Capítulo 32

4.1K 252 2
                                    

   Em casa, sou cuidada com maior carinho por Leonel e por Yany. Lembro-me de quando me cortei pela primeira vez em anos, eu estava na sala de anatomia estudando. Nossa, dói muito um corte de faca. Estou sentada na cama recebendo os cuidados de Leonel quando ele pergunta:
— Por que diabo você teve que aparecer lá?
— É evidente de que foi para evitar uma tragédia.
— Não me importo se eu for preso um dia.
   Como é que é?
— Leonel, você não sabe o que está dizendo.
— Ah, pode acreditar que sei, senhorita.
   Olho zangada para ele.
— Precisamos conversar — murmuro bem baixinho.
   Yany entende o que quero dizer, então, sai do quarto depois que pede licença.
   Coragem, Esther. Você vai superar tudo depois.
— Fale — Leonel se ajeita na cama de modo que fica com o corpo ereto.
  Ainda não caiu a fixa que esse homem, que está sexy com o lábio cortado, um pouco de hematomas no rosto e o cabelo bagunçado, sofre de Transtorno Obsessivo Compulsivo. Agora é hora de disparar o assunto.
— Não posso mais ficar com você. Estou abrindo mão desse relacionamento.
   Ele fica branco na hora — mais do que já é. Me encarando, ele ainda consegue respirar. Fecha os olhos e depois abre.
— O quê?
   Meu olhar transparece fugazmente com o dele, furioso.
— Foi o que você ouviu.
   O mundo desaba aos seus pés.
— Por quê?
   Sua voz é áspera demais para o meu gosto. Isso me dá medo. Encaro minhas mãos sobre meu colo. Será que devo falar a verdade? Será que devo mentir?
   Ah, céus!
— Quero o melhor para você, Leonel. — Que é ficar longe de mim.
Sou eu quem decido isso.
   Vai, troxa.
Leonel, entenda. Você precisa se cuidar.
   Ele suspira fundo com fúria, e posso ouvi-lo. Nossa!
— Eu não vou aceitar, jamais — diz ele amargamente olhando-me nos olhos. — Foi aquele doutor ordinário?
— Não! Sou eu.
   Agora ele está invertendo as coisas. Leonel se aproxima de mim na cama, zangado.
— É o Edward, não é? — se aproxima mais ainda, pega meu queixo e aperta.
— Ai — gemo. — Por favor, não.
— Não? Não digo eu — rosna.
   Ele pode se tornar mais agressivo com o passar do tempo, Srta. Winkler
   As palavras daquele médico não saem da minha cabeça. Seguro seu pulso, totalmente impotente ao que ele pode fazer comigo.
— Se você tiver outro, eu juro que te mato — murmura ele.
   Não duvido nada.
Também não é isso. Nunca tive outro, ao contrário de você — rebato.
   Ele engole em seco, mas é a pura verdade, ele confessou que saía com outras mulheres quando mal me conhecia. E aparta meu queixo de novo, levando meu corpo para o seu.
— Me solte — esperneio contra os músculos do peito e o braço dele.
   É difícil sair, mas ele me solta para minha surpresa.
— Eu não vou deixar isso barato, ah, não mesmo — Leonel me encara, curvando os olhos ao fechar a porta do quarto.
   Ufa! Achei que a tortura ia durar, mas a dor de ter o deixado agora aperta meu coração — que já vivia amargurada há alguns meses atrás. Me seguro por um tempo para não cair em choros. Aguente, Esther.
   É para o seu bem e o bem dele.
   Droga! Como vou ficar agora? Levanto-me da cama ao ouvir o ronco do carro dele lá embaixo. Ele não para de acelerar sua R8 preta, o carro estronda a residencial inteira, fazendo barulho e Leonel sai cantando pneu. Ele está muito descontrolado no volante, é perigoso demais.
   Dou uma checada em meu celular a fim de saber se tem alguma novidade, e, sim, tem. Uma mensagem de Leonel, chegou agora a pouco.

Leonel
Eu nunca vou dar a paz que você tanto quer, sempre vou estar te vigiando. Nenhum filho da puta vai ter a sorte de roubar você de mim. Estou avisando. Não brinque comigo. VOU TE VIGIAR O TEMPO INTEIRO, ESTHER, PORQUE VOCÊ É MINHA!

   Engulo minha saliva, relendo a mesagem. O que é isso? Olho a tela com repugnância.
   Uma ameaça.
   Yany entra no quarto.
— Esther, você está bem?
   Ela avalia minha reação, como uma amiga que se preocupa. Deixo o celular em cima da cômoda.
— Estou bem.
— O que aconteceu entre vocês, hein?
   Nos sentamos na cama.
— Ah, Yany, é difícil entender. Eu preciso me afastar dele.
— Ele já tentou te matar uma vez e é só agora você percebe?
   Encaro Yany, amedrontada.
— É sério. O médico dele disse isso. Leonel sofre de Transtorno Obsessivo Compulsivo.
— Ah.
   Ela parece surpresa.
— Estou surpresa, amiga. Sinto muito.
— Por isso eu abri mão da nossa relação.
— Para o bem dele.
— E o meu — emendo sua frase.
— Nossa, Esther — Yany leva a mão na cabeça e paira nos labios, incrédula. — Agora tudo se encaixa: a obsessão que ele tem por você, o ciúme incontrolável e a agressividade com as pessoas.
— Ele sempre foi assim? — indago.
— Não. No começo das aulas, ele era um professor paciente com os alunos, mas depois que veio a traição da ex-mulher, ele desandou a ser mais bruto tanto no diálogo quanto no modo de tratar as pessoas.
— Eu percebi quando o conheci pela primeira vez.
   Ela me encara, agora curiosa.
— Ele já te tratou mal quando começaram a se conhecer?
— Uma vez.
— Como foi?
— Péssimo. Achei que eu ia levar uma surra dele no estacionamento da Faculdade de Medicina só porque eu acertei a traseira de seu carro.
   Ela dá uma risada.
— Você nunca me contou isso. Não sabia dirigir?
— Claro que sim. Sei desde os meus dezesseis anos de idade.
   Ela ri sem parar e cai para trás na cama, jogo um travesseiro nela e ela me acerta com outro.
— Ah, amiga, sério, não vou esquecer essa história tão fácil.
— Droga, Yany! Eu não devia nem ter contado a você — cruzo os braços à frente dos seios, fazendo cara feia.
— Mais contou.
— Idiota.
   Ela continua com a ceninha patética de ficar rindo de mim. Para não acompanhar, decido tomar um banho.

Minha estúpida coragemOnde histórias criam vida. Descubra agora