- Como ela está, Leonel?
Leonel respira fundo.
- Muito mal. Ela pode morrer, perdeu sangue, quebrou o braço, sofreu uma parada cardíaca e só respira com a ajuda do aparelho.
Minha mãe chora, até meu pai que havia me expulsado de casa. Coitado deles. Érodys, Taylison, Yany e Maryelli estão aflitos na sala de espera.
- Eu falei para ela não sair, eu falei. Ela não me ouviu - diz Érodys, perplexo.
- Vocês vão ficar aqui? - pergunta Leonel meio sem jeito.
- Vamos - responde meu pai.
- Ela ainda não pode receber visitas, foi operada há meia hora.
- A que horas vamos poder visitá-la? - pergunta papai.
- Daqui a quarenta minutos.
- Vamos esperar.
- Ok. Se me dão licença...
- Aonde vai? - Yany fala.
- Voltar ao trabalho.
Ele sai, deixando minha família na sala de espera. Eles estão tristes, desanimados, preocupados. O que fazer? Todo mundo está em prantos de choro. Talvez, se eles me acolhessem dentro de casa, eu não estaria aqui na UTI morrendo aos poucos.
Leonel passa pela porta do quarto em que estou internada, ele para por uns segundos. Parece atônito, leva as mãos na nunca e decide entrar. Ele olha para mim com espanto, consigo sentir sua aproximação, e está chorando, nunca vi Leonel assim. Será que ele me ama? O colchão da cama pesa do lado direito. Ele pega minha mão e beija.
- O que você fez, Esther? Por que não obedece os mais velhos? - ele afaga as costas da minha mão.
Eu quero acordar! Por favor, Leonel, me ajude. Eu quero acordar!
- Vai demorar para você acordar - balbucia como se lesse meus devaneios. - Me perdoe, por favor. Eu fui grosseiro com você todo esse tempo, agi sem pensar. Você é a melhor coisa que já aconteceu na minha vida. Quero que acorde para me ajudar a enfrentar meus pesadelos, que me faz essa pessoa má e ignorante com todos ao meu redor.
O que ele está falando? Que pesadelo? Eu já sei de tudo. A Jaqui é culpada, eu sei. Tento me mexer, mas é impossível, minhas costas dói, meu braço, minha cabeça, dentro do meu ventre, em minha clavícula. Tudo em mim dói, parece que fui cortada em todos os lugares do meu corpo.
A preocupação toma conta de mim, minha família está na sala de espera, muito aflitos. O que eu fiz comigo? Aquele acidente... A correria... O carro explodindo... Meu Deus! Foi rápido demais em minha visão, de repente, eu apaguei. Agora estou numa UTI morrendo aos poucos, eu precinto.
- Você não vai morrer, Esther, eu garanto. Farei de tudo para te ver bem, eu vou te salvar. Você vai ser feliz de novo. Preciso que acorde, por favor, quero ouvir sua voz, a mesma que me hipnotizou na sala de aula.
As palavras dele fazem meu corpo relaxar na cama. Leonel respira, leva minha mão em seu peito nu por entre a camisa e o jaleco. Seu coração bate forte, bem forte.
- Eu quero você de novo, saudável, com saúde e alegre. Lute, Esther, lute para viver.
Meu inconsciente me atormenta com a mesma frase de Leonel. Tenho que lutar para voltar ao meu mundo. É difícil, muito difícil. Estou imobilizada nessa maldita cama nem me mexo direito. Quero acordar, droga! Estou a quanto tempo dormindo?06:12 AM
NO DIA SEGUINTE, uma coisa acorda dentro de mim, ele sai do meu corpo, fica em pé me olhando atentamente. Sou eu, eu mesma. Contemplo-me por minutos e minutos, e vejo que estou mal. Meu braço esquerdo está engessado, minha boca com dois grandes canudos, meus dedos com fios que vão ao monitorador. Estou muito magra, aparento pesar menos de 40kg. O que foi? Por que me tornei uma esqueleto tão rápido?
