30 - Encaixados

67 11 1
                                    

Sem mais conseguir me conter, eu o abracei. Foi um abraço longo, apertado, quente e protetor. Eu queria que ele sentisse que realmente valia a pena, que sentisse todo o carinho que não lhe dei, todo o cuidado que nunca teve, todo o amor que merecia. Enquanto me dava para ele, tomava dele o que faltava em mim. O calor dele me preenchia, me completava, e eu senti que talvez, se ele me aceitasse, eu poderia voltar a ser inteiro outra vez. Ele acariciava minhas costas, então movi meu rosto na curva do seu pescoço numa carícia com a minha barba e falei ao pé do seu ouvido.

– Você precisa entender que se fizermos isso, vai ser pra valer, Diego. Não há meio termo pra mim. Não existe uma corda bamba ou topo de muro que eu esteja disposto a andar pra ficar com você. Não vou entrar num armário e me esconder por sua causa, nem vou reprimir ou esconder meus impulsos quando estivermos juntos. Você entende isso?

Ele apenas moveu a cabeça afirmativamente. Eu me afastei e o olhei nos olhos antes de continuar.

–  Eu me preocupo porque você tem essa incerteza impregnada. Eu já vi isso, já convivi com isso. Essa insegurança sob a pele como uma manta de medo. A vida inteira eu acompanhei isso no meu irmão. Você ainda não sabe quem é ou está certo do que quer, e isso me assusta porque eu sei o que quero. Não tenho nenhuma dúvida do que eu quero, Diego. Eu estou apaixonado por você desde o primeiro beijo, na verdade, percebi isso quando você me tocou antes de tudo. Foi a primeira vez na vida que eu senti o que sinto por você. 

Pronto. Falei. Finalmente coloquei para fora e parecia que o ar estava suspenso enquanto eu aguardava o que ele iria dizer.

– E..eu acho que... ok.

Ok, foi meio decepcionante. Mas eu não ia me dar por vencido. Não dessa vez.

– Diego...?

Ele tentou articular algo, depois tentou me beijar, mas desviei o rosto e o segurei com firmeza, forçando-o a olhar para mim.

– Não desta vez, Diego. Preciso saber o que isso significa pra você. Eu acabei de abrir meu coração. Sei o que quero e não vou seguir com isso sem ter certeza.

– Eu quero isso. – ele respondeu depois de um longo suspiro. Não me convenceu.

– O que você quer, Diego? 

Ele revirou os olhos e eu odiava quando ele fazia isso. Abri a boca pra reclamar, mas então ele começou a despejar tudo em cima de mim.

– Porra, Samuel! O que quer que eu diga? Eu quero tudo! Tudo isso! Eu tô pouco me fodendo com o que qualquer um pensa! Esse nunca foi o problema! Ou você acha que um cara que vende o corpo na internet e tira a roupa online pra ganhar dinheiro liga de ter que andar de mão dada com um homem na rua? Não é isso! Nunca foi isso! Eu travei em você desde que te vi na padaria há meses, você ou o seu irmão, que seja, mas pra mim sempre foi você. Eu sempre quis isso, sempre quis entender o que era estar com um homem, e você foi o primeiro! Eu tenho 30 anos e foi você quem me deu meu primeiro beijo, você tem noção? Eu era um BV gay! Você tomou tudo de mim! Meu corpo, minha mente, minha vontade e até o meu noivado! Eu é que pergunto, o que mais você quer?

Senti que ele estava me rasgando ao meio. Tentei dizer alguma coisa mas ele me interrompeu.

– Esse medo que você diz ver em mim não tem nada a ver com sexualidade, com ser gay ou qualquer outro tipo de etecétera-sexual onde a sociedade acha que eu deva me encaixar. Tem a ver com a minha vida inteira lidando com o fato de não ser necessário, não ser imprescindível, não ser suficiente nem pra minha própria mãe achar que valia a pena viver, e a única pessoa que me ajudou a entender que eu merecia qualquer tipo de amor, eu deixei ir embora de coração partido hoje à tarde, porque não fui homem suficiente para ser honesto com ela e assumir minha sexualidade desde o início! Você entende isso? Eu não aguento mais isso!

Foi então que ele quebrou. Ele entregou os pontos e desmoronou na minha frente. Lágrimas grossas lavavam seu rosto quando eu o puxei para dentro dos meus braços e chorei com ele. Foi então que eu percebi que ele se encaixava exatamente no buraco que havia em mim, e eu me sentia perfeitamente encaixado no seu caos. Naquela madrugada fria, entendi que não poderia viver sem ele, e talvez ele realmente precisasse de mim, afinal.

– Sempre disse que você valia à pena, Diego. Você vale muito à pena. 

Do lado de cá (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora