Acordo com fortes dores na perna direita e na cabeça. Sei que já passou o efeito da anestesia. No relógio de parede vejo que são pouco mais das 6 da manhã. Logo me veio a recordação do acidente mas apenas uma coisa me dá vontade de chorar descontroladamente.
Eu perdi o meu bebê.
Nunca pensei que um bebê, um feto, mudaria tanto a minha vida. E eu estava feliz com ele. Estava com medo e preocupada mas feliz. E agora eu não serei mais mãe.
Meus pais estavam comigo quando eu recebi a notícia, logo assim que acordei ontem à noite. Eles ficaram com raiva de mim no primeiro instante, por eu não ter contado, mas depois choraram comigo e tentaram me ajudar.
Agora eu não tinha mais a que me apegar. Não quero ser exagerada, quero ser forte. Mas perder Lucas e o meu filho é demais pra mim. Eu não consigo ser forte o suficiente para suportar todo esse vazio que se instalou no meu coração.
Realmente minha mãe estava certa desde o início. Ela sempre teve um pé atrás em relação ao meu namoro. Imagino que não seja fácil ver sua filha viver uma paixão tão intensamente e em tão pouco tempo.
Eu quero acreditar que tudo isso foi um aprendizado, quero tirar proveito dessa situação mas ainda está recente demais, eu não consigo. Estou desolada.
O telefone do quarto toca e depois de muita relutância atendo, para ouvir os gritos de Enzo.
- Mel? Meu Deus, por quê fui o último a saber? Como você está?
Não conseguia ouvir essa pergunta e não chorar. Só de lembrar sinto uma dor agoniante no peito.
- Péssima. Eu não sei o que fazer, Enzo. Eu perdi... Perdi meu bebê.
- Como eu queria estar aí com você, Mel. Queria muito poder te consolar. Você podia vir pra cá passar uns tempos comigo. Sei que o nosso pai irá entender. Estou em negociação na compra de um bom apartamento, será perfeito para nós dois.
- Eu não quero pensar nisso agora. Ainda tenho faculdade e não posso me ausentar de repente. Mas vou me esforçar para fazer isso, preciso de um tempo longe. Eu vou desligar agora, tudo bem? Minha mãe já deve estar chegando para me ajudar com o banho.
- Está bem. Vai ficar tudo bem, você não está sozinha. Ligo pra você mais tarde. Eu amo você.
- Também amo você.
Encerro a ligação e me pego chorando mais uma vez. Será que esse sofrimento nunca irá passar?
******
Acordo assustada com algumas vozes no quarto. Vejo que minha mãe e uma médica estão ao meu lado e elas me olham apreensivas.
- Que bom que acordou, filha. Está com fome?- Minha mãe pergunta se aproximando.
- Não, só com sede.
Ela me dá um copo de suco de laranja na mão e ajusto a cama para ficar sentada.
- Melanie, eu sou a doutora Flávia e ficarei responsável pelo seu caso. Sou uma amiga do Rodrigo e ele pediu que eu cuidasse pessoalmente do seu caso.
Flávia era uma mulher muito bonita e jovem. Seus cabelos eram loiros bem curtos e seu olhar era penetrante. Ela disse com pesar a última frase mas depois deu um pequeno sorriso.
- Quando vou poder ir pra casa?
- Em breve.- Ela se aproxima de mim e senta na beirada da cama.- Eu sinto muito pela sua perda. Acredite, eu já passei por isso e sei exatamente como você está se sentindo. Mas quando grávidas sofrem um acidente como esse, por menor que seja o feto pode causar danos irreparáveis no útero.
Só de pensar que tinha a possibilidade de não ter mais filhos meus olhos se enchiam de lágrimas.
- Então, precisamos fazer alguns exames com você. Saber se está tudo realmente bem. Você quebrou a perna direita e está com esses arranhões e machucados pelo corpo mas temos que analisar melhor agora que você está consciente. Sente alguma dor?
- Minha cabeça está doendo e minha perna também.
- Ótimo.- Ela sorriu.- Isso é um ótimo sinal, você realmente é uma mulher muito forte. Vou pedir para trazerem seu almoço e depois faremos todos os exames necessários. Até logo.
Ela sai do quarto me deixando a sós com a minha mãe. Ficamos em silêncio até uma moça baixinha e gentil trazer meu almoço. Não sabia que estava com fome até olhar o grande filé mignon que estava a minha frente.
- Filha?- Minha mãe me chama.
- Sim.
- O que aconteceu entre você e Lucas?
Suspiro cansada. Não estou preparada para contar isso pra alguém, muito menos para a minha mãe. Eu a amo. Mas não me sinto a vontade para contar esse tipo de coisa.
- Não quero falar sobre isso. Você só precisa saber que não estamos mais juntos e que eu perdi o meu bebé por uma desatenção. A culpa é exclusivamente minha.
- Não diga isso!- Ela se levanta brava.- Você não é a culpada de nada. Foi um acidente.
- Eu sei. Um acidente porque eu não olhei para atravessar.- Reviro os olhos.
- Mel...- Ela me abraça e algumas lágrimas teimosas insistem em cair.- Por favor, não faça isso. A culpa não foi sua, filha. Você é jovem e linda, vai ter outros filhos em situações melhores, acredite. Eu te amo e estou aqui sempre que precisar.
Depois do almoço fiz todos os exames e felizmente estava tudo certo. Eu teria que ficar mais uns 2 dias em observação no hospital e tomando diversos medicamentos mas não havia nenhum dano no meu útero. Mas eu teria que me acostumar com a perna quebrada e com o vazio que se instalou na minha vida.
Eu só queria que toda essa tristeza fosse embora logo do meu coração mas eu não tinha forças para lutar contra.

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Um Recomeço
Literatura FemininaMelanie sempre foi uma menina doce e determinada. Prestes seguir os passos de seu pai Henry, ela se vê perdidamente apaixonada por Lucas. Mentiras, decepções e mágoas os afastam. Depois de anos, quando tudo parece estar dando certo um drama atinge t...