Uma pessoa entra no quarto, duas aliás, não... quatro. Meus pais e meus dois irmãos. Eles se aproximam da cama com um nó na garganta. Athos Júnior chorando é bem impressionante; o grande empresário, intrépido e ignorante está no ato de benevolência com a filha que ele dizia ser uma perdida. Não sei se quando eu voltar, vou ser a mesma Esther boazinha com ele. Athos me magoou, jogou na minha cara que eu não era sua filha, me expulsou de casa no momento em que eu mais precisava.
Ele pega minha mão, mas o monitor dispara. A pressão arterial e a temperatura do meu corpo aumentam à medida que a raiva me contamina. Minha família entra em desespero, Taylison corre para chamar a enfermeira e Érodys só põe as duas mãos na cabeça, amedrontado.
- Filha - minha mãe berra, chorando.
Ela pega minha mão rapidamente e o aparelho cessa e volta ao normal. Athos Júnior Winkler não pode me tocar! Ele tem que ver e perceber que sua presença não me faz bem. A enfermeira entra no quarto saltitando.
- O que houve, senhora?
- Não sei, de repente o aparelho dela alarmou e depois cessou.
A enfermeira verifica o monitor. Ela é gorda, cabelos cacheados, aparenta ter uns quarenta e poucos anos.
- A temperatura do corpo dela subiu, mas é estranho... ela voltou ao normal.
Athos avalia cada palavra que sai da boca da enfermeira, deixando de acreditar. Você é o culpado.
- Meu pai a tocou agora a pouco nas mãos, o aparelho disparou. Por que isso aconteceu? - pergunta Érodys à enfermeira. Ela é pêga de surpresa.
- Não sei explicar, rapaz, mas, talvez, o Dr. Blanchard. Vou chamá-lo.
Ela some do quarto.
- É pai... talvez a sua filha esteja com raiva de você.
Isso mesmo. Ele fita Érodys, incrédulo.
- Não! Eu...
- Aí, todo mundo sabe como você a tratou mal, colocou a pobre menina para fora de casa, jogou na cara dela que ela não era mesmo a sua filha.
Meu pai engole em seco. A verdade doeu. Ele baixa a cabeça. Taylison entra junto com Leonel no quarto meio minuto depois.
- Por que a temperatura do corpo dela subiu, Leonel? - minha mãe toma as inquisições.
Ele checa o aparelho, ilumina meus olhos com uma pequena lanterna e volta a atenção para a minha mãe.
- Há vários tipos de fatores, Sra. Winkler: a temperatura subiu por falta de oxigênio, ela pode estar passando pelos suplícios da cirurgia, ou também pode ter reações, como sentir coisas inoportunas ao seu redor.
Minha mãe fica pasma diante das palavras de Leonel. Érodys joga um olhar para o meu pai como quem diz: "Não falei?".
- Como assim? - diz Athos.
- Alguém tocou nela?
- Eu a toquei primeiro, mas depois veio minha mulher, pegou em sua mão e o aparelho parou de alarmar de repente.
- Talvez seja por isso. Seus toques devem ser contundentes às reações dela.
- E por que isso?
Meu pai já está perdendo a paciência.
- Você deve ter a resposta, não? - Leonel o repreende com um tom de arrogância.
Bem-feito! Às vezes a agressividade dele é ótima para acabar com a tenência de certos sisudos, como meu pai, por exemplo. Ele é um executivo sério, em certos aspectos, até repugnante.
- Eu falei, papai - balbucia Érodys.
- Quer dizer que eu não posso tocar minha própria filha?
- Agora você a considera como filha? Não era você o responsável por jugá-la mal, colocá-la para fora de casa e dizer que era uma perdida?
Athos engole em seco de novo. Continue, Leonel, estou gostando.
- Você é o culpado.
- Oras, Leonel. Não ouse a falar assim comigo - ele altera a voz. Leonel o encara, impassível.
- Eu não tenho medo de você, Athos Júnior. Em primeiro lugar, não altere a voz dentro de um hospital, é para isso que serve as placas fixadas na porta dos quartos. Em segundo, médico nenhum é obrigado a ouvir descasos de pais que abandonam seus filhos na hora em que eles mais precisam.
