29. Dúvidas

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Deixei tudo para trás. Apaguei qualquer traço que permitisse alguém encontrar-me. Isso incluía um telemóvel e cartão novo. Abandonei as redes sociais durante meses e mesmo quando regressei a elas, criei tudo do zero. Nem sequer usava o meu nome real e pela falta de dados, não era possível alguém encontrar-me. Não tinha fotografias minhas em qualquer plataforma online.

Também deixei de parte a minha vingança em relação à minha escola antiga. Claro que antes disso, tive o cuidado de eliminar qualquer prova que ainda me pudesse ligar ao que tinha ocorrido. A única razão para ainda usar as redes sociais era apenas para ler notícias, jogar alguns jogos e distrair-me com páginas de vídeos ou fatos que servissem o único propósito de entretenimento.

Devo admitir que não perdia muito tempo com essas coisas. Antes era algo mais recorrente, passar horas e dias à frente do computador sem qualquer convívio. E não é que as minhas aptidões sociais tivessem melhorado, mas em poucos meses encontrei a companhia que me distraia o suficiente para não ter que pensar muito em tudo o que tinha deixado para trás. O nome dele? Ryan Lewis, meu companheiro de mesa que pretendia terminar o secundário com notas medianas e depois, viajar. Andava a juntar dinheiro para isso há anos. Ao referir anos, refiro-me desde dos seus onze anos quando se iniciou num esquema de negócios. Ele era quem me providenciava com algo que me retirasse da realidade que me rodeava.

A minha chegada a uma escola privada de Los Angeles causou alguma curiosidade por parte dos meus colegas. Essa que logo desvaneceu pela minha falta de respostas. Não demonstrava muito interesse em conviver.

Se durante anos, acabei por ficar num canto da sala devido à minha timidez, desta vez a minha personalidade que respondia a provocações afastava os outros. A exceção era Ryan que durante as primeiras semanas mal falou comigo. Passámos esse tempo a ignorarmo-nos mutuamente até ao dia em que durante uma aula de matemática em que tivemos que partilhar o livro, ele aproximou mais a cadeira e disse:

- Conheço esse cheiro.

Lancei-lhe um olhar inquiridor e ele prosseguiu com um sorriso:

- Posso arranjar mais e melhor. Interessa-te?

Num primeiro momento, pensei que pudesse ser arriscado, mas depois reconsiderei. Precisava de uma fonte segura e estável para obter o que queria sempre que precisasse. Ryan mostrou estar à altura por detrás de uma expressão que se fazia sempre acompanhar de olhos azuis sempre cansados, um sorriso algo afetado pelo número absurdo de cigarros que conseguia fumar num só dia e levava sempre um gorro no cabelo, independentemente da estação em que estivéssemos. Assim os cabelos curtos e castanho claro costumavam estar sempre desalinhados, mas escondidos.

- Loirinha, o telefone está a tocar. – Avisou, entrando na sala com uma toalha na cintura e com um cigarro na boca.

- Levas os cigarros contigo para o banho? – Perguntei, ignorando o primeiro comentário, mas logo vi o meu telemóvel na sua mão e ele virava o ecrã na minha direção.

- É o Sam outra vez? – Perguntei.

- Claro. – Falou, entregando-me o telemóvel e sentou-se ao meu lado no parapeito da janela. O apartamento dele ficava num quarto andar. – Não devias atender?

- Não devias vestir alguma coisa antes de te sentares aqui? Quem passar e olhar para cima, pode vislumbrar uma paisagem não muto agradável.

Ele riu.

- Fodam-se, não quero saber. Estou em casa. – Respondeu. – Vá, não desvies o assunto. Vais deixar o namorado a falar sozinho, outra vez?

- Não sei se aquilo é um namorado ou uma cruz que carrego. – Falei e aceitei o cigarro que quis partilhar comigo. – Nem sei ao certo porque disse que sim a esse gajo.

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