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Em menos de vinte minutos, ele surge na minha frente, apalpando os bolsos da bermuda cargo preta para se certificar de que está com os cigarros e o isqueiro. E, naquele momento, eu que não fumo, quase quis um cigarro, porque sinto que envelheci dez anos ou mais no último mês.

Eu não queria ter de admitir que ele é tão bonito assim. Eu queria poder dar o fora dali, porque, honestamente, a última coisa que uma garota não-fumante precisa é ter de encarar o Cadu sob aquela camiseta cinza propositalmente desgastada, seus chinelos combinando perfeitamente com seu ar descontraído, a pulseira de couro no pulso e aquele novo colar - um colar que nunca vi antes - com uma palheta de guitarra em prata bem no centro do seu peito. Cadu só aparenta estar vivendo ao sabor do vento, porque, na verdade, ele vive e respira música o tempo todo. Ele é todo ele mesmo, como se tivesse nascido sabendo estampar sua marca pessoal no mundo enquanto olha para as pessoas. É isso ou talvez eu esteja completamente apaixonada por esse cara. Droga.

Para intensificar ainda mais o vendaval que ele causa na minha cabeça, vejo-o ajeitar uma alça de couro que cruza seu peito. Sim, claro, ele está levando o violão para o luau. E isso me faz supor o óbvio: estou completamente ferrada esta noite.

― Vamos nessa, marrenta? - ele diz, ainda ajustando a alça do violão. - A galera já deve estar esperando na praia.

― Nessa altura do campeonato, a galera já deve estar bêbada na praia, é isso que você quis dizer, né?

Ele ri, estendendo a mão na minha direção, como se fosse a coisa mais natural do mundo irmos juntos ao luau, de mão dadas. Eu hesito, olho para a sua mão e depois para seus olhos, em dúvida sobre aquele gesto.

― Você está com cara de quem pensa demais. Relaxa, Valen. Eu só quero me certificar de que você não vai tropeçar em alguma raiz como da última vez. - ele sorri de canto só para deixar claro que viu meu quase-tombo na volta do posto.

Ok. Às vezes penso que o Cadu não merece ter o direito de tocar em um fio do meu cabelo, outras vezes penso que um fio do meu cabelo é quase nada perto do que imagino vivendo com ele. Eu me detesto muitas e muitas vezes por não conseguir mantê-lo fora dos meus pensamentos. Seria tão mais fácil se ele não tivesse vindo.

Suspiro fundo e concordo com a proposta. Nossas mãos se unem e ele entrelaça os dedos aos meus. E de repente, me lembro da Babi, com seus doze anos, me explicando que dedos entrelaçados são coisa de namorados e não de amigas. Ela disse isso um dia no pátio da escola, quando eu, achando que seria mais fofo, entrelacei meus dedos nos dela enquanto caminhávamos. Lembro como ela ficou tão atônita, querendo deixar claro que éramos apenas amigas. Na época, eu não fazia ideia de que aquilo podia significar algo mais, só achava bonito ver nossas mãos encaixadinhas.

Desde aquele dia, nunca mais entrelacei os dedos com ninguém, que não fosse meu namorado. O que foi bem fácil, pois eu nunca tive um namorado.

Durante o caminho, sinto o polegar de Cadu roçar minha mão várias vezes. Não me afasto, mas também não consigo retribuir o carinho dele. Ficamos em silêncio, como tem sido todos os momentos em que algo intangível pesa sobre nós. Há algo que precisamos falar e ainda não sei o que é. Nem tudo foi dito sobre nossa infância, sobre nossos pais, sobre o seu retorno, ou sobre o presente em que estamos mergulhados. E, claro, nem tudo foi dito sobre... o beijo que ele deu na Lorena.

Vozes se estendem vindas da praia. A nossa galera e outras parecem elétricas. Avisto Babi virando um pequeno copo de vidro de 30ml, usando um cropped laranja fluorescente que parece quase brilhar na escuridão.

― Eu avisei que eles estariam bêbados, não avisei? - digo, enquanto aponto para o nosso grupo.

Cadu balança a cabeça, assentindo.

Sempre fomos nósOnde histórias criam vida. Descubra agora