Henrique não sabia dizer se se sentia da mesma forma. Naquele dia, quando viu seu pai beijando outra mulher na calada da noite, os sentimentos em seu peito pareciam muito claros; estava triste, cansado e com raiva, mas, sinceramente, nem um pouco surpreso. No fim das contas, a descoberta não havia sido nada muito distante da realidade. Sérgio era o que era. Seu tio, porém, que achava muito melhor do que o seu pai, e o cara mais legal do mundo, não era nenhuma exceção à regra, como tinha escolhido acreditar.
Como um déjà vu, Ayla pegou em sua mão, ponderando a melhor saída — uma linha vermelha prestes a ser ultrapassada. Mas Henrique pensava de forma diferente, e olhando para ela, procurando controlar a forma como seu coração funcionava, tomou uma decisão. Não ia cometer o mesmo erro, não ia fugir como da última vez. Em determinado momento, Fátima fechou as cortinas, e não dava para ver muita coisa, mas ela e Dionísio continuavam lá; discutindo, argumentando sobre algo que Henrique ainda não sabia, mas que não esperaria mais tempo para descobrir. Convicto do que precisava fazer, abriu a porta do carro e saiu, andando em direção ao hotel.
— Henrique. — Ayla correu. — Henrique! — Alcançou seu passo, segurando em sua mão e o fazendo parar. — Não podemos...
— Sim, Ayla, nós podemos — ele falou, olho no olho. Mas, diferente da última vez, não havia nenhuma lágrima brilhando ali; Henrique não estava prestes a chorar ou sair correndo para casa. — Não invadimos o celular da Medusa pra nada, pra no final amarelarmos e darmos pra trás. É a recompensa, lembra?
— Eu sei — respondeu. — Eu sei disso, mas... é o seu tio, Henrique. O mesmo tio que é como um pai pra você, lembra? Sentimentos assim não mudam de uma hora pra outra. Tá mesmo disposto a ir tão longe?
Não.
Talvez.
Não sabia.
Mas tinha que tentar, tinha que descobrir a verdade. — Você precisa do dinheiro, e o senhor Otto, do bracelete dele de volta: isso é tudo que eu sei. Não vamos desperdiçar essa chance.
E como se não tivesse mais nada a declarar, Ayla recuou, rendendo-se a sua escolha. Henrique, então, expirou tudo para fora, se recompondo, virando-se para o hotel e voltando a caminhar. O lugar não era muito chique, com um ar meio antiquado, de coisa antiga, possuía apenas uma única atendente na recepção. Não tinham dinheiro para alugar um quarto, e não fazia sentido entrarem para perguntar sobre Dionísio. Ainda que confirmassem sua presença, não teriam o mais importante: saber sobre o que os dois estavam conversando.
Assim, Henrique teve uma ideia.
— Me diz, você já foi escoteira? — perguntou, chegando aos fundos do edifício e olhando para cima; além das sacadas, havia algumas escadinhas instaladas nas paredes. Com jeito, era possível subir até lá e esconder-se de trás da janela (claro, existiam grandes chances de aquilo dar errado e eles se darem muito mal, mas estava tentando ser otimista).
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Negócio Fechado | ✓
Teen FictionNão estava nos planos de Henrique repetir o último ano do ensino médio, mas, quando isso acontece, seu pai resolve lhe dar uma boa lição e o obriga a arrumar um emprego. Trabalhando no cinema da cidade, ele rapidamente conquista o desafeto gratuito...