Capítulo 18 - Julie

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Dias atuais...

Não há nada mais frustrante do que estar bem num dia e de uma hora para outra a dor te invadir, simplesmente chegar sem avisar e te encher de tristeza, arrependimento e até raiva de si mesma.

Sem falar das noites de choro abafado quando as lembranças vem, e eu não poderia gritar como gostaria, só ficava quietinha no canto da cama abraçando Gabriel e meu travesseiro molhado, sempre pedindo a Deus forças para levantar da cama no dia seguinte, e que meus olhos não estivessem tão inchados e que eu ao menos conseguisse sorrir de forma convincente para meu filho e minha mãe.

Por mais que eu queira deixar tudo para trás, fico sempre me culpando pelo que houve, fico imaginando o que deveria ter acontecido caso eu não tivesse cedido as merdas do passado.
Mas, enfim, essa loucura em pessoa sou eu, e eu queria, mas não posso fugir de mim mesma.

Ok. Eu estou bem.

Mas não satisfeita.

Que bosta!

Eu nunca estou satisfeita!

Porquê nada me preenche?

Tudo é vazio e eu não sei quem eu sou. Eu não quero parecer uma puta indiferente, eu sei que mudanças estão perto de acontecer, é só que...

Falta algo, entende?

Eu ainda não sei o que vou fazer da minha vida, nem hoje, nem amanhã, nem num futuro próximo. São tantos "e se" me rodeando. Me pego constantemente pensando o quanto seria diferente sem os traumas, os sentimentos ruins, as recordações, as cicatrizes. Seria outra pessoa, sem sombra de dúvida.

(Suspiros...)

Ainda tem muita papelada para resolver, e todas essas coisas que te obrigam a viver o agora e deixar os planos para o futuro para depois. Mas como não pensar no futuro? É impossível.
Mas há um problema...

E quando você olha seu futuro e não vê nada?

Isso não soou bem, assim, quero dizer, deixe-me ver...

Sim, eu vou estudar. Eu sempre admirei a área de Direito por te proporcionar o tal "poder". É lindo! Muito lindo, mas eu não chego a amar isso ainda. Eu ainda não tenho certeza de nada e isso me apavora. Não sei se essa insegurança, essa sensação de não ser capaz vai me atormentar para o resto da vida.
Como eu quero amar uma carreira. Só que simplesmente, não consigo.

Eu pretendo estudar direito, isso é certo. Quero ter um cargo respeitado e um salário elevado. Mas... eu não sei se vou conseguir. Não sei como lidar com isso. E mais... não tem uma porra de profissão que eu olhe e me enxergue ali trabalhando até ficar velhinha. Sabe como é?

Eu sou muito vazia.

Qual é o meu problema?
(se alguém souber comente aqui)

Isso é assustador, não é? Eu não consigo explicar.

Você gasta horrores em uma faculdade, e gasta mais horrores de neurônios, só para no final, trabalhar sob tédio crônico apenas para manter suas necessidades e luxos. Mas e a tal paixão por aquilo que faz? Cadê? De onde vem isso? Porque eu não sinto, e sinto que nunca vou sentir?

Talvez isso signifique que minha mente precisa ser desligada, desconectada, ser colocada para balanço, sei lá. Toda minha vida foi na base de pressão, droga!
Eu quero respirar. Mas afinal...

Quem. Eu. Deveria. Ser?

Não sei o que fazer.

Alguns dizem que uma vida sem amor é uma vida perdida. Será?

Por quê eu não sinto que é?

Por quê eu não sinto falta de um companheiro? Será que é porque eu nunca conheci um?

É, nunca conheci um.

Eu não quero dividir minha cama com ninguém. Detesto dormir de conchinha (deve ser trauma de Cristopher), e é incrível como às vezes eu sinto repulsa quando sou tocada, tipo, um pânico mesmo. E eu não tô falando só de sexo não, isso acontece com abraços, beijos no rosto, até apertos de mão. Deve ser porque passei toda minha vida sendo tocada de maneiras fodidamentes erradas.

Você passa tanto tempo sozinha protegida pelo seu muro da indiferença que se acostuma e não sente falta de companhia.

É assim que você desiste do amor.

Você diz a si mesma que isso não existe mais, que as pessoas não sabem amar mais, que todo mundo está mais interessado em trepar do que te conhecer de verdade, e perceber que está decidida a ficar sozinha por motivos sérios.

Você não abre seu coração para mais ninguém, porque a última vez em que fez isso foi decepcionada, e não quer passar pela mesma dor de novo. Então você assume que todo mundo que você conhece vai machucá-la e que qualquer história que possa surgir irá acabar antes mesmo de começar.

Então você fica pendurada na merda da ideia de continuar esperando por algo que pode nunca acontecer. Você acha que não há ninguém lá fora que possa te amar, então, começa a fechar seu coração ainda mais.
Você pode até sentir interesse em alguém especial, mas não diz como se sente porque tem medo de sentimentos. Então você deixa seus sentimentos te atormentarem.

Você acredita que pode estar com alguém que é errado para você, simplesmente pelo fato dele ser mais do que você merece, então, você desiste da porra do amor, esperando que ele se desprenda de você e que se torne livre de toda dor.

Você desiste do amor por não tentar, por não abrir o seu coração novamente depois de tantas decepções e não confia em alguém novamente por causa de sua história.

Você desiste do amor porque acha que não é digna.

Você desiste do amor no dia em que para de ouvir seu coração e por quem ele bate.

Você desiste do amor quando, na verdade, deveria acreditar nele.

Será que isso tem cura? Tem solução?

Com toda essa constante briga entre mim e minha mente, é impossível não pensar nele... Ben.

Ben é um cara legal, gente boa, "psicológo" (seria minha hora de ter consultas particulares - sem trocadilho - com ele e curar minha loucura?...), sensível, carinhoso, deve ter um coração enorme, e faz como ninguém mais faz, meu corpo entrar em combustão só por simplesmente me olhar.

Mas porquê apesar de toda essa eletricidade, eu o vejo como amigo em primeiro lugar?

Ele só quer minha amizade?

Eu só quero isso dele?

Por quê eu não consigo imaginar como seria o futuro com ele?

Um relacionamento saudável?

Será que eu tenho alguma deficiência?

Sou incapaz de amar de novo?

Fobia do amor?

Não sei.

Isso tudo é muito confuso e faz os fios do meu cérebro darem nós.
Tenho falado com Ben com mais frequência. Ele sempre me liga e manda mensagens e me dá inúmeros conselhos fantásticos, mas anda indo a muitos congressos de psicologia e não o vejo há um mês. Ben disse que teria uma pausa semana que vem e "precisava e queria muito" me ver.

O "precisava" dele me deixou cética. Ele sempre se mostra preocupado comigo e minha família, e isso me faz admirá-lo bastante, porém, tenho sentido ele meio distante.

Que porra, né?

Finalmente, depois de anos apática com homens, eu conheço um que me vira do avesso, e ele vem e vai, vem e vai e não me dá uma certeza de nada.

Ou será que é paranóia minha?

Que merda!

Eu aprendi a tolerá-lo. Podemos ser amigos (amantes, namorados, ou não...) não podemos? Não sei. Não sei de nada. Como saberia?

Não sei nem quem "eu" sou!

Quem Eu Deveria Ser? (Não Revisada)Onde histórias criam vida. Descubra agora