Os 26 Planos da Minha Adolescência

Primeiro Dia

O despertador tocou e meus olhos se abriram automaticamente. Eu acho que não dormi, só estava em stand-by, sem entrar no sono, de fato. Pulei da cama e enquanto tomava banho, me recordava dos pesadelos horríveis de professores de química e física me reprovando. Tinham sido muitos. Saí do banheiro, me vesti. Fiquei pronta num instante. Eu estava dando um tique no sofá, só esperando a Luísa ficar pronta pra ir para a escola. Luísa tinha 7 anos, e olhos verdes que eu sempre quis ter. Era uma garotinha legal, porém, quando estava zangada, não havia nada que a fizesse ficar menos irritante.

-Lu, pelo amor de Deus, adianta! Bia já está na escola e eu tô aqui te esperando.

- Pera um pouco Mell, deixa eu terminar de arrumar o cabelo...

Dai-me paciência. Estava trocando mensagens com a Bia pelo celular, e ela prometeu que me alertaria caso algum novato chegasse lá. O estoque de garotos legais na escola estava bem baixo. Só tínhamos o Caio e o Jack. Eu não gostava mais do Caio, e Bia já estava afim do Jack, ou seja... Sem saída pra mim. Durante as férias, imaginei que, se um novato aceitável entrasse, eu estaria salva.
O taxi chegou, eu e a Lu entramos no carro. À medida que o mesmo se aproximava da escola, ficava difícil me conter. Minhas mãos tremiam, meu estômago se revirava... E eu não conseguia parar de sorrir.

-Uau, o que é isso? Reformaram a fachada da escola?

-Legal!

Estava mesmo. Saltei do carro e paguei o motorista. Entrei pelos portões enormes e me vi dentro de uma confusão enorme de pessoas conhecidas, e outras desconhecidas. Meninos se cumprimentaram com o "toque do gueto", garotas davam gritinhos e tiravam selfies. Como o esperado para um primeiro dia de aula. Vi a Bia de costas conversando animadamente com Lola. Tampei os olhos dela com as mãos.

- Quem é?

Ela gritou, girou e me abraçou. Abracei Lola também.

-E aí? Babados?

-Ninguém interessante, pelo menos não na nossa sala... Se fosse no segundo ano, já não sei.

Segui o olhar dela, que admirava um garoto lindo, com cabelos castanho-claro e olhos verdes mais claros ainda. Lindo de mais pra ser verdade. Por que esses caras têm de ser mais velhos?

-Caramba.

-Eu sei...

O sino tocou. Subimos para o primeiro andar, usando a rampa enorme, feita para deficientes. Como nenhum cadeirante estava por perto, usamos a rampa mesmo, era tão mais legal. Parece que a reforçaram por baixo, por que já não balançava mais aos nossos passos. Poxa... Era tão legal pular ali em cima e torcer pra ela cair...

Cheguei na minha sala, feliz por ter mais uma vez, ficado na mesma que as minhas amigas. Cumprimentei as outras meninas, Alana, Cláudia, Vicki, Day... Todas são bem legais. Sentei na segunda carteira, e Bia, logo atrás de mim. Conversamos sobre algumas coisas, até que a Amelia sentou na minha frente.

-Ooi!

-Oi, Amélia.

-Já disse, me chame de Mell.

-Mas eu sou Mell, não tem como você também ser.

Ela riu.

-Na verdade, me chamam de Mell desde pequena.

-Comigo também. Sabe, eu deixo seu apelido ser "Mel", mas com um " l" só.

-Ah, aí não tem graça. Vai ser difícil decidir quem fica com o apelido- ela disse com um dos seus sorrisos "simpáticos".
Já estava decidido. Eu era Mell e pronto.

-Haha, verdade!

Eu lhe lancei um sorriso tão " simpático" quanto o dela. Voltei os meus olhos para frente, onde a mesma professora de ciências do ano passado nos dava as boas vindas, anunciando que seria a nossa professora de química e biologia desse ano. Ótimo. Já não ia ter problemas com meu suposto professor de química.

O resto da aula foi normal, revisamos a estrutura celular. Depois dessa, mais uma aula de Matemática, professor novo, e outra de Iniciação Científica (que merda é essa? Não entendi até agora). Descemos para o intervalo e pudemos observar melhor o movimento.

-É... Ninguém novo. Como vamos fazer?- eu disse enquanto mordia minha barra de cereal na fila da cantina.

-Não sei. Mas vamos dar um jeito, tem que ter algum gato solteiro pra você por aí.- ela riu enquanto passava o dinheiro para o moço e pegava sua empada.

Caminhamos lentamente até nossa mesa de sempre, onde Lola, Alana, Cláudia e alguns meninos nos esperavam. Sim, lanchávamos com eles, mas não éramos próximos. Sentamos e conversamos como sempre, deixando o barulho da euforia encher nossos ouvidos... Há mais de 70 dias eu não ouvia o barulho do recreio. Eram dias, mas pareciam anos. Pus os fones de ouvido e coloquei minha música preferida, She Looks So Perfect, da banda 5SOS. Assimilei o meu primeiro plano: gostar de alguém, ter alguém com quem me ocupar. Primeiro, eu preciso achar esse alguém, e pelo visto ia demorar. Mas assim que o visse, eu saberia. Ah, como seria mais fácil se o Gui ainda estudasse aqui. Ele estaria com seu casaco da GAP cinza, capuz, fones de ouvido como eu, rindo e zoando com os outros garotos. As coisas não eram mais tão animadas sem ele. Quem seria o próximo piadista da sala?

Me deixei levar por esses pensamentos o resto do dia. Compreendi facilmente os assuntos de historia, língua portuguesa e inglês que foram despejados a seguir. Mal comecei o ano e já estreei o meu caderno. E em várias matérias.

O sino tocou. As pessoas pularam animadas da carteira e se despediram enquando desciam as escadas (e rampa) para ir embora. Dei um ultimo abraço em Bia e nos despedimos. Às vezes, parecíamos duas patricinhas. Desci também e fiquei esperando em um banco. A escola estava esvaziando e nada do meu pai vir me buscar. Ele sempre demorava, mas hoje estava demais. Resolvi ir até o banheiro, mas a caminho, percebi que o Caio estava sentado um dos bancos, sozinho. Aliás, só tinha eu e ele ali. E o porteiro. Ele fez sinal com a cabeça pra eu me aproximar. Estranho. Ano passado ele costumava ir a pé pra casa. E mal nos falávamos. O que ele queria?

- Oi.- eu disse.

-Oi...

Ele parecia receoso, com medo de falar. Eu pus novamente os fones de ouvido, fitando a tela do celular e tentando escolher uma música, enquanto ele dizia algo.

-Desculpe, o que disse?

- Nada. É que me disseram que você está afim de mim. É verdade?