Ser mãe é padecer no paraíso. Quem criou esta frase foi uma mãe, lógico. A questão é:
onde estava ela em momento tão inspirado? Esquentando mamadeira às quatro da manhã?
Limpando o pudim que o filho deixou cair no tapete felpudo? Arrisco um palpite: ela estava
organizando um aniversário de criança.
Quando eu era menininha, pouco tempo atrás, aniversário era uma coisa simples.
Alguns convidados, um bolo, velinhas, bala de goma, negrinho, cachorro-quente. As crianças
brincavam, depois cantavam o parabéns, tiravam fotos e estava festejado. Era assim com
pobres e ricos, não havia grandes variações.
Mas todos sabemos do que é capaz a imaginação humana. Aniversário de criança, hoje,
requer a contratação de um serviço de cerimonial. Exagero? Então me acompanhe.
O bolo sumiu. Não existe mais bolo de aniversário, e sim umas caixas de isopor
enormes, que podem representar tanto um estádio de futebol como a floresta da Pocahontas.
Você sabe: aniversário de criança tem que ter "motivo". Branca de Neve, Cavaleiros do
Zodíaco, Mamonas. No meu tempo, o motivo era a gente ter nascido naquele dia.
Velinha também virou peça de museu. Agora acende-se uns palitos que podem até cegar
o aniversariante. Não assopra-se, apenas torce-se para que não exploda.
Lembra de jujuba, confete, delicado? Esqueça. Quanto mais chique o aniversário,
menos porcaria. Bastam duas caixas de Bis e aqueles chicletes que têm uma gosma dentro.
Você é do tempo em que as crianças comiam nas festinhas? Nossa, como você é antiga.
Mais importante do que o bolo que não existe e as velinhas que ninguém assopra é a
recreacionista que todos veneram. Merecem ser canonizadas. Vestir-se de Minnie e enfrentar a
pirralhada não é vocação: é chamado de Deus. Mas elas também sabem ser malvadas.
Colocam a criançada em fila e pintam suas mãozinhas e bochechas com uma mistura de cola e
purpurina que só sai esfregando com força na roupinha nova.
É hora do balão surpresa, uma brincadeira suicida. Quinhentas crianças amontoam-se
embaixo de um balão que, ao ser estourado, deixa cair meia dúzia de balas de hortelã.
Arranhões, mordidas, bofetadas. Parece o auditório do Sílvio Santos no Topa Tudo por
Dinheiro.
Por que elas não brincam no jardim? Não faça essa pergunta se não quiser revelar sua
idade. Playground, salões de festa, casas de aluguel, tudo com bastante concreto, assim é que
é. Atualize-se.
E ao encerrar o evento, mais uma modernice: a famigerada lembrancinha. As crianças
só participam da festa porque sabem que no final receberão um prêmio por terem
comparecido. Ao chegar, elas já intimam a mãe do aniversariante: vai ter lembrancinha?
Dependendo da resposta, voltam para casa. Educação suíça.
Por que suportamos tudo caladas? Porque mãe é sinônimo de sacrifício, entrega,
benemerência. Porque só se é criança uma vez e chegará o dia em que, em vez de festa, eles
vão querer a parte deles em dinheiro. Esse dia já chegou para você? Do fundo do coração,
parabéns.
Março/97