Eu acordei ouvindo alguns barulhos ao longe, depois o cheiro de café me inundou. Desfrutei daquele cheiro por um segundo, antes de me espreguiçar e abrir os olhos. Nas primeiras vezes era sempre um desapontamento tatear ao lado da cama e não encontrar meu namorado, mas depois de algumas semanas parei de procurar.
Ouvi de novo um barulho ao longe e senti uma pequena esperança de que talvez Vinicius não tivesse ido embora como de costume e tivesse ficado. Agarrei-me a essa ponta de esperança e corri pelo corredor em direção à cozinha o mais rápido que meus pés atrapalhados poderiam fazer. Assim que cheguei à porta, minha pequena esperança foi embora, quando dei de cara com dois olhos azuis muito familiares. Rafael estava em pé na minha cozinha, com xícaras nas mãos e com um sorriso torto nos lábios enquanto me examinava.
— Bom dia para você também, bela adormecida. — Ele piscou para mim uma vez, colocando as xícaras na mesa e se dirigiu ao fogão. — Fico feliz em ver seu sorriso radiante quando me viu aqui. Posso apostar pela corrida no corredor que imaginava outra pessoa na cozinha.
Aproximei-me do fogão deixando o sorriso retornar aos meus lábios e abracei-o por trás, enquanto ele colocava água fervendo sobre o pó de café.
— Me desculpe pela recepção não tão calorosa. Você não era quem eu estava pensando que fosse, mas estou feliz que está aqui.
O abracei com um pouco mais de força e fui até a bancada da cozinha, me sentar em um dos banquinhos. Ele continuou ali esperando coar o café, e aproveitei para dar uma boa olhada na mesa. Somente uma pessoa sabia exatamente o que eu gostava de comer quando acordava.
— Como passou mais de um mês fora desse apartamento, sabia que não ia encontrar nada para comer quando acordasse. E só eu sei como fica seu humor quando não come bem quando acorda.
Eu não poderia ser mais feliz, tendo o melhor vizinho e amigo cuidando de mim desse jeito. Levantei meu braço pegando o leite e derramei em metade da minha xícara com o café.
— Obrigada, Rafa, eu não sei o que seria da minha vida e do meu humor esta manhã sem você.
— A sua sorte, é que você nunca precisará descobrir — afirmou ele, se servindo ao meu lado. — Eu imaginei mesmo que você acordaria sozinha, e como fiquei com saudade de você todas essas semanas pensei que poderia te mimar um pouco hoje e fui à panificadora logo cedo. Acertei?
— Claro que acertou. Meu dia sempre começa ótimo com um café logo cedo.
— Isso eu sei, mas estava me referindo se acertei sobre você acordar sozinha. Sei que o Vinicius dormiu aqui, mas isso não é garantia de nada. — Seu tom acusatório era implícito, e precisei tomar um longo gole do meu café com leite. Levantei meu rosto para encará-lo e ele estava ali, me observando. — Acertei, não é?
Eu não queria responder, então apenas acenei com a cabeça, não havia porque mentir. Ele soltou um longo suspiro antes de dar outra mordida em seu lanche.
— Por que ele não fica, Lu? Por que seu namorado tem tanta aversão em dormir com você? Se eu não te conhecesse, diria que você peida à noite ou ronca demais para ele não suportar.
Uma pequena risada escapou de meus lábios.
— Se fosse qualquer outra pessoa, eu diria que não é educado me abordar com assuntos tensos antes de comer, ou falar essas porcarias durante a refeição. Mas se tratando de você, eu não poderia esperar outra coisa.
— E também porque não há assuntos ou palavras que façam você deixar de comer, principalmente no café da manhã. Então, já perguntou por que ele foge de você todas as noites?
Se eu sabia de algo sobre o Rafael, era que não adiantava fugir do assunto. Se ele queria uma resposta, ele não pararia de perguntar até tê-la.
— Eu não sei, Rafa — admiti, após um suspiro. — Já perguntei por que ele nunca fica aqui e dorme comigo, mas a resposta dele é sempre que ele é espaçoso e não consegue dormir confortável se não for na cama dele.
