O King's Pub permanecia aberto 24 horas por dia, atendendo aos mais diversos tipos de clientes e ouvindo as mais diversas vozes no Palco Livre. Um cartaz anunciava logo na escada principal do palco: Faça o seu show! O palco do King's é livre para as mais belas vozes da cidade. Inscreva-se no balcão de atendimentos e tenha um bom show!
O palco era bem equipado, com instrumentos necessários para um show de nível médio. Tinha também holofotes e máquinas de fumaça. Ricky, "o Bardo" para os mais íntimos, se apresentava ali todas as noites, e recolhia seu pão de cada dia. Era a grande estrela do King's, a atração principal. Tinha sua rotina pessoal, chegava no bar por volta das 20:00 horas, assistia as outras apresentações da noite enquanto segurava um copo de martini semicheio até o momento que era anunciado ao palco. Era um artista peculiar. Se divertia com as garotas do bar enquanto os outros cantavam e flertava com todas enquanto segurava seu martini. Porém quando era chamado ao palco, Ricky se transformava.
O relógio marcava 22:00 horas, e na rua oposta ao King's Pub, um homem acendia seu cigarro esperando algo acontecer. Até que ouviu anunciarem a estrela da noite. Caminhou até a porta do bar, o segurança lhe encarou, mas não pareceu se intimidar.
-Nome? - Disse o segurança.
-Vinny Rider.
O segurança consultou a lista, enfarruscou a cara e respondeu:
-Você não está na lista, cai fora!
O homem empurrou a cabeça do segurança contra a parede do bar. O segurança não teve chance de reação. Mesmo sendo duas vezes maior que Vin, não esperava um golpe daqueles e simplesmente caiu desacordado. Ele abriu a porta e entrou no bar.
O lugar estava lotado, e o artista já havia iniciado sua performance. O público delirava com seu som. Bardo podia ser uma das criaturas mais desprezíveis de Karcosa, mas no quesito música, ele cumpria seu papel. No momento que Vin chegou ele estava no meio de um virtuoso solo de guitarra. Seus longos cabelos estavam despenteados de tanto banguear, e seus dedos da mão esquerda sangravam enquanto executava seus maravilhosos fraseados. Pela primeira vez na vida Vin gostou de algo vindo do Bardo. Odiava aquele sujeito, mas tinha que admitir que ele tinha um gosto musical refinado, afinal, esse era o seu dom. A multidão vibrava maravilhada enquanto ele percorria o palco, solava sem utilizar palheta, por isso o sangue em seus dedos.
Vin aceitou uma bebida que a garçonete havia lhe oferecido, somente com o intuito de atirar a taça na estrela da noite. E foi isso que fez, mas foi interrompido de súbito quando o Bardo levou sua voz ao microfone. Vin encantou-se por um segundo, adorava aquela música, e na voz do Bardo parecia mil vezes melhor que a original. Ele cantava You Can't Save Me, de Richie Kotzen. Mas o encanto durou pouco, Vin atirou a taça na direção do cantor acertando-o em cheio na cabeça. O som cessou com o susto do Bardo e uma interferência sonora. A multidão voltou-se a procurar quem foi o autor do arremesso.
-Que merda é essa? Fiz algo errado? - Questionou o Bardo no microfone ao avistar seu agressor.
-Muito pelo contrário, mas o que acha de um dueto comigo? - Vin subia os degraus do palco enquanto o cantor lhe observava tranquilamente - Seu desgraçado! - Deu um soco na cara do Bardo.
O cantor da noite caiu no chão. A multidão acompanhava a briga assustada, e os seguranças do bar já se aproximavam do palco.
-Sua voz não combina com a minha. - Debochou o Bardo, no chão, cuspindo sangue.
Vin o juntou do chão pelo colarinho e o atirou no meio do bar, sobre algumas mesas, afastando todos os que estavam próximos. Os seguranças chegaram ao palco e tentaram segurar o agressor, mas ele resolveu isso rápido demais. Derrubou os dois seguranças que se aproximavam desferindo um golpe cada um. Um deles foi atingido com um soco no maxilar antes que pudesse fazer alguma coisa, e o outro levou um golpe na traqueia e caiu no chão sufocado.
Vin desceu do palco e foi até a mesa onde o coitado estava caído. Ouviu um som vindo do Bardo, um assovio, uma melodia. Foi impedido de avançar. O Bardo continuou sua melodia até que Vin não pudesse mais mover um músculo do corpo, e por isso acabou caindo como um manequim no chão. A risada do Bardo nesse momento era evidente. Ainda caído sobre a mesa com os dentes quebrados e cuspindo sangue pela boca, o desgraçado ria da cara dele.
Vin sentiu que ele se levantava da mesa, e vagarosamente se aproximava. Chegou próximo o suficiente e ficou de cócoras na frente de Vin. Cuspiu um chumaço de sangue em sua face e disse discretamente:
-Acha que é quem seu desgraçado? Pra invadir meu show e estragar minha performance? - Levantou-se e deu um chute no rosto de Vin.
Caminhou alguns metros para longe, e voltou com uma cadeira em mãos. E com a mesma desferiu um golpe devastador nas costas de seu inimigo.
Quando viu que já tinha batido o suficiente nele, perguntou irritado:
-Afinal, o que diabos você faz aqui Vin? Por que arruinou a minha noite? Hein? Fala seu bosta! - Pegou Vin pelo colarinho e o virou para si.
-Elise. - Sussurrou ele, sem forças.
-Elise? O que tem Elise?
-Onde está Elise? - Disse, quase prestes a desmaiar.
-Ora, você que devia saber. E precisa fazer essa merda toda só pra me perguntar isso? Você não é o herói nessa cidade Vin.
Vin arregalou os olhos.
-Você levou Elise. - Vin reuniu forças, conseguiu mover a mão e agarrar a camisa de Ricky. O efeito do encantamento do Bardo parecia ter acabado. - Você levou ela! - Gritou.
O Bardo aplicou um soco na cabeça de Vin, que desmaiou imediatamente. A confusão parecia ter acabado, até que a porta do clube é aberta por um homem desesperado. Era Alyoth, parecia espantado, e surpreendeu-se mais ainda ao ver o cenário de destruição no bar, e os dois amigos ensanguentados.
-Bardo, Vin, precisam vir comigo agora!
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Crônicas de Karcosa
FantasiTensões no universo mágico acontecem enquanto Alyoth, o Regente, busca resolver os mistérios da estranha cidade de Karcosa, se envolvendo em intrigas com criaturas mágicas pouco confiáveis, e desafiando seres inominaveis para manter o equilíbrio mág...