Capítulo 4

62 7 0
                                    

Dias atuais...

Eu estou encostada no balcão do bar, fumando como uma fumante em abstinência e bebendo cerveja mesmo sem vontade. Essa é mais uma tentativa de esquecer a estúpida situação da minha vida. A porra da vodca não fez efeito nenhum.

Conheço de vista o cara que está atendendo por trás dele, que é primo de Marco, Will. Ele fica puxando conversa comigo, mas eu nem me dou o trabalho de prestar atenção. Na verdade eu tenho raiva e inveja dele. Bem que poderia ser eu atrás desse balcão, não ele. Apesar disso, estou sem energias para descontar meu humor negro nele.

E por algum motivo estranho, eu me sinto estranha hoje. Na verdade, eu sou estranha de janeiro a janeiro, mas hoje eu estou inquieta... Não sei. Paranoica? Exagerada?

Que porra, Julie!

Will pode ter percebido meu 'eu' estranho acima do normal, e deve ser por isso que está tentando (e falhando miseravelmente) me distrair. Ele é legal, mas somente por trás do balcão.

Não preciso e nem quero amigos, Will!

Para minha sorte, nesse momento o balcão enche de clientes com várias comandas de pedidos.

Amém! Posso recarregar agora.

Talvez eu seja uma pessoa introvertida. Suponho isso porque vi em um site a diferença entre o extrovertido e o introvertido. O extrovertido necessita de pessoas ao seu redor para alimentar sua energia. Os tipos típicos dos centros das atenções. Detesto-os! Já o introvertido, se recarrega sozinho, só ele e sua mente barulhenta. Muita atenção alheia sugam suas energias. Se bem que... Nem energia eu tenho mais. Ainda me sinto estranha. Acendo outro cigarro seguido. Merda! Tenho fumado tanto ultimamente. Se bem que... Eu já usei coisa muito pior.

Olho ao redor do salão e vejo que o fluxo de pessoas começa a diminuir. Meus olhos varrem tudo até parar em uma mesa ocupada por três caras. E como se fosse uma força sobrenatural, eu fixo neles o olhar e os observo. Dois estão virados para frente do palco do DJ, e o terceiro está de frente para mim, encostado numa barra branca de concreto com os tornozelos cruzados. Ele veste uma calça jeans preta incrivelmente justa, uma camisa de mangas compridas branca e usa botas. E porra... É bem alto.

E bonito!

Eu não enxergo bem de longe, mesmo assim, noto que ele olha diretamente para mim e fica segurando o olhar por três... Quatro... Cinco... Dez... Onze... Quinze segundos e desvia.

Que porra? Desde quando eu conto os segundos?

Ele mexe nas mãos, no dedo indicador, e posso dizer que tem um anel ali e mexer nele é um hábito. Eu sei porque eu faço isso também. Posso o ver mordendo o lábio inferior enquanto olha para baixo, mas não ri. Ele é sério. Muito sério, parece comigo.

O QUÊ? Parece comigo? Que porra é essa?

Percebo que eu estou subindo e descendo as mãos pelas minhas coxas.

Puta que pariu!

Eu estou nervosa?

Que diabos, Julie?

Desvia a porra do olhar!

Eu desvio.

Olho todo o resto do salão e volto dar atenção ao meu copo. Bebo, tiro o resfriamento que pinga dele e descanso-o novamente no balcão. Trago o cigarro. Solto a fumaça. Olho minhas unhas, mesmo sabendo que não tem nada de interessante nelas.

Eu sei, eu sei... Eu sinto o cara me olhando. E por força maior, sem obedecer aos comandos da minha mente, meus olhos se voltam para lá de novo. E confirmando meu sexto sentido, ele realmente está me olhando.

De novo!

Nesse momento começa uma música lenta e os dois caras que estão com ele se viram para mesa da esquerda, com certeza para chamar as putas (arfando e babando para eles) para dançar.

Acertei!

Cada um pega uma, menos o menino de calça preta. Que pena.
Se isso acontecesse alguns anos atrás, eu poderia estar lá o convidando para dançar. Enroscaria os braços pelo seu pescoço e passaria os próximos 4/5 minutos literalmente dançando e inconscientemente me esfregando nele, até romper a linha invisível e deixá-lo me beijar. Trocaríamos números e iríamos marcar um encontro com bastante álcool, maconha e sexo gostoso sem pagamento.

Ênfase no ''sem pagamento''. Ah, enfatiza ''por livre e espontânea vontade'', também.

Mas, estamos em 2016.

E, alguns anos é tempo suficiente para te encher de merda (se bem que... já existe merda desde sempre). Tanta merda que faz você perder o jeito. Faz você ficar oca. Vazia. Apática.

E é exatamente por isso que nesse momento estou me perguntando por que o caralho estou nervosa assim depois de tanto tempo? Por que diabos meu coração está acelerado e minhas mãos trêmulas e suadas?

Eu sabia!

Sabia o caralho de botas que eu estava estranha hoje.

Quem Eu Deveria Ser? (Não Revisada)Onde histórias criam vida. Descubra agora