Silencio

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Camila.

Já faziam alguns dias desde o beijo. Dias que pareciam se arrastar, mais longos, mais pesados, como se o tempo estivesse me torturando com sua lentidão. Desde aquela noite, Lauren não tinha dado nenhum sinal de vida. Nem uma mensagem, nem uma ligação. Nada. Nem ao menos nos esbarramos por aí.

Eu estava me sentindo uma tola. A cada hora que passava sem ouvir nada dela, mais eu me afundava em desilusão.

"Foi só um beijo"

Eu repetia para mim mesma.

"Não significa nada. Não deveria significar nada"

Mas, por mais que tentasse me convencer, eu não conseguia ignorar. Eu havia gostado do beijo, ela não precisava me pedir em casamento, mas uma mensagem seria legal.

Agora, eu estava no shopping com a Dinah, andando de loja em loja. As cores vibrantes e a música alta contrastavam completamente com o turbilhão de emoções que eu tentava esconder. Dinah, como sempre, estava animada, comentando sobre as roupas que experimentava, mas eu mal conseguia prestar atenção.

-Ei, Terra chamando Camila! -Dinah brincou, acenando a mão na frente do meu rosto.

-Ah, desculpa... Tô meio distraída hoje. -admiti, mexendo em um cabide de roupas que eu nem estava vendo de verdade.

-Meio? Você tá completamente no mundo da lua, garota! -Dinah riu, mas logo ficou séria. -O que foi? Você tá assim desde aquela noite na festa.

Mordi o lábio, tentando esconder o incômodo. Eu não queria parecer desesperada, mas a verdade era que o silêncio de Lauren estava me corroendo por dentro.

-É... é sobre a Lauren. -confessei finalmente, quase em um sussurro.

Dinah ergueu as sobrancelhas e deu um sorriso malicioso.

-Ahá! Eu sabia que tinha alguma coisa entre vocês! Me conta tudo!

-Não tem muita coisa pra contar. -suspirei, largando as roupas e me sentando em um banco próximo. -A gente se beijou... e desde então, nada. Nenhuma mensagem, nenhum sinal de vida. É como se eu nem existisse mais.

-Espera, vocês se beijaram? -Dinah arregalou os olhos, claramente surpresa. -E ela não disse nada desde então? Nem uma mensagemzinha? Nada?!

-Exatamente. -respondi, sentindo a frustração apertar meu peito. -Eu me sinto idiota por ter criado expectativa. Sei lá, foi só um beijo, né? Talvez não significou nada pra ela... não que tenha significado algo grandioso pra mim, aí sei lá.

Dinah se sentou ao meu lado, colocando uma mão reconfortante no meu ombro.

-Você não é idiota, Mila. Às vezes a gente cria expectativas sim, mas isso não significa que você não tem o direito de se sentir chateada. Ela deveria ter falado algo, pelo menos, né?

-Eu sei... Só que eu sinto que fui uma tola. Fiquei dias esperando que ela ligasse ou mandasse uma mensagem, algo pra mostrar que ela também sentiu o que eu senti naquele beijo. Mas nada. E agora parece que eu fui só mais uma distração pra ela.

-Ah, Mila , não pense assim. -Dinah disse suavemente. -Lauren pode ser complicada, mas não acho que ela te beijaria se não tivesse sentido nada. Talvez ela só esteja confusa, ou com medo... Sei lá, deve ter muito trabalho na delegacia.

-É pode ser. -Eu disse sem dar muita importância.

-Vamos tirar essa carranca e vamos escolher uma roupa bem fashion. -Dinah disse me puxando para uma arara de roupa.

——————

Lauren.

O cheiro metálico de sangue ainda pairava no ar enquanto eu me abaixava ao lado do corpo. A cena era brutal, um assassinato típico: sem testemunhas, poucas pistas. Suspirei, ajustando as luvas de látex, e olhei para Normani, que anotava os detalhes da cena. Faz anos que lido com esse tipo de crime, mas o peso nunca desaparece. Por mais que o trabalho me endureça, a violência sempre deixa sua marca. E todas as vezes me lembro de meu pai.

-Hora da morte estimada entre meia-noite e duas da manhã. -Normani murmurou, olhando o relógio. -Nenhuma pista sobre a arma do crime, claro.

