35. Decisão

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Como era domingo e não tinha nada programa para esse dia, pensei em dormir grande parte do tempo. Se fosse possível não queria sair da cama o dia todo. Se fosse possível queria dormir sem qualquer hipótese de acordar.

Esse era um pensamento recorrente e sabia que mais cedo ou mais tarde, acabaria por ceder à tentação de desaparecer. Estava cansada de acordar todos os dias para ver um mundo que passaria bem sem mim. Era exatamente como o Paulo pensava antes de se suicidar. Entendia perfeitamente a agonia de respirar todos os dias sem entender a razão. E com isso vinha a angústia de tempos perdidos e apenas guardados na minha memória. Nesses tempos, experimentei uma variedade de sensações que me fez, por instantes, estar contente por estar viva. E se houvesse dias menos bons, poderia partilhar essa tristeza e visão do mundo com alguém que me compreendia. Alguém que justificava a minha presença neste mundo. Alguém para quem uma troca de olhares significava tudo. Esse alguém agora não passava de uma conexão perdida.

O passado, o nosso passado juntos era como uma ilusão perdida. Nos dias mais negros era comos e esse tempo nunca tivesse existido.

Revirei-me na cama algumas vezes antes do telefone do quarto tocar. Olhei para o relógio e eram quase oito e meia da manhã. O que haveria de tão importante àquela hora que justificasse aquele telefonema? Estendi o braço e peguei no auscultador.

- Bom dia, peço desculpa pelo incómodo, mas tem aqui uma visita.

- A mesma de ontem? – Perguntei automaticamente.

- Não, é uma jovem chamada Elsa.

Elsa? Ora isso era uma surpresa. Viria tirar satisfações comigo? Perguntava-me se a razão da visita dela teria algo a ver com a possibilidade do Vasco ter esquivado as perguntas sobre mim. Embora também existisse a hipótese de que tivesse contado a verdade e ela quisesse “pedir-me” para ficar longe. Se fosse a segunda opção, isso significava que me considerava uma ameaça para o seu noivado e desejado casamento. Fosse o que fosse, fiquei intrigada.

- Diga-lhe que aguarde. Vou descer daqui a pouco.

- Com certeza.

Saí da cama pensando em como podia servir-me daquela situação para me divertir e ao mesmo tempo, envenenar aquele relacionamento.

Tomei um duche rápido e peguei num vestido de malha cor de vinho com um cinto preto. Calcei uns botins escuros e nem sequei por completo os meus cabelos dourados que caíam sobre os meus ombros.

Sem pressa, escolhi um anel e algumas pulseiras.

Em frente ao espelho, respirei fundo e saí tranquilamente do quarto. Quis fazê-la esperar e assim que entrei no salão, onde as visitas dos hóspedes aguardavam, lá estava ela. Recebi logo um olhar que denunciava a sua impaciência.

- Não querias ter demorado mais um bocado? – Perguntou ironicamente e já levantada, pude ver os seus olhos vermelhos e inchados.

Oh, isso para mim era um sinal muito bom.

- Já viste bem as horas? – Indaguei. – Tens sorte que me tenha dado ao trabalho de sair da cama só para falar contigo. – Sentei-me num dos sofás. Cruzei as pernas, recostei-me enquanto brincava com uma mexa dos meus cabelos.

- Em que te posso ajudar? – Perguntei inocentemente ao fim de algum silêncio.

- Sabes muito bem o que fizeste?

- Sei? – Provoquei no mesmo tom inocente.

- Voltaste para roubar o meu namorado! – Praticamente berrou.

- Shh… - Fiz um gesto com a outa mão livre para que baixasse o tom de voz. – Fala baixinho. A educação é algo bem bonito. Além disso, se não consegues controlar o teu namorado… isso é problema teu e não meu.

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