— Mas, ele faz o que? Tipo transa e vai embora?
— Não, ele fica comigo na cama um pouco, mas aí eu pego no sono e quando acordo ele não está mais lá. Sabe, eu também sou espaçosa e gosto de me esticar e dormir esparramada, não sou muito disso de conchinha. Mas poxa, a minha cama box é de casal, não é como se ele ficasse espremido para não conseguir dormir. — Dei um longo gole da minha xícara antes de morder mais uma vez meu lanche. — Nem me interessa também, já me acostumei a acordar sozinha. Depois de um tempo parei de me importar.
— Eu não entendo essas coisas que ele tem. Às vezes ele age como se tivesse medo de se comprometer.
— É exatamente isso que minha tia disse na viagem, quando cheguei lá sozinha, de novo.
— Isso é uma das coisas — ele anunciou enquanto montava o segundo lanche para nós dois. — Ele não gosta de te acompanhar quando você vai para a casa dos teus pais, também não te convida para acompanhá-lo quando ele viaja. Acho até que se não fosse pela irmã, você nunca teria conhecido a família dele.
Uma vez, Alice, a irmã de 14 anos de Vinicius, veio passar o final de semana aqui para procurar por um vestido. Foi quando eu a conheci, e nos demos muito bem desde o começo, ela era uma graça. Depois disso, quando ela teve sua festa de debutante, me ligou exigindo que eu fosse com o Vinicius para lá. Foi a primeira e única vez em que ele me levou para a casa de seus pais.
— Bom, isso é verdade. Tenho que dar à Alice esse crédito.
— E isso dos dois lados. Se teus pais não viessem aqui quase sempre, ele também não os teria conhecido.
— Eu sei disso, Rafa, mas o que quer que eu faça? Amarre-o no carro quando eu for à casa dos meus pais? Entre no carro com as minhas malas, quando ele for viajar para a casa da família dele? Não posso obrigá-lo.
— Não estou dizendo para obrigar, esse é o ponto. Estão juntos há mais de três anos, mas o cara não gosta de envolver família. Te apresenta aos amigos dele, te leva para todo lugar e fica muito possessivo à sua volta, mas ao mesmo tempo ele age como se o que vocês tivessem não é sério. Não dá para entender. Até eu já cansei de ir à casa dos teus pais.
— É por isso que eu te amo absurdamente. — Olho para ele e pego seu rosto, beijando sua bochecha. — E é por cuidar de mim deste jeito, com esse café da manhã maravilhoso e me suportar todos os dias que eu e minha família te adotamos. Você é o irmão mais velho que eu sempre sonhei em ter e a vida me deu você como melhor presente.
— É, eu sei. Você tem que me amar muito mesmo por tudo isso — ele disse, apontando para a mesa. — Mas, você sabe que você é a irmã que eu nunca tive também, eu faria qualquer coisa por você. Eu só estou te dizendo isso porque me preocupo.
Naquele momento, eu não pude evitar virar meu banquinho para o lado e abraçar Rafael com o máximo de força que meus braços conseguiam. Ele me mimava e cuidava de mim como nenhum outro amigo fez. Eu acho que nem se eu tivesse um irmão, eu me sentiria tão amada e próxima como me sinto ao redor dele. Isso era mais forte do que sangue, criação ou família.
Terminamos o café e fomos ao supermercado abastecer minha cozinha, e aproveitamos para conversar sobre a minha viagem e suas férias. Chequei meu celular pelo menos umas dez vezes naquela manhã, à procura de alguma resposta à mensagem que mandei para o Vinicius lá do mercado, mas não obtive nada. Combinamos de almoçar com a Carolina em nosso restaurante favorito, e assim que ela nos viu chegando veio nos cumprimentar.
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BASTA ME ESCOLHER - degustação
RomanceSINOPSE Luisa tinha sua vida planejada. Terminar os estudos, começar a carreira em um escritório de advocacia, se esforçar para conquistar espaço no mercado de trabalho e ser reconhecida por isso. As únicas coisas que vinham antes de sua carreira er...