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Olho o meu reflexo no espelho e contemplo o meu vestido. Nunca tinha tido a oportunidade de o usar. É de seda, até ao aos joelhos, vermelho e justo com alças. É muito simples, mas bonito. Tenho umas madeixas de cabelo presas atrás dando uma maior visão para a franja que, recentemente fiz e de imediato me arrependi. Tenho uma maquilhagem simples, mas o batom vermelho acaba por realçar o rosto. Não me vestia assim há algum tempo, é bom saber que não sou um saco de batatas depois de ter tido a Gracie.

Termino de me arranjar colocando um fio simples que o Harry me ofereceu quando a Gracie nasceu, para nós simboliza aquilo que tivemos que perder, para puder ganhar. A nossa história está uma confusão. Olho para a minha barriga e pergunto-me se está muito saliente. Penso que não. Calço uns saltos altos pretos com umas tiras nos tornozelos e suspiro mais uma vez antes de sair do closet. Tenho uma sensação estranha acerca desta noite, talvez esteja só nervosa. Vou contar-lhe.

- Amor, estás pronta? – Harry entra e viro-me para o encontrar de blazer preto. Mordo o lábio com a visão.

- Sim, estou. Vamos? – Passo por ele e sorrio-lhe com aquele sorriso que ele tanto adora, pelo que ele solta uma gargalhada.

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Após terminarmos o jantar, Harry encara-me em silêncio e eu pondero se conto ou não. Talvez aqui não seja o local.

- Estás tão bonita, Valentina. – Sorrio. – Aliás, és tão bonita. – Seguro a sua mão por cima da mesa. A minha cabeça está longe, está na Gracie, está na novidade, estou um pouco nervosa e ainda com a sensação de nervosismo. - Tinha saudades de estar só contigo. Já me tinha esquecido do que era sermos só nós os dois.

- Dito assim, parece que pusemos a Gracie de parte.

- Valentina, - beija a minha mão e depois acarinha-a. – não pusemos ninguém de parte. Simplesmente não podemos deixar que um filho nos tire o resto do romance.

- Mas agora é diferente. As coisas são diferentes. Tu sabes.

- Sim, sei. Sei que há mais de um ano que não te via tão arranjada e não me lembro da última vez que viemos jantar fora sem acabar com comida na camisa. Não estou a dizer que não adoro jantar com as mulheres da minha vida, mas também preciso de estar a sós contigo. É saudável. – Diz e eu suspiro ainda mais nervosa.

- Estás a dizer que o romance morreu entre nós?

- Nada disso. Estou só a dizer que não podes deixar que calças de ganga largas se tornem um hábito. A Gracie está a crescer e agora podemos voltar a ter tempo para nós.

- A Gracie tem 3 anos, não é bem uma criança crescida.

- Percebeste o que quis dizer... Mal temos tempo para o nosso casamento. Tenho 38 anos e parece que o tempo passa cada vez mais depressa.

- Então estás a dizer que precisas de tempo?

- Sim, tempo para nós. Tempo para mim, tempo para ti. Está na altura da Gracie ir para um infantário. – Abano a cabeça que sim. Não era nada disto que eu estava à espera hoje.

- Está abafado aqui, vamos lá para fora. – Solto a minha mão da sua e ele parece triste.

- Claro, vamos.

Depois de Harry pagar, saímos do restaurante e ele passa o seu casaco para os meus ombros.

- O que se passa? – Pergunta.

- Hum?

- Estás estranha, estás assim há uns dias. – Não lhe posso mentir, só me vai fazer mal.

- Já estava para te contar isto, mas queria ter a certeza...

- O quê? – Insiste. – Sabes que detesto rodeios, Valentina.

- Estou grávida. – Solto sem olhar para ele. Após segundos de silêncio, olho para ele que está simplesmente a encarar-me.

- Outra vez? – Pergunta. – Tens a certeza?

- Sim, tenho a certeza. Já fui ao médico. Estou de 6 semanas.

Ele leva as mãos à cara e ao cabelo exasperado.

- Mas a nossa conversa de ainda há pouco...

- Queres que faça o quê? – Interrompo-o um pouco bruta. – Que aborte?

- Não foi isso que disse. Só acho que não é a altura indicada, ainda agora a Gracie ganhou alguma independência e nós alguma liberdade, já vamos ter outro filho?

- Harry, tivesses pensado nisso antes de decidires ter aventuras no chuveiro. Agora não há volta a dar. – Digo. – Não acredito que estás a ser assim tão egoísta! É um filho teu, pensei que fosses ficar feliz.

- E estou, mas apanhaste-me de surpresa. Não estava à espera para já, talvez daqui a 2 ou 3 anos, sabes...

Viro costas e suspiro de olhos fechados.

- Mas não é só isso... - Começo sem olhar para ele.

- Não é? Por favor não me digas que são gémeos... - Oiço um tom de súplica na sua voz e fico enervada por isso.

- Não, Harry, não são gémeos. É só que, já perdi um filho teu, não quero perder outro...

- Não estou a perceber. Valentina! Diz-me!

Viro-me para ele com os olhos húmidos.

- É uma gravidez de alto risco.

- Hã?

De repente, tudo acontece muito depressa. Ouve-se um grande estrondo e uma carrinha para mesmo ao pé de nós, quando olho, estão dois homens encapuzados a agarrar-me e não tenho tempo de reagir. Olho para Harry e vejo-o imobilizado com uma arma apontada à cabeça. Solto um grito estridente quando sou empurrada para dentro da carrinha e fecham a porta. Rapidamente a tento abrir por dentro, mas é impossível, não há escapatória, estou numa caixa fechada.

O que se está a passar? Quem são estas pessoas, para onde me levam e porquê? Tudo o que me corre na mente é a imagem de Harry com uma arma apontada à cabeça e a possibilidade de Gracie poder sequer estar em perigo.

Não sei quando vou voltar a ver a minha família, nem sei se eles me vão voltar a ver com vida.

ValentinaOnde histórias criam vida. Descubra agora