TREZE

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"Estranhos, os mares de Esp-Cor" - pensara Warna-San, antes de tudo acontecer. Estranhos, de fato. Suas águas eram geralmente revoltas, turbulentas. Pareciam dançar, ao som de alguma música macabra.

Talvez buscassem alguma forma de purificação - como se, em seu ritmo violento, fossem capazes afastar a sina do planeta. Não pareciam apenas determinadas a expurgá-la, mas também a guardá-la como um segredo, que teimava em romper seus limites e mostrar-se ao universo.

Por que estavam tão calmas, naquele fim de tarde¿ Tinham um aspecto acolhedor. Como se abrissem passagem a Warna, enlutadas, sensíveis a seu sofrimento. Guardou os remos, a certo ponto. O barco seguia sua direção sem ajuda. Ela esperava conseguir chegar a seu destino.

Olhou para trás, na tentativa de ver a ilha uma última vez. Encontrou apenas a imensidão de mar, ao redor. Um arrepio atravessou-a. Instintivamente, tomou consciência da insanidade daquela jornada. Voltou a olhar para frente. Não queria ter medo - que os deuses cuidassem de sua segurança, se lhes interessasse.

Precisava levar sua mente para longe dali.

O rei de Esp-Cor. Como conseguiria uma audiência¿ Chegar ao palácio em que governava deveria ser uma tarefa fácil. Qualquer um poderia dar-lhe as direções – a capital não era tão grande, pelo que ouvira. Mas precisaria de muito engenho para conseguir a atenção do monarca. Precisaria de um plano bem elaborado.

Um barulho agudo, vindo das águas, interrompeu seus pensamentos. Tentou olhar através delas – eram praticamente cristalinas – em busca da fonte do ruído. Não encontrou nada.

"Estranhos, os mares de Esp-Cor".

E então aconteceu. Tão rapidamente que Warna-San só deu por si quando o mar a engolia. Talvez fosse uma superonda nascida da calmaria, ou algum redemoinho. Não interessava. Sua fortuna parecia selada, no fundo dos mares: encontraria seu destino. Encontraria sua mãe.

Estava com a visão embaralhada. Algo acertara sua cabeça, no processo. Sentia que perderia a consciência a qualquer momento.

Talvez os deuses não se importassem com seu destino, afinal.

***

Ela abriu seus olhos. O mundo girava a tamanha velocidade que era impossível distinguir alguma coisa. Um zumbido impunha-se em sua mente - ela parecia a ponto de explodir. Havia feito a passagem e chegado à morada dos deuses¿

Se fosse o caso, as histórias que sua mãe lhe contara sobre o poder dos Senhores do Mundo e as maravilhas de seus palácios estendidos no alto das mais altas nuvens, onde nenhum mortal poderia lhes perturbar, não passava de uma grande mentira. Ou talvez tivesse uma alma tão carregada por seus erros que não conseguira subir às nuvens. Estava presa no mundo dos vivos¿

A ameaça de vagar pela eternidade como uma alma sem corpo fez Warna se levantar, apoiando-se em seus cotovelos. Aos poucos a visão desembaralhou-se. Distinguiu, ao longe, um vulto azul e surpreendentemente relaxante. Começou a se acalmar, respirando fundo e munindo-se de forças para lidar com seu destino.

Distinguiu, à medida que sua visão aproximava-se do ideal, o que estava próximo a ela. Algo estava errado. Uma grande quantidade de máquinas, que de tempos em tempos emitiam sons agudos, distribuía-se de forma harmônica pela sala. Uma delas possuía dois tubos longos e finos, que se estendiam até ... seu rosto¿

Entravam por suas narinas, mandando ar puro direto para seus pulmões. Se as descrições de sua mãe estavam corretas, aquilo não era nenhuma morada dos deuses. Era um hospital!

Todas as Estrelas Cairão do CéuOnde histórias criam vida. Descubra agora