Capítulo 14: A Mulher Ideal

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POV: ISABEL

—Isabel, ajude-me a tirar a mesa agora e vá para a sua aula de escrita. O lorde Roberto comentou que ainda estás muito fraca em latim, e quero que alcances a perfeição.— Minha mãe se levanta da mesa, tirando o lenço do vestido e começando a tirar algumas coisas de vidro.

Desperto dos meus pensamentos imediatamente, ando me distraindo demais pensando em coisas que não me convém, coisas do tipo: Será que a Zana está sabendo lidar com o padre? E a visão do bebê cortado? As bruxas estão bem? Os três homens que ela mora também estão bem?

Acabo até mesmo me distraindo dos meus afazeres, me esquecendo totalmente que eu também sou uma menina atarefada e tendo uma família extremamente rigorosa para eu ser a mulher ideal para o meu futuro marido. Inteligente, com muitos idiomas falados, escrita perfeita, que sabe bordados e costura, e também que saiba cantar e tocar instrumentos muito bem. Essa era eu, nascida em berço católico e bonita como um anjo angelical, como sempre me dizem.

Tinha que ser delicada, comportada, bem vestida, sempre com um terço nas mãos ou no pescoço, e que sabe o que cada colher serve na hora da refeição. Eu não era da realeza ou da burguesia, mas só as minhas condições familiares me davam privilégios para ser o que eu sou, já que muitas mulheres não tinham oportunidade de nem ao menos saber ler.

—Sim, mamãe, farei isso... E depois, posso pular a hora do bordado? Gostaria de aprender uma nova música na harpa, por favor?— Me levanto depressa, ajeitando o meu vestido, e ajudando a minha mãe a levar as coisas da mesa.

—Está bem, mas amanhã terás de compensar com estudo dobrado na Bíblia e no bordado, e não te esqueças que temos missa pela manhã.— Minha mãe me olha rígido e eu assinto com a cabeça várias vezes.

Eu amo a minha mãe, por mais que ela seja sempre rigorosa na minha criação, e quer que eu seja perfeita em tudo, ela me criou com êxito e muito amor. Eu nasci perfeitamente a cópia dela, cabelos loiros, pele branca sem nenhuma mancha de machucados ou hematomas, e olhos claros. Uma verdadeira figura divina, muito me elogiavam dizendo que eu remetia a pureza e beleza extinta pela minha aparência, mas eu era muito mais do que um simples rosto bonito.

—Sim, senhora, farei isso! Obrigada por me conceder essa permissão.— Abro um sorriso agradecida, colocando tudo em seu devido lugar.

—A propósito, por onde andas? Tens saído mais do que o habitual, e notei que as refeições estão a desaparecer.— Ela me pergunta, me ollhando de canto de olho para decifrar alguma reação de mim, mas eu soube disfarçar meus sentimentos muito bem.

—É para a minha amiga Zanaina, mamãe. Já te disse que ela não tem as mesmas condições que nós. Ela nunca se alimenta tão bem quanto nós, por isso, pensei em ajudá-la.— Digo com sinceridade, nunca contarei a verdade pois prometi a Zana que jamais faria isso.

Eu sou imensamente grata por ela livrar minha família dessa maldição chamada peste negra, minha mãe quase beirou a morte e eu entrei em desespero, ninguém sabe quantas noites passei rezando, chorando e implorando para padres ou divindades que tirasse a minha mãe daquela agonia. Cada noite era uma aflição, um medo genuíno de algo acontecer com ela enquanto eu dormia, portanto eu nem sequer pregava os olhos, passava a madrugada lendo a Bíblia e rezando pela vida dela. Meu pai não sabia ao menos o que estávamos passando, eu escrevia cartas aos prantos, e não sei se recebia, mas desde que chegou do seu trabalho, ele não tocou no assunto da peste.

Meu pai era o mais apagado da familia, vivia viajando e cansado, não perguntava como estavam as coisas e como estávamos passando sozinhas aqui. Apenas chegava em casa, falava que estava muito cansado, comia e dormia, e no dia seguinte era a mesma casa, até voltar para o seu trabalho, geralmente dois ou três dias depois.

O Preço do Sacrifício [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora