27. Broken

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Em silêncio, ouvi as várias conversas de Tiago que a certa altura, encostou o carro numa berma. O tom de voz bem-humorado e tranquilo que o caracterizava mostrava-se cada vez mais ausente em cada uma das chamadas que fez. Chegou inclusive a desalinhar os seus cabelos e a bater no volante com as mãos quando não lhe davam as respostas que pretendia. Os recursos, ou seja, as pessoas a quem poderia ligar estava francamente perto do fim.

Não obstante, ao procurar mais um dos contactos recebeu uma chamada que num primeiro instante, vi que ponderava atender ou não. Acabou por atender e reconheci a pessoa, não só pelo nome, mas também pela voz. Carlos. O nome do homem a quem tinha dado um fora, pois não tive mais paciência para ouvir os seus avanços e comentários despropositados. À medida que juntava as peças, questionava-me se o meu atrevimento em responder-lhe não teria algo a ver com o desaparecimento do Vasco. Na altura, apenas quis mostrar que podia tomar conta de mim e responder a pessoas como ele. Mas e se isso se voltasse contra mim? Pior, se isso tivesse tido consequências para outras pessoas?

Um nó instalou-se no meu estômago e a expressão do Tiago também não ajudava a atenuar os meus sentimentos de culpa. Era óbvio que o Carlos sabia o que tinha acontecido.

- Onde? – Perguntou o Tiago. – Diz-me onde é que o deixaste?! Não… não justifica! Tens algum problema é comigo que falas! Oh Carlos e se te fosses fo… onde é que ele está? – Repetiu, procurando que a chamada lhe desse a informação que pretendia. – És burro como o caralho, ao menos lembraste-te de esvaziar a mala? Não, pois não? – A ironia misturava-se com a raiva. – Então fala antes que as pessoas erradas o encontrem! – Assim que ouviu a resposta que procurava, reiniciou o motor do carro e inverteu a marcha. – Vamos ver quem é que vai desaparecer do mapa primeiro, filho da puta. Tu é que não sabes com quem te estás a meter. – Desligou a chamada e guardou o telemóvel, acelerando um pouco mais.

- Sabes onde ele está? – Perguntei num tom que não escondia a ansiedade e o receio pelo que podia ter acontecido.

- Sei… - Murmurou e acelerou ainda mais. – Não acho que o Vasco tenha sido estúpido o suficiente para armar algum circo com o Carlos por isso, só podes ter sido tu.

- Nunca pensei que…

- Claro, provocar um traficante de droga é sempre uma boa ideia.

- Não foi o que acabaste de fazer? – Indaguei, tentando mostrar alguma segurança na voz perante o tom ríspido dele.

- Eu e ele não somos assim tão diferentes. Embora, eu não suje as minhas mãos diretamente.

- Isso já eu percebi. – Retruquei. – Em vez disso, mandas para a linha de fogo aqueles de quem dizes gostar tanto.

Ele lançou-me um olhar frio que vindo dele era no mínimo perturbador.

- Estás a insinuar que nunca me importei com o que acontecesse com o Vasco? – Perguntou, após ter feito uma curva perigosa a uma velocidade cada vez menos aconselhável. – O que achas que sabes sobre mim? Tenho ficado ao teu lado simplesmente porque ele tem uma fixação por ti, mas não me provoques, Katya. Não fazes a mínima ideia até onde estou disposto a ir para o ter perto de mim e de boa saúde. Se vir que és um risco para ele, és tão descartável como outros.

Seguiu-se outra manobra perigosa mesmo antes de entrar na autoestrada, onde não me atrevi a dirigir-lhe a palavra. O interior do carro estava quente e mesmo assim, sentia arrepios de frio. Como se o meu próprio sangue estivesse gelado, após aquelas palavras do Tiago que mantinha os seus olhos presos na estrada. Poucos minutos depois de ter entrado na via rápida, saiu numa das saídas que dava acesso a uma estrada nacional maltratada pelo tempo e pela falta de manutenção. Não havia um só carro a cruzar aquela zona e repentinamente, numa das bermas avistámos um veículo que parecia ter embatido contra uma árvore.

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