Enterro

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[...]

— Dá para demorar mais a se arrumar, Bethany.— Diz o meu irmão irônico.

Estou me arrumando para ir ao enterro. Isso é tão difícil, vou enterrar alguém que eu amo muito. Não vou mais pode abraçar a minha vó, amava quando ela me mimava. As melhores lembranças que eu tenho com ela, serão para sempre guardadas no meu coração. Eu amava quando ela me acordava com um prato cheio de mamão, quando eu dormia na casa dela, sim, mamão. Meu Deus! Que coisa mais difícil.

Coloco um vestido florido. Ele é bem alegre, do jeitinho que ela falou. Ela sempre dizia que não queria ninguém triste quando ela se fosse. Ela costumava dizer "Temos que chorar apenas pela aqueles que estão vivos., e nos alegrar pelas coisas boas que os mortos já fizeram.".

Quando chego na sala, minha família toda me olha, como se eu fosse um ET.

— O que foi?— Pergunto.

—Bethany, por que você está usando um vestido florido? Todo mundo está de preto.— Diz o Eduardo.

— Porque eu sou diferente.— Digo.

— Mas é um enterro, Bethany.— Diz Eduardo.

— A vovó sempre dizia que não queria a gente triste quando isso acontecesse.— Digo.

— Mas querida, você não pode aparecer assim. É falta de respeito.— Diz minha mãe.

— Sophie, deixa ela. Bethany está certa, minha mãe sempre dizia que não queria ninguém triste. E o que é mais alegre que usar um vestido florido?— Meu pai se manifesta.— Você está linda, minha flor!— Diz ele que em seguida dá um beijo na minha cabeça.

— Obrigada, papai!— Digo e dou um abraço nele.

Estávamos saindo de casa quando:

— Bethany, espera! Não vai se esquecer isso.— Diz Eduardo me entregando meu violão. 

Pego o violão das mãos dele e dou um sorriso ao perceber que ele combina com o meu vestido florido.

Eu amo meu irmão.

[...]

Todos estavam lá. Meu tio, minha prima, minha tia Irene, irmã da vovó e todos os amigos que minha avó fez durante os anos.

Alguém coloca a mão no meu ombro e eu me viro.

Felipe.

— Estar tudo bem?—  Ele me pergunta. Não consigo falar, não consigo dizer que está tudo bem porque eu estaria mentido. Ele percebe o meu olhar triste e me abraça.

Eu amo o meu irmão que não é de sangue.

Depois de abraçar, Felipe vai na direção do Eduardo. De longe vejo o meu pai me chamar e vou até ele.

— Filha, quero que você encontre o seu tio, não o estou vendo.— Pede o meu pai.

Concordo e vou procurar o meu tio. Eu não sei aonde ele possa está. Começo a correr por todo o cemitério para o encontrar. De longe vejo alguém sentado em uma sepultura. Meu tio. Chego mais perto e vejo que ele está com uma garrafa de whisky.

Mas por que ele está aqui? Ele voltou a beber?

Quando vejo de quem é a sepultura meu coração para. Sinto um arrepio. Meu avô. Não consigo aguenta a emoção e acabo deixando uma lágrima rolar. Meu tio percebe a minha presença ali e vira o rosto. Posso jurar que o vir chorando.

— Tio Victor?

— O que foi, Bethany?— Pergunta ele um pouco alterado.

Eu poderia falar que o meu pai está o chamando e sair dali, mas eu não posso fazer isso. Se fosse qualquer pessoa eu ajudaria e porque não ajudar uma pessoa da minha própria família.

— O senhor tem saudade dele?— Pergunto me referindo ao meu avô. Ele bebe um gole da garrafa e me olha.

— Sim, ele era o meu pai. Ele sempre me apoiou, mesmo eu fazendo as coisas erradas, ele me orientava.— Desabafar ele. Meu tio bebe mais um gole.

— Pra quê isso?— Digo apontando para a bebida.

— Para me consolar.— Diz curto e grosso. Mais um gole.

