Os guardas não disseram nada enquanto guiavam Felix para fora do banheiro, onde o calor agradável do palácio substituía o frio mordaz do lado de fora. Suas correntes haviam sido removidas, mas ele ainda sentia o peso da vulnerabilidade. Cada passo ecoava pelos corredores amplos e silenciosos, e Felix, mesmo com o corpo exausto, não deixava de notar os detalhes ao seu redor.
Paredes decoradas com tapeçarias ricas, candelabros dourados que iluminavam o ambiente com uma luz suave, e janelas altas com cortinas de veludo denunciavam que ele estava em um lugar de luxo.
Um palácio?
A constatação o atingiu como uma onda fria. Por que ele, um assassino feérico, estava sendo levado para um lugar como aquele? Talvez algum nobre quisesse seus serviços, um último trabalho antes de lhe concederem a morte. Mas a ideia parecia absurda, até mesmo para ele.
Finalmente, os guardas pararam diante de uma porta de madeira maciça com detalhes esculpidos. Um deles empurrou a porta, que se abriu com um rangido leve, revelando o interior do cômodo.
Felix piscou, atordoado.
O quarto era esplêndido, decorado em tons de azul, sua cor favorita. As paredes eram revestidas com um papel de parede delicado, adornado com padrões prateados que brilhavam sob a luz de um lustre de cristal. Um grande tapete azul-marinho cobria o chão, e ao fundo, uma cama enorme com dossel parecia convidativa, suas cobertas impecáveis decoradas com bordados intrincados.
Por um momento, Felix achou que estava sonhando. Ele deu um passo hesitante para dentro, seus olhos correndo de um detalhe para outro, absorvendo a opulência do lugar. Ele mal notou quando os guardas saíram, fechando a porta atrás dele.
Foi só então que viu as roupas sobre a cama. Roupas formais, feitas de tecido caro. Uma camisa branca impecável, um colete de seda cinza, calças perfeitamente ajustadas e um par de botas de couro reluzente. Felix franziu o cenho, mas, ao mesmo tempo, sentiu um sorriso involuntário se formar em seus lábios.
— Isso é uma piada? — murmurou para si mesmo, a voz rouca ainda carregada de incredulidade.
O sorriso, no entanto, desapareceu tão rápido quanto surgiu. Seus olhos captaram algo do outro lado do quarto — um espelho grande e ornamentado. Ele se aproximou lentamente, como se fosse uma armadilha. Quando finalmente se viu refletido, Felix estacou.
Ele estava horrível.
Sua pele pálida parecia ainda mais desbotada sob a luz, marcada por cortes e hematomas que as masmorras lhe deram. Suas bochechas sardentas estavam encovadas, seus olhos fundos, cercados por olheiras profundas que ressaltavam sua exaustão. O cabelo loiro, que um dia fora um de seus maiores orgulhos, estava opaco e desgrenhado, caindo em ondas desordenadas pelos ombros.
Felix encarou seu reflexo com uma mistura de nojo e tristeza. Aquela visão era um lembrete cruel do que ele havia se tornado. Ele levantou a mão lentamente, tocando a pele machucada de seu rosto, como se não acreditasse que era mesmo ele.
Ele fechou os olhos e respirou fundo. Por reflexo, tentou acessar seus poderes de gelo, algo que fazia quase sem pensar antes de ser capturado. Estendeu a mão, buscando aquela familiar sensação gélida que costumava percorrer seu corpo como um fluxo constante.
Mas nada aconteceu.
Felix abriu os olhos de repente, franzindo o cenho. Ele tentou novamente, dessa vez concentrando-se mais, fechando os punhos e buscando dentro de si qualquer resquício de sua antiga força. O silêncio que encontrou foi ensurdecedor.
— Não. Isso não pode estar acontecendo.
Ele soltou um suspiro pesado, a frustração crescendo dentro de si. O tempo nas masmorras, as correntes de ferro... tudo aquilo o havia enfraquecido mais do que imaginava. Ele havia esquecido como acessar seus próprios poderes.
