XIX - A Chegada em Yin

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Ano de 1515 segundo o calendário de Valhenda - Reino de Austerial - Cidade de Yin - metade do mês de Sentium, o nono mês

-Para quem mais você contou? - perguntou-me Iliana de manhã cedo, enquanto tomávamos o nosso desejum.

Como sempre, Brum conseguiu nossa caça. Por estarmos na estrada, ele não pegou animais grandes, apenas dois coelhos​ para nós, e depois saiu voando para fazer seu próprio desejum. Os anos na estrada te ensinam a fazer um belo molho com limão e coentro para colocar no coelho assado. Verdade seja dita, eu sou um ótimo cozinheiro.

-Contou o que? - perguntei como se não soubesse sobre o que ela perguntava.

-Deixa de ser idiota tá! - ela me respondeu - você sabe o que eu quero saber. Quem mais sabe que você é o herdeiro do trono de Austerial?

-Bem, o Papa Hulian V sabe, e ele contou para o Príncipe Mahel...

-Bem, pelo menos eles estão do nosso lado! - ela disse aliviada.

-... E eu contei para Orian antes de mata-lo!

-Você fez o que? - ela levantou com a cara mais assustada que eu já vira na vida.

-Ele está morto, então tanto faz! - respondi tranquilamente.

-Você sabe que ele não morreu! O homem de ontem, seu... - ela não terminou a sentença, não queria dizer "seu pai".

-Ele é o meu pai, mas ele está errado! Impossível Orian ter sobrevivido! - falei de uma vez.

-Vi ele enfrentar Você, Zeldruir e a mim juntos, sozinho, enquanto Brum tentava mata-lo, e ele sobreviveu! Ele está vivo, Auri, ele está vivo!

-Se ele estiver vivo, mato de novo! - disse colocando a mão no punhal que estava na minha bota.

-Se não conseguiu antes, por que acha que vai ser diferente agora? - Iliana se levantou e foi atrás de suas flechas para poder amola-las, deixando a pergunta no ar, para que eu pudesse refletir. Ela gostava de fazer isso. As duas coisas. Era muito chato.

Terminei de comer o coelho e com os restos eu guardei em uma bolsa, para comer depois. Iliana estava sentado em um tronco mais afastado, passando uma pedra de amolar sobre as pontas das flechas que havia feito, para deixa-las afiadas. Era quase como um passatempo para ela fabricar as próprias armas, e depois ficar afiando elas. Eu achava aquilo tudo besteira, mas preferi não comentar isso.

-Você conhece esse tal de Haganin muito bem? - disse Iliana sem olhar para mim, focada em sua flecha.

-Bem... - eu disse me levantando, e indo em direção a ela - ele foi morar conosco quando éramos crianças. Seu pai, meu tio, disse que queria uma educação melhor, uma educação que apenas a capital poderia proporcionar.

-E como ele era?

-Era briguento! Arrumava confusão com todos no castelo, e normalmente eu levava a culpa! Mas ele tinha um coração bom, um coração de um cavalheiro, para defender os fracos! - as lembranças invadiam minha mente e percebi que já não estava mais ali, minha voz apenas falava o que meus olhos se lembravam - lembro que com oito anos ele brigou com um homem numa taverna para proteger a filha do cozinheiro em nosso castelo. O cara que ele arrumou briga tinha pelo menos 2 metros de altura e era grande demais, demais mesmo! - falava rindo, e observei que Iliana tinha largado a flecha e estava olhando para mim, sorrindo.

-E como terminou? Seu amigo apanhou?

-Claro que não! Os guardas do rei apareceram e pegaram ele, mas ele saiu de lá gritando : "eu ainda pego você", "eu ainda pego você"!

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