CAPÍTULO 20

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POV AURORA

Don Lucca, seus filhos e vários outros soldados nos recepcionaram ao sairmos do jatinho, e sou obrigada a ter que seguir direto para a casa de meu pai quando tudo o que eu queria fazer é ir para a casa de Celeste em Scampia.

Ela só irá chegar amanhã e isso é suficiente para me deixar desconfortável aqui.

Desde quando o lugar que foi meu lar a vida inteira passou a ser "desconhecido"?

Andando pelos corredores da propriedade na qual fui criada, sinto um sentimento de saudosismo e nostalgia, mas ao ver meu pai, o sentimento se esvai. Ver sua noiva ao seu lado só piora as coisas.

Enrugo meu nariz ao olhá-los, a menina tem minha idade. Sei que ela não tem culpa e que ela não escolheu se casar, mas não posso evitar de me sentir ressentida.

— Aurora! — meu pai tem um sorriso no rosto. Evitando demostrar estranheza, finjo que é normal vê-lo sorrir, principalmente para mim.

O homem começa a vir em minha direção e me empertigo no lugar quando ele começa a se aproximar demais. Nunca gostei de sua proximidade, sempre significou que algo ruim estava para acontecer.

Sinto um leve empurrão para trás ao passo que Vicenzo se põe protetoramente a minha frente.

— Giovanni. — ele cumprimenta com um aceno de cabeça.

— Vicenzo. — meu pai replica, o sorriso falso escorregando.

O pai feliz por reencontrar a filha.

Patético.

— Felicitações pelo casamento. — meu marido continua.

— Obrigado. — ele fala e olha para mim. — Não vai falar ou desejar algo para seu pai?

A única coisa que desejo ao meu pai é a morte.

— Desejo boa sorte a sua futura esposa.  — digo desafiadoramente.

— Sua merdinha. — ele murmura.

— Você chamou minha esposa de quê? — o olhar de Vicenzo se torna sombrio, sua voz mais ameaçadora do que jamais ouvi.

Vejo meu pai se encolher em seu lugar, parecendo se lembrar com quem está lidando. Ele não tem poderes sobre meu marido, e consequentemente sobre mim.

De repente, Don Lucca aparece com seus dois filhos, cortando o clima de tensão no ar.

— Vicenzo, Aurora. — ele reconhece.

— Que bom que apareceu Lucca, tenho assuntos que quero tratar com você. — meu marido vai direto ao ponto.

— Algo sobre a Bratva?

— Não, são outros assuntos que devem ser tratados em particular.

Cavalliere se torna desconfiado, realmente Cosa Nostra e Camorra não tem assuntos a tratar sem ser a guerra.

— É claro, vamos ao escritório de Giovanni.

— E minha esposa virá junto. — Vicenzo diz, chocando a todos no recinto, inclusive a mim.

Ele passa o braço ao redor da minha cintura e me pressiona ao seu lado.

— Não envolvemos mulheres nos negócios. — Don Lucca fala.

— Mas ela vai participar desse. — ele força.

Lucca não fala nada, apenas se vira e caminha em direção ao escritório.

— Vamos andando. — Vicenzo sussurra no meu ouvido causando arrepios por todo o meu corpo, e começa a me conduzir ao escritório.

Desde ontem ele não me tocou, mas percebi que ele está muito mais acessível. Parece ter mudado depois de termos conversado.

***

A sala está repleta de tensão. O ar está carregado de cigarros e olhares desconfiados. Acho que nunca estive tão desconfortável em toda a minha vida, o lugar está fedendo e o clima tenso está me deixando nervosa. Vicenzo é o único na sala que não está fumando.

Meu marido está discutindo com Don Cavalliere sobre levar minha irmã para passar um tempo conosco. Eu me mantenho em silêncio, apenas observando a troca de palavras acalorada entre os dois homens de poder.

— Bertocchi, você sabe muito bem que cada membro da minha família é valioso para mim. Por que eu deveria permitir que a caçula de Schiavon vá para a Sicília?

Meu marido, com sua postura altiva e segura, responde com firmeza:

— Lucca, você sabe que esse acordo de casamento é uma união estratégica entre nossas famílias. — não gosto de ouvi-lo dizer que nosso casamento é um arranjo estratégico. É verdade, mas ainda não gosto. — Noemi apenas fortalecerá nossa união. Deixá-la, por um tempo, conosco, demonstrará em ato de confiança.

A expressão de Don Cavalliere endureceu. Ele deu um passo a frente, de aproximando perigosamente de Vicenzo.

— Não me venha com essa história de confiança ou laços familiares. Eu sei que você está tentando se aproveitar dessa situação para fortalecer seu poder sobre a Camorra. Sua ambição não tem limites.

— Você está errado. Eu me casei com uma mulher da Camorra para criar uma aliança forte e duradoura. Noemi é apenas um passo nessa direção.

— Você realmente acredita nisso? Ou só está fazendo um capricho de Aurora? — meu pai questiona.

— Os interesses de minha esposa também são meus. — Vicenzo não perde o passo.

Don Lucca finalmente recua, soltando um suspiro pesado.

— Giulio sabe que você está fazendo negócios em nome da Cosa Nostra? Até onde sei, você ainda não é o Don.

Vicenzo enrijece ao meu lado.

— Meu pai está ciente de tudo.

Mentira.

— Concordarei em cedê-la por dois sente-se se você nunca mais ousar exigir nada de mim, essa será sua primeira e última vez. Cosa Nostra não irá mais fazer exigências à Camorra.

— De acordo.

— Estarei de olho em vocês. Qualquer passo em falso, qualquer sinal de traição e você pagará caro.

Saímos lado a lado do escritório e digo:

— Obrigada Vicenzo, eu nunca poderei te recompensar por isso.

Ele acena com a cabeça e depois seguimos em direção a garagem, os seguranças já esperando do lado de fora. Entramos no carro e começamos a ir para o hotel. Apesar da aliança, Vicenzo não confia em ficarmos na casa do meu pai.

MERCILESS HEARTOnde histórias criam vida. Descubra agora