A chuva

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Andávamos há tanto tempo que eu nem conseguia lembrar a última vez que dormimos em uma cama decente. Minhas pernas doíam, meus pés pareciam em brasa a cada passo, e a sede era uma companheira constante. Fazia quase um ano que deixamos a igreja de Padre Gabriel, e cada dia parecia pior que o anterior. Paramos em alguns lugares que tinham comida, mas no último mês, nada. Cada dia que passava, a esperança se esvaía um pouco mais.

Judith chorava de fome e sede, e eu sabia que todos sentiam o mesmo, mesmo que tentassem esconder. O silêncio em nosso grupo era pesado, cada um arrastando seus pés, concentrado na própria dor e no cansaço.

Um dia, umas garrafas de água com nosso nome apareceram mas todos optaram por não beber, podia ser envenenado ou coisa pior, nem precisamos discutir sobre beber ou não, o céu começou a escurecer. As nuvens se acumulavam, prometendo a tão necessária chuva. Quando as primeiras gotas caíram, todos levantaram a cabeça, sentindo o frescor da água em nossas faces sujas e secas.

Começamos a recolher a água com tudo o que tínhamos – garrafas, potes, até mesmo as mãos em concha. Ríamos e brincávamos, um raro momento de alívio em meio ao nosso sofrimento constante. Carl e eu ficamos de boca aberta, tentando beber a chuva que caía cada vez mais forte.

— Isso é incrível! — gritei para Carl, sentindo a água escorrer pelo meu rosto.

— Quem diria, você feliz por estar tomando banho! — ele respondeu, gargalhando enquanto tentava encher uma garrafa.

Mas então, o humor mudou rapidamente. Raios começaram a cortar o céu, seguidos por trovões ensurdecedores. O vento ficou forte, chicoteando nossos rostos e fazendo com que todos se agachassem ou procurassem algum abrigo improvisado. O riso e a alegria deram lugar ao medo e à urgência.

— Precisamos nos proteger! — Rick gritou, tentando coordenar o grupo em meio ao caos.

O vento uivava ao nosso redor, arrancando galhos e folhas, tornando a visibilidade quase nula. O grupo correu e acabei me perdendo do grupo. Carl segurou minha mão com força, me guiando em direção a uma depressão no solo que parecia oferecer algum abrigo.

Nos agachamos ali, tentando nos proteger da tempestade. A água que antes parecia uma bênção agora caía com força, quase machucando. O frio penetrou em nossas roupas, fazendo nossos corpos tremerem. Olhei ao redor e não via nada além das gotas de chuva e a neblina, a noite começava a chegar.

— A gente se perdeu deles, outra vez.— Falei tentando enxergar algum deles correndo mas nada, foi em vão.

— Vamos ficar bem, Isabella. — Carl disse, sua voz firme apesar do medo que eu sabia que ele sentia.

Eu assenti, tentando acreditar em suas palavras. A tempestade rugia ao nosso redor, e fechei os olhos, me concentrando na presença de Carl ao meu lado, na sua mão segurando a minha com força. Estávamos sozinhos, separados do grupo mais uma vez, e o desespero ameaçava me consumir.

A água caía em torrentes, nos encharcando completamente. O vento uivava como um animal furioso, e o barulho dos trovões era ensurdecedor. Não havia nada além de nós dois e a natureza implacável.

— Precisamos encontrar um lugar mais seguro. — Carl gritou por cima do vento, seus olhos fixos nos meus, cheios de determinação.

— Mas pra onde? Não consigo ver nada! — respondi, tentando abafar a angústia na minha voz.

Ele olhou ao redor, seus olhos estreitando para enxergar através da cortina de chuva. Então, apontou para o que parecia ser um velha casa abandonada, meio escondido pela neblina e pelas árvores.

Runners •ᴄᴀʀʟ ɢʀɪᴍᴇsOnde histórias criam vida. Descubra agora