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Sofia estava na mesa, mas sua mente estava distante, perdida em lembranças que sempre evitava revisitar. O cheiro do café na copa, o som do elevador se abrindo e fechando ao longo do dia, e os olhares atentos de Leon estavam começando a mexer com ela de uma forma inesperada. E então, como uma onda inevitável, as memórias que tanto lutava para suprimir voltaram à tona.

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Ela tinha 9 anos na primeira vez que se escondeu no elevador do prédio onde morava com os pais. Seu pai chegava bêbado quase todas as noites, trazendo junto a escuridão de sua raiva. O som da chave girando na porta era o sinal de alerta para Sofia e sua mãe. Se tivessem sorte, ele apenas gritaria e quebraria algumas coisas. Mas, muitas vezes, a sorte não estava ao lado delas.

A mãe de Sofia fazia o que podia para protegê-la, mas nem sempre conseguia evitar as agressões. Quando as discussões começavam e os gritos tomavam conta do apartamento, Sofia corria para o elevador. Aquela caixa metálica se tornava seu refúgio. O barulho das portas se fechando abafava os sons das brigas, e ela se encolhia no canto, tentando desaparecer. Era o único lugar onde se sentia segura, longe da violência de seu pai.

Mas um dia, o refúgio virou uma prisão. O elevador parou de funcionar entre os andares, e Sofia ficou presa ali. Era tarde da noite, e o prédio estava em silêncio. Ela apertou todos os botões, gritou por ajuda, mas ninguém apareceu. Com o coração disparado e o corpo tremendo de medo, ela passou a noite toda no escuro, encolhida no chão frio, lutando contra o pânico.

Quando finalmente a encontraram na manhã seguinte e abriram a porta do elevador, Sofia saiu cambaleando, com os olhos vermelhos de tanto chorar. Mas o pior ainda estava por vir. Seu pai, irritado por não encontrá-la em casa na noite anterior, descontou toda a raiva nela. A surra foi tão violenta que ela ficou de cama por uma semana. Hematomas cobriam suas costas e braços, lembranças visíveis de uma infância marcada pelo medo.

Naquele momento, Sofia soube que precisava sobreviver sozinha. Assim que completou 17 anos, pegou as poucas coisas que tinha e deixou a casa dos pais para nunca mais voltar. Carregava consigo apenas as cicatrizes — algumas visíveis na pele, outras guardadas na alma.

Desde então, elevadores eram seu maior pesadelo. A sensação de confinamento, o som das portas se fechando, tudo a fazia voltar para aquela noite terrível. Era como se seu corpo ainda estivesse preso lá, entre os andares, incapaz de escapar do medo.

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De volta à realidade, Sofia esfregou o rosto com as mãos, tentando afastar as lembranças. Respirou fundo, mas sentia o peito apertado e os olhos ardendo. A cada dia que passava, parecia mais difícil esconder o trauma. E agora, com Leon cada vez mais atento a ela, temia que ele descobrisse o que havia por trás de sua aversão ao elevador.

A última coisa que Sofia queria era parecer fraca. Tinha batalhado muito para chegar ali e construir uma vida longe do passado. Não podia deixar que ninguém, nem mesmo Leon, percebesse as marcas invisíveis que carregava.

Ela fechou os olhos por um momento, respirando fundo e repetindo para si mesma que estava segura. Isso já passou. Eu não sou mais aquela menina assustada. Eu consigo lidar com isso.

Mas, por mais que tentasse convencer a si mesma, uma parte dela sabia que o passado nunca havia realmente desaparecido. Ele estava ali, à espreita, em cada olhar que desviava do elevador, em cada noite em que acordava assustada com pesadelos do que viveu.

E, pior ainda, sabia que se continuasse se aproximando de Leon, cedo ou tarde ele descobriria. E isso era um risco que Sofia não estava pronta para correr. Não de novo. Não com alguém que estava começando a significar tanto para ela.

 Não com alguém que estava começando a significar tanto para ela

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