VOVÓ É UMA UVA

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A palavra avó nos remete à infância, quando passávamos o domingo numa casa

cheirando à comida, com toalhinhas de crochê decorando todos os ambientes e um quarto

sempre na penumbra, com móveis de madeira maciça e uma enorme cadeira de balanço, onde

cochilava a matriarca. Parece com a casa da sua avó também? Pois guarde esta imagem na

lembrança, pois ela não se reproduzirá tão cedo. Já não se fazem mais avós como antigamente.

Os estereótipos não são criados do nada: as avós eram assim mesmo, de cabelo branco

e óculos pendurados no nariz. Toda família que se preze teve sua Dona Benta, e a imagem é

tão forte que até hoje os comerciais de tevê insistem em caracterizar as vovós como senhoras

idosas, rechonchudas, com aventais amarrados na cintura, cabelos presos num coque e aquele

ar de quem não faz outra coisa na vida a não ser torta de amoras. E os avôs? Seja na televisão

ou no rádio, todos têm voz de Papai Noel, enquanto que, na realidade, os avôs da nova era

estão mais para Mick Jagger, que aliás, já tem um neto. Acorde: os avós de hoje não lembram

mais das canções de ninar, mas sabem de cor a letra de Satisfaction.

Quer dizer que o lobo mau conseguiu engolir nossa vovozinha? As que usavam

touquinha e tinham voz rouca foram papadas, sim, meus pêsames. Mas olhe agora, o que

vemos? Avós de jeans, dirigindo jipes, cabelo pintado, óculos escuros. Avós que trabalham,

que viajam, que dão festas, que namoram. Avós que fazem lipo, aeróbica, jogam paddle e

suspiram não pelo Lima Duarte, mas pelo Vitor Fasano. Será que elas sabem pregar um botão?

Não custa tentar, mas se a empreitada der errado, não complique. Ela terá o maior prazer em

levar a netinha para comprar uma roupa nova no shopping. E o almoço de domingo? Também

mudou. As avós de hoje não andam dispostas a engordar nem um grama com macarronadas

familiares e muito menos a quebrar suas garras vermelhas lavando panelas. Que tal um buffet

frio, muita água mineral e salada de frutas? Combinado, ela entra com a água.

Netos e netas, não se sintam desamparados. As avós de hoje são muito mais

participantes. Podem não lembrar direito das histórias de Gulliver, Pele de Asno ou O Gato

de Botas, mas têm histórias pessoais tão encantadoras quanto. São mais divertidas e menos

preconceituosas. Têm mais saúde e disposição para enfrentar parques, teatrinhos, zoológicos.

E o fato de buscarem a eterna juventude não lhes tirou um pingo do afeto que sentem pela

terceira geração. Ao contrário: nunca vi tantas avós apaixonadas por seus netos. É um amor

enorme, desinteressado, sem o ônus do compromisso, só do prazer. Sempre foi assim, mas

agora há um fator novo: hoje as mulheres têm menos filhos, e em conseqüência, menos netos.

Antigamente a família era gigantesca, e não havia memória que chegasse para lembrar o nome

de toda a criançada. Hoje são só dois ou três, dá até para providenciar um mini-hotelzinho em

casa para hospedá-los no final de semana. Tem mais: o limite de idade para engravidar foi

muito ampliado, e hoje uma mulher pode ser mãe e avó quase ao mesmo tempo, encurtando as

diferenças entre uma e outra. Se por um lado estamos perdendo a imagem romântica da avó

que cozinha, faz tricô e tem roseiras no quintal, por outro estamos ganhando uma avó bonitona,

que tem o maior orgulho ao falar de nós para as amigas e que sempre estará disposta a nos dar

um colo. Desde que esteja com uma roupa de microfibra, bem entendido.

O amor, que é o que interessa, não mudou. Mas mudaram as avós. Danuza Leão, Baby Consuelo, Constanza Pascolato e tantas outras mulheres que falam gíria, bebem cerveja e estão

sempre prontas para uma novidade são avós tanto quanto as nossas saudosas velhinhas de

casaquinho nos ombros. Vera Fischer, Betty Lago e tantas outras gatas desta geração também já

têm filhos adolescentes que não tardarão a procriar. Passarão, como toda mulher, pela

menopausa, pela osteoporose e por outros distúrbios da idade, mas certamente não aceitarão o

papel de uma avó caseira, bordadeira e sem outra ambição que não seja cuidar dos netos.

Sempre se disse que a avó era uma segunda mãe. Pois ela nunca esteve tão parecida com a

primeira.

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