Franzi o cenho, examinando a cena em busca de algo, qualquer coisa, que pudesse ter sido deixado para trás. O sangue respingava no chão ao redor do corpo, mas a faca que deveria estar ali, conforme Normani disse, estava sumida. Olhei em volta, tentando conectar os pontos.

-Mais um caso pra nos tirar o sono. -resmunguei. -Espero que o legista nos dê algo. Vamos precisar de sorte pra pegar esse desgraçado.

Nós trabalhamos em silêncio por alguns minutos, trocando poucas palavras, enquanto a equipe da perícia cuidava dos detalhes. Quando terminamos, dei uma última olhada no corpo antes de caminhar em direção ao carro com Normani.

Dentro do carro, a escuridão lá fora parecia refletir o peso que eu carregava no peito. Não conseguia parar de pensar em Camila. Mesmo em meio a uma cena de crime, ela se infiltrava nos meus pensamentos. Era impossível escapar.

-Você tá muito quieta. -Normani disse, quebrando o silêncio enquanto dirigia de volta para a delegacia. -É por causa do caso ou é outra coisa?

Mordi o lábio, sabendo que Normani me conhecia bem demais para eu tentar esconder o que estava realmente incomodando.

-É... é sobre a Camila.

-Ah, eu sabia! -Normani sorriu de lado, mantendo os olhos na estrada. -Por que você não manda logo uma mensagem pra ela? Tá se torturando à toa, Lo.

Suspirei, encostando a cabeça no banco do passageiro.

-Eu... não sei. Camila é muito jovem. Ela tem a vida toda pela frente, sabe? Ela tá começando uma carreira, cheia de possibilidades. E eu... bem, eu sou muito velha pra ela. Agi por impulso naquela noite. Foi só um beijo idiota.

Normani soltou uma risada curta.

-Ah, pronto, lá vem você com essas desculpas. Velha? Sério, Lauren? Desde quando isso foi problema pra você? E a uns dias atrás o beijo não tinha sido idiota, pelo o que eu me lembre você me disse que até ficou de pau duro enquanto beijava ela.

-Normani!! -A repreendi. -Não é só a idade. -tentei me explicar, mas as palavras soavam sem sentido até pra mim.

-Ela merece alguém que esteja no mesmo ritmo de vida que ela. Eu sou delegada. Minha vida é... complicada. Não posso me complicar mais ainda com isso agora.

Normani bufou, parando no sinal vermelho, e virou-se pra mim com um olhar que misturava impaciência e compreensão.

-Lauren, ouve o que você tá falando. Você tá inventando desculpas porque tá com medo. Medo de dar errado, medo de se envolver demais que nem aconteceu com Lucy.

Virei o rosto para a janela, observando a cidade passar rapidamente. O que ela dizia fazia sentido. Namorei por dois anos com Lucy, nos conhecemos em um caso de abuso, ela é advogada e estava em defesa da vítima. Nós tivemos uma noite juntas e depois não nos separamos mais, ela se mudou lá pra casa e foi aí que os problemas começaram. Lucy era espaçosa demais, gostava de tudo do jeito dela, nunca tinha tempo para nada e tudo se resumia em trabalho e mais trabalho. Enfim, um dia ela decidiu ir embora sem mais nem menos. Desde então, depois de cinco anos, ainda temo que a próxima pessoa com quem eu vá me relacionar seja assim.

-Me responde uma coisa. -Normani disse, retomando o caminho quando o sinal ficou verde. -Você quer isso? Quer descobrir onde as coisas podem ir com Camila?

Fiquei em silêncio por alguns segundos, antes de responder, quase sem perceber.

-Sim. Eu quero.

-Então para de inventar desculpas e manda logo uma mensagem pra ela. Deixa rolar, Lo. Pode ser que dê certo, pode ser que não. Mas, se você não tentar não vai saber.

O carro entrou no estacionamento da delegacia, e eu soltei um longo suspiro. Talvez Normani estivesse certa. Talvez eu estivesse tentando racionalizar meu medo, tentando proteger a mim e a Camila de algo que nem sei se existe. Mas, de uma coisa eu sabia: esse silêncio estava me destruindo, e talvez fosse hora de fazer algo a respeito.

ENTRE A LEI E O CORAÇÃO. -CAMREN G!POnde histórias criam vida. Descubra agora