O temível gato escuro cruzava a Rua Hukter J. quando de súbito arrepiou-se. Olhando para o fim da rua percebeu a silhueta clara na escuridão. Lembrou-se então do passado daquele lugar, e das terríveis coisas que ali tinham ocorrido. Lembrou também do seu passado, inegável, sombrio, trágico. Sentiu um forte arrepio quando percebeu a clara silhueta se mover na escuridão do fim da rua.
A rua era uma descida iluminada por postes amarelos, porém o fim do morro não possuía iluminação. Durante o dia era possível ver que a rua terminava, dando inicio a uma estradinha de chão malcuidada que chegaria a alguma casa de interior. Porém a noite aquele fim de rua guardava um segredo muito além do que uma simples estrada malcuidada.
A silhueta esbranquiçada do lobo se aproximava, e o gato escuro nada pode fazer, não poderia resistir, pois já havia sido visto.
-Lembra Gato?... - disse o lobo malicioso - Desta rua? Do que era em nossos tempos?
-Não há como esquecer Lobo. - Respondeu o gato centrado, escondendo o pavor.
-Será que um dia será nossa novamente? Essa rua? Devoraria cada criatura que aqui habita para ter meu lugar de volta.
-O Conselho não permitiria, esse lugar não pertence mais a nós Lobo, está escrito.
-O Conselho está morto Gato. Junto com todas as suas leis. Nos resta a pressão dos malditos Rutsah's.
-Você se arrisca por aqui Lobo, sabe que a Coruja observa tudo a essa hora. - Ameaçou o Gato.
-A Coruja não chegaria a tempo para contar os meus crimes. Posso ser tão rápido quanto o bater de suas asas.
-Vai cometer mais um crime hoje Lobo? - Perguntou o Gato, percebendo seu destino.
-Não com você. Sempre volta com suas malditas vidas. Quantas lhe restam Gato?
-Quatro.
-Quatro... Não pretendo me cansar hoje com você. É suficientemente ágil para escapar de mim antes mesmo que eu conseguisse lhe ferir.
-Bem provável. - Desafiou o Gato novamente.
-Você não quer mais viver não é Gato? Depois de tudo o que fez...
-Me poupe de ouvir Lobo. Sei o que fiz.
-Você sente remorso.
O silêncio pairou por alguns minutos. Um bater de asas se ouviu.
-Pensa em voltar para Ulthar? -Perguntou o Lobo.
O gato somente lançou um olhar rancoroso ao Lobo, que sorriu ao ver a expressão do Gato.
-A coruja partiu Gato, hora de ir.
-Boa noite Lobo, juízo.
O Lobo riu e se esgueirou para as sombras até que sua silhueta não pudesse mais ser vista. O gato suspirou.
-Podia me matar e poupar-me dessa culpa.
Lambeu sua pata e lembrou-se das vidas que destruiu. Em Ulthar, um casal de velhos. Em Londres, um jovem alcoólatra que assassinou a esposa enquanto o gato agourento lhe atormentava. E de outras vidas que perdera para causar a desgraça.
O Lobo foi sábio em não o matar, pois conhecia seu passado. A cada vida que o Gato escuro perdesse, uma vida seria levada. Por culpa ou por falsa acusação. Foi assim com o jovem, e foi assim em Ulthar, e sempre será até que acabem suas malditas vidas. Mas até lá, o assassino deve ser sábio em escolher a hora certa para matar o gato.
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Crônicas de Karcosa
FantasyTensões no universo mágico acontecem enquanto Alyoth, o Regente, busca resolver os mistérios da estranha cidade de Karcosa, se envolvendo em intrigas com criaturas mágicas pouco confiáveis, e desafiando seres inominaveis para manter o equilíbrio mág...