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Marina

Tava ajeitando as minhas roupas, crianças todas dormindo quando senti duas mãos rodearem minha cintura e um beijo ser depositado no meu pescoço.

── Vai sair? — Perguntou.

── Não, só to organizando por cor.

Uma coisa que ajuda a aliviar minha raiva além de chorar é organizar, tudo que eu puder organizar e deixar bonito visivelmente é como se fosse uma válvula de escape do estresse quando se trata de casos mais leves. Apenas estresses mais sérios que eu desabo e choro, mas nunca brigo, quase nunca, Ríos já se acostumou com isso. Para eu discutir, tenho que ficar no ápice da raiva.

── Desculpa. — Pediu.

── Você vai se atrasar para o seu vôo. — Avisei. Também queria fugir de uma possível briga.

── Você sempre foge de discussão, incrível! — Falou com ironia e eu o encarei.

── Quando você me conheceu, você sabia que eu era assim. — Rebati voltando a organizar as roupas, estava nas escuras já.

── A vida adulta chegou, Marina, não dá para agir como uma adolescente mimada para sempre! — Falou e no mesmo instante eu soltei a peça que eu tinha na mão no chão. Me virei e me aproximei.

── Então vamos discutir! Quer falar o que? Sou uma mãe ausente? Dou mais atenção para ele? Sou uma esposa ruim também? — Perguntei enquanto a raiva me dominava. Eu fujo de briga mas só tem uma pessoa que consegue me despertar a vontade de discutir.

── Você é uma mãe ausente. — Falou me encarando. ── E sim, você também da mais atenção para ele do que para ela.

── Ele tem seis meses, ele precisa de uma atenção redobrada. Eu fico sozinha com eles e tenho que escolher entre impedir dele se matar das formas mais idiotas possíveis ou dela deixar a casa de ponta cabeça com tanta bagunça. Eu tento dar atenção para os dois! Eu não sou um super ser-humano também.

── Por que que ela não reclama disso sobre mim? Por que eu consigo tranquilamente dar atenção para os dois?

── Porque eu tenho isso! — Falei apontando para os meus peitos. ── Ele ainda mama no peito e toda vez que não tá dormindo, ele tá grudado em mim por causa disso. E quando não tá grudado, eu tenho que ficar de olho nos dois. Richard, só hoje ele tava tentando morder a pata do Frederico, se engasgou com o próprio dedo, quase se asfixiou sozinho com um pano que eu não sei da onde ele tirou.

── Tá exagerando.

── Você não aguentaria um dia sendo mãe. — Neguei com a cabeça. ── Ser pai é muito fácil, o filho sempre é da mãe.

── Ser pai é fácil?

── Quem foi que ficou mais de quarenta horas acordadas porque saiu do plantão e a filha tava com pneumonia e não conseguia dormir? E teve que ficar acordada junto? — Me aproximei ainda mais e ele continuou na mesma posição. ── Quem chora junto toda vez que vê qualquer um dos dois chorar? Quem vira à noite em hospital quando adoecem? Richard, sou eu!

── Eu não tenho culpa se eu perdi todas essas situações porque precisei estar trabalhando.

── Seguindo sua própria linha de raciocínio, você também é um pai ausente. — Cruzei os braços. ── Ou isso só é válido para mim?

── Eu não escolho quando eu tenho que viajar, você escolhe seus plantões!

── Sabe, Ríos, nós dois sabemos muito bem como é insuportável a dor de perder um filho. — Ele desviou o olhar, ainda é um assunto que mexe com ele e eu sei disso. ── É por isso que eu sou focada no meu emprego! Eu só queria evitar que outras mães sentissem o que eu senti! E não, eu nunca coloquei ele acima das crianças.

── Colocou sim.

── Tá bom, mas eu já me afastei, o que mais você quer que eu faça? Rasgue o meu diploma? — O encarei. ── Eu não posso mudar o passado, eu tô tentando mas parece que você não reconhece isso!

── Esqueci que é impossível discutir com você, você é a dona da razão. — Falou pegando sua mochila.

E saiu. Em outras palavras, ele disse que eu sou uma mãe ruim e isso sim me sobrecarregou de uma forma indescritível, só organização não era o suficiente para eu desestressar. Tomei um banho quente e ali eu desabei só para aliviar o estresse, fiquei por aproximadamente uns quarenta minutos e sai, me vesti e quando entrei no meu quarto tomei um susto vendo Helena deitada ali, me enxergou e se sentou.

── Nós podemos fazer uma noite das meninas? — Pediu e eu me escorei na parede.

Noite das meninas ela sempre fazia nas quintas com a Cecília, hoje é quinta e não temos a amiga dela aqui e ela ainda não se acostumou. O sono me consumia.

── Sem doce! — Falei.

── Brigadeiro? — Pediu com aquela cara de cachorro pidão e eu ri.

Já faz mais de uma semana que ela não come doce mesmo.

── Tá bom, só hoje, mas você vai me ajudar a fazer! — Sugeri e ela se animou.

── Sim! — Desceu correndo e eu fui atrás.

Como será que vai ser quando ela for medicada? Eu gosto dela agitada assim, será que vai ser muito estranho? Vai se tornar outra criança?

A hora que eu cair na cama, eu durmo por umas doze horas seguidas.

dizeres, richard ríos. Onde histórias criam vida. Descubra agora