Por um momento, Felix encarou seu reflexo novamente, os olhos castanhos carregados de uma fúria silenciosa. Enquanto se afastava do espelho, olhou novamente para as roupas sobre a cama. Vestir-se parecia o próximo passo lógico, mas também uma forma de encarar o que quer que viesse a seguir. O que quer que estivesse esperando por ele fora daquele quarto.
...
A primeira coisa que Felix fez, ao perceber que não havia outra escolha, foi vestir-se. As roupas que tinham sido deixadas para ele eram surpreendentemente ajustadas ao seu tamanho, como se alguém tivesse medido cada centímetro de seu corpo antes mesmo de ele chegar ali. Ele vestiu a camisa branca, que deslizou suavemente por sua pele, e o colete de seda cinza, cujos detalhes bordados brilhavam sob a luz suave do lustre. As calças eram confortáveis e moldavam suas pernas magras, enquanto as botas de couro ajustavam-se perfeitamente a seus pés.
Mas mesmo vestido, ele sentia que algo estava faltando. Ele era um assassino, sim, mas nunca se limitara a essa identidade. Felix era mais que isso. Quando estava fora do trabalho, ele era alguém delicado, com pequenos prazeres que lhe traziam conforto em um mundo tão cruel.
Abrindo as gavetas da cômoda próxima à cama, encontrou o que procurava: uma pequena seleção de maquiagens. Não era muito, mas era o suficiente. Ele puxou o banco da penteadeira e sentou-se, encostando o rosto nas mãos por um momento antes de começar.
Com cuidado, passou um pouco de pó para suavizar as olheiras e uma leve camada de blush para devolver um pouco de cor às suas bochechas. Seus dedos hesitaram ao pegar o batom. Optou por um tom discreto, apenas o suficiente para parecer saudável. Suas sardas marrons ainda apareciam, pontuando o rosto de forma natural. Felix nunca quis esconder aquelas marcas; elas eram parte de quem ele era.
Depois, ele puxou os cabelos loiros e compridos para trás, prendendo-os em um rabo de cavalo baixo e simples. A bagunça já não parecia tão caótica.
Por fim, encontrou um pequeno estojo de joias. Um sorriso quase imperceptível surgiu em seus lábios enquanto ele escolhia um par de brincos dourados, colocando-os com cuidado em suas orelhas. Em seguida, deslizou dois anéis finos em seus dedos e ajustou uma pulseira delicada no pulso esquerdo. Essas pequenas adições, embora insignificantes para muitos, faziam Felix se sentir mais... ele. Mais ele mesmo.
Quando terminou, levantou-se e encarou o espelho mais uma vez. Ainda parecia cansado, marcado pelas experiências recentes, mas havia algo de familiar em seu reflexo agora. Ele parecia menos como um prisioneiro e mais como Felix.
As horas seguintes foram um misto de tédio e inquietação. Felix caminhava de um lado para o outro pelo quarto, estudando os detalhes da mobília e tentando adivinhar por que estava ali. Ele abriu uma janela em um momento de impulso, sentindo o ar frio e observando a neve que caía lá fora, mas logo a fechou quando o vento gelado o fez estremecer.
Então, uma batida na porta.
Felix se virou, alarmado. Antes que pudesse responder, a porta se abriu, e um guarda apareceu. Ele não disse muito, apenas o suficiente para deixar claro:
— Venha comigo.
Felix suspirou, frustrado, mas obedeceu. O guarda não o segurou desta vez, mas havia uma tensão clara no ar, como se qualquer resistência fosse suficiente para reverter essa liberdade momentânea. Ele deu um último olhar ao quarto antes de sair, deixando para trás o único espaço onde, por um breve instante, ele tinha se sentido seguro.
O corredor pelo qual foi guiado era amplo, com paredes adornadas por tapeçarias vermelhas e douradas. Felix andava em silêncio, os brincos dourados em suas orelhas balançando levemente a cada passo. Seus olhos corriam o ambiente, buscando pistas sobre o lugar onde estava.
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Trono destruído
FanficNa terra distante de Terrasen, onde feéricos de poderes elementares governam vastos reinos, Felix, um assassino notório com a habilidade de manipular gelo, é capturado pelo Estado após uma missão fracassada. Preso em uma masmorra, ele aguarda sua ex...