— Você não precisa disso. Tio, o senhor sabe sobre Deus, aproveita essa oportunidade, você conhece o consolador, porque você quer um protótipo?

— Você está falando de Deus?— Ele se levanta meio tonto e aponta para o céu.— Esse cara aqui de cima.—  Agora ele aponta para sepultura.— Matou o meu pai. Que fez tudo por Ele. E agora, o todo Poderoso levou a minha mãe. Bethany, escape o quanto antes dessa escravidão. Ele vai consumir tudo de você e quando você precisar Dele, o todo Poderoso não estará lá.

— Desculpa, Tio! Mas quem está numa escravidão é você. Como você não enxergar? Olha você! Está escravo da bebida.— Digo apontando para a garrafa. Ele deixa a garrafa escorregar, se ajoelha e grita.

— PARA! CALA A BOCA! OLHA O QUE VOCÊ FEZ!— Diz ele que logo em seguida se levanta e vem na minha direção ferozmente.— Você vai acabar como ele.—    Ele aponta para a sepultura e se aproxima cada vez mais. Dou alguns passos para trás.

Quando ele está próximo percebo que ele carrega um pedaço da garrafa quebrada na mão.

— PAI! PARA!— Gritou alguém de longe.

Meu tio instantaneamente para de vim em minha direção.

Ele ia me machucar.

 Pai! Você está alterado. Quem lhe deu bebida?—Diz Isabela revoltada.

Meu tio ia me atacar com um caco de vidro.

—Vai para o carro. Encontro o senhor lá.— Ordena Isabela e tio Victor obedece.

Meu tio...

Estou em choque. Meu próprio tio ia me atacar com um caco de vidro.

Mas ele estava sobre efeito de álcool.

Fico completamente chocada ao ver o que uma pessoa escravizada pelo o álcool pode fazer. Ele poderia me machucar. Mas a maior parte do motivo de ele ir me atacar não era o fato de estava sobre o efeito do álcool e sim a magoa. Nunca percebi o quanto o meu tio tinha magoa no coração. Ele precisa se libertar.

Talvez a maior prisão da vida dele nem seja a bebida. Talvez seja a raiva misturada com a mágoa de perder alguém amado. Será que a raiva é tão poderosa assim? A ponto de deixar uma pessoa cega? Hoje percebi claramente que sim! A raiva é uma prisão, ela impede de vermos além, nos limita ao pouco.

Eu fiz uma escolha. Não quero ser rancorosa, não quero ter um coração com raiva.

Tenho que mostrar ao meu tio, o qual bom é fazer essa escolha.

Eu não posso convencer ele, mas conheço alguém.

— Tudo bem, Bethany?—Perguntou a Isabela preocupada. Dei um sorriso amarelo e respondi:

— Sim. Está tudo bem!

— Desculpa pelo comportamento do meu pai, quando ele bebe álcool fica um pouco alterado. Vou levar ele para casa. - diz Isabela.

— Mas e o enterro?— Pergunto.

— Ele não pode voltar pra lá desse jeito.

Apenas concordei.

[...]

Vejo minha avó pela a última vez. Ela dorme serenamente. Seu lindo cabelo grisalho já não esbanja mais vida. Sua pele está pálida. Ela está linda, o seu vestido amarelo cobre a boa parte de seu corpo, deixando apenas seus braços e a sua cabeça descobertas. Seu último suspiro foi dado, sua alma já não mora aqui. As minhas esperanças acabou quando a terra cobriu o caixa. Nós humanos só temos a plena certeza que algo aconteceu quando vemos com os nossos próprios olhos. Por isso, pode ser difícil ser um cristão cheio de fé, nós ainda não vimos Deus, um dia o veremos, mas até lá temos que crer sem ver. Isso se chama fé.

"1 Pedro: 3. 15. antes santificai em vossos corações a Cristo como Senhor; e estai sempre preparados para responder com mansidão e temor a todo aquele que vos pedir a razão da esperança que há em vós;"


Eu sou diferenteOnde histórias criam vida. Descubra agora