Capítulo Trinta e oito.- O almoço.

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Depois de ter feito aquele anúncio bombástico, e as pessoas ficarem extremamente chocadas com a escolha da "noiva", Nicolas desceu do palco, sumindo no meio da multidão. Minutos mais tarde, senti uma mão envolver o meu braço sutilmente, tirando-me daquele lugar. Tive vontade de gritar com ele, o xingar de todas as coisas ruins que fossem possíveis de serem ditas, mas eu estava tão chocada e perturbada que nem consegui formular xingamentos em minha cabeça. Saímos de lá antes que o evento acabasse. As mãos de Machado estavam gélidas e trêmulas, percebi quando entraram em contato com a minha pele na hora que ele me puxou. Nicolas estava tão perturbado quanto eu; senti que não devia massacrá-lo naquela hora, não adiantaria de nada, só o deixaria mais nervoso. Só tinha o visto tão vulnerável uma vez, quando ele, literalmente, me implorou para aceitar ser sua noiva. Mas, mesmo naquela noite, ele não se encontrava tão agoniado quanto nessa.

Me perguntei se ele tinha medo dos pais ou medo de perder o emprego. Acho que Nicolas não aguentaria ter uma vida com uma classe social inferior a sua, ele era soberbo demais para isso. Nenhum salário mínimo seria capaz de pagar a manutenção dos seus carros. Nenhum vale alimentação seria o suficiente para os restaurantes que ele gosta de frequentar. Me perguntei se ele estava abrindo mão daquilo tudo, se estava abrindo mão pelo bebê. E se a resposta fosse "sim", eu o consideraria um bom pai. Nem todos os homens abririam mão daquilo que tanto amam por um filho. Mão daquilo que sempre se orgulharam em ter. Nicolas realmente estava me surpreendendo. 

Mesmo pensando daquele jeito, não fui capaz de conter uma pergunta:

— Aquilo foi realmente necessário? — Tentei controlar o tom ainda raivoso da minha voz.

— Sim, um dia você entenderá.

— Você é inacreditável!

Não me arrependi de ter perguntado, aquele era um direito meu de todo modo. Ele me devia satisfações. Mas não estava com cabeça para insistir naquele assunto, meus pensamentos já estavam conturbados demais.

Ele me deixou em casa e disse que voltaria no dia seguinte, às onze horas, para irmos almoçar na casa dos meus pais. E assim ele o fez, chegando exatamente na hora que havia combinado. Machado usava uma camisa polo branca e uma bermuda preta. Percebi que nunca o vira de bermuda. Ele sempre usava calças, até mesmo para ficar em casa. Pensei que ele estivesse tentando se passar por uma pessoa mais humilde, para agradar ao meu pai, ou estava entrando no clima da sua nova realidade. Nicolas se desencostou do carro assim que me viu, abrindo a porta do automóvel para que eu entrasse, fazendo o mesmo logo em seguida.

— Como você está? — Perguntei, tentando me lembrar com que carro ele tinha vindo me buscar no dia anterior. Aposto que não foi com esta Ferrari preta. Me lembro dele estar dirigindo ela no dia do meu desfile.

— Bem — respondeu vagamente.

— Pode se abrir comigo; já te usei de ouvinte uma vez, lembra?

— Está tudo bem, não precisa se preocupar.

— Hum... está com medo de perder o seu emprego? — Ignorei a sua fala, assim como ele fazia comigo.

— Não... eles não chamariam tanta atenção a este ponto, a nossa família é a imagem da empresa. Eles não demitiriam um filho, eu acho. E mesmo se quisessem, não conseguiriam, estou à frente de muitos projetos.

— Então, do que tem medo?

Seus olhos se desviaram da pista, me fitando por um segundo.

— Não estou com medo!

— Vi o seu estado ontem, sei que está com medo.

Ele riu, soltando um ar forte pelo nariz.

Me odeie, mas me ame.Onde histórias criam vida. Descubra agora