água e me enrolou com a toalha me guiando até meu quarto. Sentada na cama eu tremia sentindo um frio que não podia ser normal.

— Hoje é meu aniversário — Ela disse, talvez tentando um assunto mais leve — Ernest fez a comparação dos calendários daqui e de lá e hoje faço dezessete anos. Eu faria uma festa se pudesse, mas o clima não é de festa — enxugou meus cabelos delicadamente.

Eu ainda estava com a mão fechada. Endurecida, segurando algum objeto por todos esses dias. Ela forçou um pouco minha mão, e meus olhos, por reflexo, foram para o objeto. Era o colar que ele me deu. Raika retirou de minha mão jogando o colar para um canto do quarto.

Ela suspirou fundo.

— Jeziel me pediu para te dizer que...

— Não me fale esse nome — Meu silêncio foi rompido quando o soar de seu nome arrancou tudo o que ainda restava do estupor em mim. O que não foi nada bom, pois a dor começava a voltar, tão forte como antes.

Querendo me livrar daquele sentimento, me coloco de pé, tonta pela fraqueza de dois dias sem me alimentar, mas, de repente, hiperconsciente de tudo ao meu redor.

— O que está fazendo aqui Raika? — Pergunto em fúria.

Ela me deu um olhar pesaroso.

— Vá embora! — grito ensandecida.

— Você precisa de cuidados, me deixa cuidar de você — Sua voz amável e carregada de pena, me deu asco.

— Eu não preciso de seus cuidados nem de sua pena!! — berro furiosa. Se houvesse força em mim podia ter avançado sobre ela — Saia da minha frente, saia da minha casa, saia da minha vida!

Ela se levantou rumo a porta do quarto.

— Então... me desculpe por...

— Chega!! — a interrompo — Chega de suas desculpas, vocês não podem simplesmente destruir a minha vida e me pedir desculpas — Minha voz estava se atrapalhando num soluço involuntário, que se formava dentro do meu peito.

— Pensei que nós poderíamos ainda ser amigas — Não entendo o tom na voz dela.

Dou uma risada histérica.

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