Meu inconsciente aplaude Leonel em pé, muito alegre e sorridente, eu também.
- Vou dar mais três minutos para ficarem aqui. O horária de visita está encerrando, agora é só a partir de uma hora da tarde.
- Podemos passar a noite aqui? - pergunta Érodys.
- Sim. Vou dar plantão à noite inteira, se precisarem de mim, estarei no consultório do corredor à direita.
- Obrigado, Leonel - minha mãe agradece com um sorriso sardônico.
- De nada, Sra. Winkler.
07:26 PMA NOITE CHEGA, só há uma pessoa no quarto. Ela está sentada na cadeira com a mão esquerda segurando a minha, outra está posada sob o tecido grosso do cobertor. O ar está um pouco frio. O aparelho que mede minha pressão arterial e o temperamento do meu corpo faz um barulhinho insuportável. Tin, tin, tin, tin...
Por que estou demorando para acordar? Eu queria ver a luz, ver as pessoas que amo, respirar sem esses tubos que estão enfiados em minha boca, sair dessa cama e andar livremente. Quero que alguém me ajude. Nem mexo meus dedos, às vezes eu tento, mas fico enervada rapidamente.
- Esther.
Essa voz... De quem é essa voz, meu Deus?
- Esther.
Que isso? A mão dessa pessoa está esquentando a minha de forma reverente, mas ao mesmo tempo assustadora. O timbre do som é agudo, parece que está vindo de um buraco escuro, assombroso. É macia, benevolente, mas é do mal, eu sinto.
- Esther.
Ai! Está quente essa droga de mão. Quero que essa pessoa saia daqui, quero que saia imediatamente! O lençol da cama parece estar pegando fogo, minhas mãos e meu corpo ardem de tão quente.
Fito-me sob a cama. Um homem vestido de preto, bem preto, segura minha mão. Ele está evaporando fumaça pela roupa. Não é gente. Que roupa é essa? Nunca vi nada igual.
Tente acordar, Esther. Isso não é uma pessoa, é um demônio. Ele é mal, impertinente, assombroso. Sua roupa ferve com o fogo que está ao redor da cama. Ele quer te matar, Marihá. Fuja! Fuja! Fuja, droga! Acorde! Tente! Mexa os dedos!
Meu Deus! Não consigo, estou totalmente impotente.
Ele vai te levar, Esther.
- Você vai morrer, querida - assobia fortemente.
Meu ouvidos vão explodir desse jeito. Meu corpo arrepia à medida que o ar quente toma conta de mim. O aparelho dispara, alarmando o quarto inteiro.
Não acredito. Não! Eu morri? O que está acontecendo? O que está acontecendo?
Caminho por uma longa estrada coberta de flores roxas e vermelhas, o caminho é longo. No fundo, há um alvor que resplandece um círculo grande da entrada, a luz brilha fortemente. Eu estou aproximando dessa luz. É a paz, é a minha paz, a paz que preciso, mas logo volto retrospectivamente. Nem dá para ver nada quando acontece.
Enfermeiros e médicos estão em cima de mim. Todos com medo e ao mesmo tempo aliviados.
- Ela voltou, doutor - diz uma enfermeira à Leonel.
- Ah, meu Deus! Obrigado, Senhor - ele solta um suspiro pesadamente.
- Está tudo ok.
- Pode saírem.
A respiração de Leonel é ofegante. Os enfermeiros saem pela porta. Leonel me olha, incrédulo. Ele afaga minhas mãos.
- Esther - chora.
Ahn? Ele está chorando de novo? Nossa!
- Lute pela sua vida. Você teve duas paradas cardíacas! Lute, por favor. Eu não posso viver sem você, Esther, meu anjo - implora com a voz angustiada.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Minha estúpida coragem
RomanceInconformada com a vida sem o prestigioso Leonel Blanchard, Esther vê seu mundo desabar ao se mudar para Porto Alegre. E nessa jornada, ela descobrirá um Leonel sem escrúpulos, possessivo além da conta e descontrolado. Esther se vê sem saída ao p...