Vida Longa ao Rei

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Ele voava por entre janelas quebradas, portas derrubadas e escombros de um lugar escuro e perigoso. Não era nesse mundo, sabia ele. Estava muito, muito longe de seus amigos e do refúgio de Lenon, em uma missão arriscada. Por que vim neste lugar? pensou ele. Estava assustado, respirava forte enquanto batia as asas rapidamente. Preciso cumprir minha missão, e ir embora... Descansar, preciso descansar... pensava também, mas não sabia o porquê.

Era um prédio devastado, abandonado, no meio de uma cidade esquecida por todos. Um prédio antigo, sem luz alguma, mas mesmo assim enxergava algo, devido a uma clara luz vinda dos céus. A luz amarela. Estou cercado! Não posso mais sair agora! Entrou voando através de uma porta semiaberta e se refugiou sobre um armário. Respirou fundo, abriu os olhos e viu um homem sentado em uma cadeira, de frente para uma janela quebrada. O brilho amarelado entrava pela janela e cobria o homem. Não conseguiu ver, pois, a face do homem, somente sua cabeça, pois se cobria com uma capa amarelada. Estava voltado para a lua.

Sentiu um forte arrepio. Seja lá quem fosse o ser sentado naquela cadeira, era corrupto, malicioso e pútrido. Um odor horrível inundava suas narinas, era insuportável, e ele teve que prender a respiração por certo tempo. Permaneceu em silêncio, para não ser percebido, mas era tarde demais.

-Gálio! - Chamou a criatura, no sofá.

Permaneceu em silêncio, pensou em fugir pela janela, até mesmo pela porta. Mas para onde?

-O que busca em minhas terras? - Questionou o homem no sofá, com uma voz assoladora.

A voz causou um espanto fora do comum, suas penas se recolheram, contraindo-se, como forma de proteção.

-Venho procurar por alguém. - Conseguiu enfim falar, temeroso.

-Só existe eu neste lugar. Eu, e a lua. - A criatura apontou pela janela, mas Alyoth não se atreveu olhar.

-Talvez possa me ajudar, preciso encontrar uma terrena. - Propôs.

-Aqui não é o melhor lugar para se procurar uma terrena. - Levantou-se da cadeira.

Aly deu alguns passos para trás, se refugiando no canto do guarda-roupas.

-Ela não está mais na terra. Faleceu há muito tempo. Em Pääkallonpaikka.

-Humm - a criatura parecia sorrir, e ainda olhando pela janela prosseguiu - posso te enviar para o mundo dos mortos, sem dúvida.

Alyoth decidiu não responder. Até que a criatura se virou em sua direção. Horrível e indescritível era o pavor que o "homem" causava. Era mortal, exalava o cheiro da morte, e sua face profana era encoberta por uma máscara. Uma máscara pálida.

Se aproximava a passos curtos. Discreto, como se fosse uma dócil criatura, querendo ajudar. Mas não era. Ele sabia que não era.

A criatura chegou perto o suficiente, e Aly não conseguia se mover, estava suprimido no canto da parede.

-Misericórdia! - Suplicou.

Ele acordou suando, estava em um estado deplorável e se sentou na cama rapidamente. Sentiu um forte aperto no coração. Já era cedo, o sol batia na janela, e ele escutava a voz de Lenon na rua. Um barulho de pancadas, discretamente cronometradas surgiam da janela.

Levantou-se e foi até a porta, pensativo. Seguiu pela cozinha e pela porta da rua, onde viu o sol. Fazia tempo que não via um céu tão limpo como naquele dia. Karcosa era um lugar tão sombrio, o sol raramente aparecia e o clima era chuvoso e nublado. Afastar-se um pouco daquele lugar talvez fosse bom para Aly. Mas pelo visto as preocupações não o abandonavam facilmente.

Viu Lenon sentado em um toco de madeira, conversando com Vin, que estava de pé, rachando lenha com um machado. O Bardo estava logo ao lado de Lenon, tocando violão. Devia ter encontrado aquilo na mansão.

-Da pra parar de tocar um minuto? - Suplicou Vin, enquanto aplicava um forte golpe num toco de madeira.

O pedido não foi atendido.

Alyoth se aproximou deles, seu semblante era inegável. Estava assustado, pensativo. Lenon o cumprimentou, assim como Vin e Bardo, e ele arrastou um toco e se sentou ao lado do Bardo.

-Gálio está em perigo. - Disse ele pensativo.

-Gálio? - Perguntou o Bardo, interrompendo a música.

-Minha coruja. Lhe enviei em uma missão, e ele se meteu em apuros. Preciso resgata-lo.

-E como sabe que ele está em apuros? - Vin parou de rachar lenha e apoiou o machado sobre o ombro.

-Eu vi esta noite. Ele não está nesse mundo. Parecia outra dimensão, um outro planeta talvez. Lenon, sabe alguma forma de me enviar pra esse lugar?

-Se você ao menos pudesse me dizer qual é esse lugar. - Respondeu ele, dando de ombros.

-Era um prédio, destruído, numa cidade abandonada. A lua amarela pairava nos céus.

-Então deve ser nesse planeta. A lua amarela passou por aqui nessa noite. - Afirmou ele.

-Não sei. Parecia um outro domínio. Tinha um homem, uma criatura, não sei ao certo. Se banhava na lua amarela.

Lenon arregalou os olhos.

-Isso não é bom. Como era essa criatura? - Pareceu interessado.

-Não pude ver o rosto, nem mesmo o corpo, ele usava uma máscara pálida, portava um manto amarelado que cobria todo o corpo.

-Onde sua coruja foi se meter, Alyoth? - Lenon estava assustado, parecia conhecer a criatura.

-Conhece essa entidade Lenon? Por favor, tem que me ajudar.

Lenon estava realmente espantado.

-Devo conhecer. Mas espero que não seja quem penso que é.

-E quem é? - Questionou por mais uma vez.

-O Rei de Amarelo.

Crônicas de KarcosaOnde histórias criam vida. Descubra agora