Capítulo 2

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Dias atuais...

A água morna do chuveiro se torna gelada e isso faz com que eu me dê conta de onde ainda estou. Decido estranhamente que, por hoje, a noite ainda não chegou ao fim. Não posso ir para casa desse jeito, isso só piora as coisas.

Visto minha roupa ainda no banheiro, me concentrando para o ardor em meus olhos e a aceleração dos meus batimentos cardíacos, que comprimem meu peito, não me traiam. Tenho reprimido muita emoção de merda ultimamente, e sempre levo uma porra de esforço para manter o controle quando me sinto assim.

Quando saio do banheiro, vejo que o cara já está vestido.

Sério mesmo? Nem uma lavada?

Ele bebe o resto da vodca e fuma um cigarro sentado na cama. Eu o ignoro. Tento fingir que estou sozinha no quarto para evitar uma possível crise severa de ansiedade, porque tudo parece revirar dentro de mim nesse momento. Isso está acontecendo com muita frequência ultimamente, e por um instante fico extremamente neurótica e preocupada. Pensamentos sem nexo girando... E girando. Estou concentrada em algo dentro de mim, ajeitando meu cabelo em frente ao espelho, sem de fato arrumá-lo, quando ele me chama.

- Ei!

Viro-me, e faço um gesto com a cabeça para ele. Daqueles gestos que pessoas (eu, principalmente) fazem quando estão prestes a começar uma briga: "Algum problema?". "Milhares de problemas" quase respondo em voz alta para mim mesma feita uma louca.

- Qual seu nome mesmo?

O filho da puta se deu conta agora? Brincadeira!

- Michael Jackson, por quê?

Michael Jackson, Julie? Sério?

Mantenho com muito esforço o rosto sério.

- Lindo nome...

Ele acha que realmente me chamo Michael Jackson. Isso realmente é inacreditável. Isso realmente é desprezível. Por que as pessoas fazem perguntas se não têm interesse o bastante nas respostas. É como minha mãe: "Por que você está assim, Julie?"
Se ela prestasse mais atenção em mim, garanto que saberia a resposta.

Apesar disso, a situação nesse quarto chega a ser engraçada. Será que ele é mais louco que eu? Provavelmente ele nem percebeu que falei Michael Jackson. Viro-me para não ter uma crise desnecessária de riso na frente dele. Eu, a mulher das crises. Isso também é risível.

- O meu é Theo.

Ah, que maravilha! Mas... Não perguntei, idiota! Continuo de costas para ele e em silêncio.

- Posso ter seu número?

É sempre a mesma coisa...

- Eu não repito clientes. Portanto, se limite apenas em se apressar com meu cachê.

Cachê!

E com isso o queixo do cara cai. A cena é tão engraçada na minha cabeça. Ai, meu Deus! Que vontade de rir. É bom sentir vontade de rir, mesmo pelos motivos errados. Enfim, ele fecha a boca e abre a carteira tirando duas notas, uma de cem e outra de cinquenta. Ele faz a idiotice de levantar o olhar até a mim, segurando com desdém as notas entre o dedo médio e o indicador. Isso não é uma boa ideia, nojento do caralho!

Ando até ele e pego o dinheiro, olhando-o como se quisesse dizer: "Te queimaria vivo se pudesse". E só por zoeira, tiro um cigarro do maço dele e acendo com o isqueiro dele. Trago profundamente enquanto uma lâmpada maligna acende na minha cabeça. Vamos nos divertir um "pouco"...

Rolo o isqueiro denovo e levo o maço de cigarros até a chama. Ele queima lindamente. Jogo o maçode cigarros transformado em bola de fogo em cima da sandália de dedo dele.Quando vejo que fiz o suficiente, jogo o isqueiro na mesa como se fosse umpedaço de merda.

HAHAHAHAHAHAHAHAH...

Os olhos dele estão arregalados e isso faz com que eu sinta prazer. Tomo fôlego para permanecer séria.

- Certo. É um sacrifício para vossa senhoria me deixar em frente ao Palácio de novo... Digo, no bar? Ou vou ter que chamar uma carruagem... Perdão, táxi?

Ele desvia o olhar da sandália virando borracha derretida para mim, e seus olhos me dizem que ele está com raiva e mentalmente me dando adjetivos que com toda certeza são horríveis.

Coitado! Nem me conhece.

E mesmo que por dentro eu esteja despedaçada em milhões de pedaços, dou-lhe meu melhor olhar de todos os olhares: O Arrogante. Daquele que você empina o queixo desafiadoramente, olhando com nojo e diminuindo a pessoa na sua frente, fazendo com que se sinta um lixo. Dois lixos em um único quarto. Nada mal.

Poderia fazer pior.

Ele respira fundo a fumaça produzida pelo maço e sandálias queimadas. Suas mãos apertam levemente a borda da cama. Ele até que tem mãos bonitas, grandes, com veias salientes do tamanho certo. É uma pena que é inútil no quesito "dar prazer". Por fim, joga água para apagar os troços queimados e responde:

- Sem problema.

À volta até o bar foi rápida e silenciosa. A expressão do rosto de Deo, espera... Ah, a porra do Theo, dizia que ele gostaria de me espancar, ou me colocar dentro de uma camisa de força, ou abrir a porta do carro e fazer meu corpo rolar feito uma desmembrada no asfalto. Esses pensamentos me divertiram. No lugar dele eu optaria pela última alternativa. Desci do carro sem olhar para ele e nem mesmo agradecer, lógico! Bati com força a porta do carro e pude escutar ele resmungando baixo "que puta". Então virei, encontrei seu olhar e disse de volta:

- Pau torto do caralho! Vai fazer uma plástica decente nessa tua merda aí, palhaço!

Eu não ri.

Eu gargalhei. Alto. Perguntando-me o que diabos me deu hoje. Ele subiu a janela e saiu cantando pneu, fazendo-me perceber que os dois sons juntos naquele instante soavam ótimos aos meus ouvidos. Adoro ser detestável.

Quem Eu Deveria Ser? (Não Revisada)Onde histórias criam vida. Descubra agora