7. Sol frio

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Felix abriu a porta do quarto com um empurrão preguiçoso, os ombros caídos e o corpo pesado de cansaço. A tour pelo palácio parecia interminável, cada novo corredor ou sala mais grandiosa que o anterior, como se Hyunjin tivesse prazer em exibir cada canto daquela fortaleza. O príncipe feérico mostrara tudo: as salas de música repletas de instrumentos encantados, os salões de baile com tetos tão altos que pareciam tocar as nuvens, os andares baixos, frios e úmidos, e até as torres que subiam como espirais no céu.

Tudo, exceto uma torre.

A última.

Hyunjin havia parado diante dela, o olhar ficando distante por um instante. Ele não deu explicações detalhadas, apenas afirmou que ninguém além dele tinha permissão para entrar. Felix, sem querer causar mais problemas, apenas assentiu e seguiu em frente, embora a curiosidade lhe cutucasse a mente como um espinho.

Agora, de volta ao quarto, Felix fechou a porta e encostou nela por um momento, respirando fundo. O silêncio do aposento o envolveu como um cobertor bem-vindo, e ele deixou o olhar vagar pelas paredes, onde tapeçarias de tecido delicado pendiam, exibindo tons de azul. A cama enorme o chamava como um ímã, mas primeiro havia algo que ele precisava fazer.

Com um suspiro, Felix começou a desabotoar a roupa formal que a criada lhe entregara. Os tecidos brancos, antes tão elegantes, agora pareciam sufocantes. Ele retirou cada peça lentamente, deixando-as cair no chão uma a uma. Quando ficou apenas de roupa de baixo, foi até o espelho, encarando a própria aparência.

Seus olhos captaram o brilho cansado de si mesmo. A sombra marrom nos olhos estava borrada, o gloss quase desaparecido, mas as sardas ainda estavam ali, salpicadas sobre sua pele clara como uma lembrança de quem ele era antes de tudo isso. Ele passou os dedos pelo rosto e sentiu o frio de sua pele, algo que o fez estremecer.

Felix se inclinou sobre a pia e lavou o rosto com a água fresca, esfregando até remover qualquer traço da maquiagem. Quando terminou, a pele estava limpa, mas o frio continuava presente, como se tivesse se impregnado em seus ossos. Ele suspirou novamente, deixando a toalha de lado, e finalmente se arrastou até a cama.

A cama era imensa, com cobertas pesadas e travesseiros macios que pareciam engoli-lo quando se jogou sobre ela. Felix afundou no colchão, puxando as cobertas sobre si e fechando os olhos. Apesar da espessura das mantas, ele sentia o frio persistente, aquele mesmo frio que parecia invadir cada canto do reino de Erillea, congelando o que deveria ser calor.

Era irônico, pensou Felix, enquanto ajeitava os travesseiros ao redor do rosto. O gelo estava em suas veias, era parte dele. Mesmo que estivesse adormecido, ele deveria se sentir confortável no frio. Mas não sentia.

O frio de Erillea era diferente. Era penetrante, vazio, sem vida. Não tinha nada do poder e da beleza do gelo que Felix conhece — ou que conhecia, antes de perder o controle sobre ele.

Ele suspirou, apertando os olhos fechados e tentando afastar esses pensamentos.

— Só quero que fique quentinho... — murmurou para si mesmo, puxando as cobertas até os ombros.

Mas o calor não veio. Felix encolheu o corpo, tentando se aconchegar melhor, e sentiu o cansaço finalmente vencê-lo. Enquanto a escuridão do sono o envolvia, a última coisa que pensou foi que aquele frio parecia ainda pior do que o de Adarlan. E isso era assustador.

...

A luz da manhã invadia o quarto com uma teimosia irritante, atravessando a grande janela de vidro fosco que Felix esquecera de cobrir na noite anterior. Ele gemeu baixinho ao sentir o calor frio — um paradoxo que só parecia possível naquele reino — pousar diretamente sobre seu rosto. Com um movimento preguiçoso, puxou as cobertas até cobrir a cabeça, enterrando-se mais fundo na cama, como se pudesse afastar a luz e o mundo exterior junto com ela.

Felix não queria acordar. Não queria sair daquela cama macia e pesada, onde o frio parecia menos cruel. Não queria lidar com Hyunjin, com o casamento ou com o estranho destino que agora o prendia naquele palácio congelado. Mas, mais do que tudo, ele não queria enfrentar a lembrança do sonho que tivera.

De olhos fechados, coberto até a cabeça, Felix suspirou. Ainda podia sentir os ecos daquela fantasia calorosa que sua mente conjurara durante a noite. As palavras de Hyunjin sobre o casamento e o compartilhamento de poderes haviam plantado sementes em sua cabeça que floresceram enquanto ele dormia, transformando-se em algo que não deveria ser tão... íntimo.

No sonho, ele não era apenas o príncipe exilado ou o refém relutante. Ele era algo mais. A imagem de Hyunjin estava cravada em sua mente: os olhos dourados brilhando com algo que Felix não conseguia definir, o toque quente contra sua pele fria, a voz profunda e macia murmurando palavras que ele não conseguia lembrar, mas que ainda o faziam estremecer.

E o calor. O calor que emanava de Hyunjin no sonho era diferente do frio que agora impregnava o palácio. Era reconfortante, abrasador e, de certa forma, tentador. Felix acordou com aquela sensação ainda viva em seu corpo, aquecendo-o de dentro para fora, e isso o deixou mais desconfortável do que qualquer frio poderia.

Ele afastou o rosto do travesseiro e soltou outro suspiro, tentando afastar as imagens persistentes que dançavam em sua mente. O casamento. Ele tentou se lembrar de que era apenas uma formalidade, uma estratégia para compartilhar poderes. Isso não significava nada. Não deveria significar nada.

Mas o sonho dizia o contrário.

— Ridículo — murmurou para si mesmo, sua voz abafada pelas camadas de cobertas.

Felix fechou os olhos com força, tentando afugentar o calor incômodo que subia por seu rosto. Não era real, disse a si mesmo. Era apenas sua mente pregando peças.

Mesmo assim, ele não conseguia evitar o desconfortável sentimento de que Hyunjin, de alguma forma, sabia. E isso era ainda mais irritante.

Felix permaneceu deitado por mais alguns minutos, permitindo-se aquele breve refúgio antes de enfrentar o dia. Ele sabia que, em algum momento, teria que levantar e encarar Hyunjin novamente. Mas, por enquanto, ele se recusava a deixar o calor daquela cama e a se deparar com o frio real do mundo lá fora.

Ele suspirou mais uma vez, afundando ainda mais nos travesseiros.

Talvez, apenas por mais alguns minutos, ele pudesse fingir que o sonho era só isso: um sonho. E nada mais.

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