Capítulo 20

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12:20 PM

  Hoje tive mais um daqueles pesadelos horríveis, é engraçado, eu tenho pesadelos e com o passar do tempo penso que isso vai acontecer. Paranóia! Já descartei todos esses pensamentos, a partir de hoje não vou mais me imaginar dentro de um caixão, me matando por coisas fúteis, ou vendo uma pessoa que eu amo sendo morta. Só sonho com morte, minha nossa. Será que é porque estou quase no auge da medicina? Não, pare com isso, Esther. Quem está no auge mesmo é o Dr. Elliel Mandubi, Oliver Lins e Leonel Blanchard.
   Bom, nunca falei dos meus antigos professores, pois agora vou falar. Primeiro é sobre o Oliver. O Oliver, sinceramente, era um coroa bonitão, sabe? Do tipo que toda mulher interesseira de meia-idade (ainda existe velhas interesseiras) quer para se jogar em seu dinheiro. Ele é rico e já deve ter os seus cinquenta anos. Tenho uma revista que fala sobre a vida de todos os médicos da Faculdade de Medicina. Oliver já fez intercâmbio nos Estados Unidos, viajou para vários lugares fora do Brasil. Ele se casou novamente com uma dentista chamada Katherine, tem três filhos, um com ela e dois com o primeiro casamento. Ele se separou da primeira esposa porque foi traído.
   Oliver também é amigão do Leonel, eu sempre via os dois conversando na cafeteria da faculdade. Lembro da vez em que quase fui violentada por um bandido que estava atrás do meu carro, aí chegou o Oliver e o Leonel para me salvar, como sempre o Dr. Lins ficava desconfiado quando seu amigo me consolava ou ficava jogando conversa fora comigo. Eu não dava a mínima para as pessoas, eu só queria ser feliz com Leonel. Muitos dos meus colegas cochichavam: Ele deve estar saindo com ela fora da faculdade; Ele já comeu ela; O professor pegando meninhas? ou, Esther está muito grudada a esse professor. Eu não ligava com isso. Não mesmo. Acho que se eu tivesse dado importância a essas pessoas (hoje, me causam repugnância) eu nunca ia conseguir o que eu tinha em mente com Leonel a meu lado.
   Dica: se você dar importância com o que os outros pensam e falam de você, você nunca vai conseguir fazer aquilo que quer ou que gosta.
   Eu fazia isso, ainda confirmava. Como um dia em que eu dei um abraço de despedida em Leonel. Ele não ia me acompanhar até a garagem nesse dia, como fazia todas as vezes em que saímos juntos. Duas morenas, ambos Paola, encorpadas, mexeram comigo ao ver a cena dentro da sala, com certeza estavam com dor de cotovelo.
— Ai, que lindo, ela sempre dá um beijinho de despedida em nosso professor.
   Olho para elas com cara feia.
— Não acha que é muito nova para ele, boneca?
— Cuidem de vocês, eu aconselho — digo.
   Elas dão uma risadinha falsa.
— Reparou nela, Paola? A garota só vem de sainha.
— Para ficar mais fácil para o doutor, não é, Esther?
   Pego os livros nas mãos e saio da bendita sala, com raiva e saltitando.
   Naquele dia eu queria me enfiar dentro de um buraco, estava com tanta vergonha que eu andava de cabeça baixa. Mas me senti orgulhosa mais tarde — encarei elas sem demonstrar medo. Eu também sei brigar, oras.
   Agora vou falar de Elliel, outro professor. Ele não é apenas um cirurgião, também fez faculdade de psicologia. Elliel já é um pouco velho, mas mais novo que Oliver se não me engano. Para mim ele era um excelente professor, tirava todas as minhas dúvidas na aula de anatomia. Elliel Mandubi — sobrenome esquisito — é casado com uma senhora de quarenta e seis anos, tem cinco filhos, três homens e duas mulheres, segundo ele, o filho mais velho cursa medicina na USP, em São Paulo.
   Termino de me arrumar para ir ao meu primeiro trabalho. Opto por uma saia preta de couro justa, cós alta e apertada na cintura, uma blusa vermelha enfiada por dentro da saia, uma jaqueta de couro preta e por último um salto alto preto. Me olho no espelho antes de descer. Bom, o cabelo liso vermelho-laranja solto, ok. Maquiagem, ok, batom vermelho, ok. Pronto.
   Desço as escadas e já percebo que tem gente conversando com Yany. Que será?
— Esther!
   Uma voz de homem? Ah, é nosso amigo da faculdade, Lorenzo Freitas, o ex-amigo de Thaly Alberto. Lorenzo é um cara legal, tem vinte e dois anos, é namorador, bonito, loiro igual ao por do sol. Ele me avisou que Thaly não era lá flor que se cheire, eu não acreditava, aí que comprovei com os meus próprios olhos.
— Oi, Lorenzo. Como vai?
   Ele me envolve num abraço.
— Bem. Você desceu muito tarde, já estou de saída.
— Veio de carro?
— Sim.
— Me deixa na porta do meu trabalho, assim a gente conversa um pouco mais.
— Ah, claro. Vamos.
— Vamos.
   Dou um beijo na bochecha de Yany.
— Cuidado com o doutor — sussurra ela em meu ouvido.
— Pode deixar.
   No caminho, Lorenzo e eu conversamos sobre muitas coisas que aconteceram nas nossas vidas. Ele mudou, e muito. Antes ele gostava de beber, zuar e ir à festas, agora parece um cara mais responsável e maduro.

Minha estúpida coragemOnde histórias criam vida. Descubra agora