DEZESSETE

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Rebecca despertou, com o coração acelerado. Seu sono estava leve como uma pluma, tamanha a ansiedade. Não conseguira mais que meia hora de genuíno descanso, durante toda a noite.

Sentou-se, em busca de um copo d'água que sempre deixava na mesa de cabeceira. Estava vazio. Merda, devo ter bebido e nem me lembro, pensou. Levantou-se, respirou fundo e tentou se acalmar. Foi até a janela, aberta, em busca do ar fresco da noite, e se sentou no parapeito.

Olhar o céu, à noite, era uma das coisas de que mais gostava. A noite, em si, era magnífica. As ruas vazias, o silêncio, a privacidade ... sentia-se como quem havia dominado o mundo. Havia poucas estelas, naquela noite, embora a lua estivesse imensa. Sua luz farta entrava pela janela, fazendo a pedra em seu pescoço brilhar.

Fazia uma semana desde que Rebecca e Jay haviam saído. Ela havia tentado esquecer, mas o assunto persistia em sua cabeça. A imagem das garotas cochichando voltava à sua mente sempre que ela menos esperava. Lembrava-se de ter chorado o quanto pode, depois de ter chegado em casa. No outro dia, e em todos desde então, não conseguia se livrar da sensação de vergonha e humilhação.

Não voltara ao trabalho, no dia seguinte. A princípio, não admitia que a situação a impedisse de continuar com o dia-a-dia. Arrumou-se, reuniu toda a coragem que tinha e saiu, tentando manter a calma. Esperou na estação de metrô por alguns minutos, até a condução chegar. Paralisou, contudo, quando as portas se abriram à sua frente. Não conseguia se mover. Respirou fundo e disse a si mesma que tiraria aquele dia de folga e que voltaria ao trabalho no dia seguinte.

Era noite quando, deitada em sua cama, esperando o sono chegar, lia algo no tablet. Três batidas na porta da casa, no andar debaixo, interromperam-na. Foi até a janela ver quem era, descobrindo Jay à porta.

- Ai, caramba ... – Começou a tremer, correndo para desligar a luz do quarto e fingir que não havia ninguém em casa.

Ele bateu à porta novamente.

- Becca¿

Ficou em silêncio, esperando resposta.

- Becca, tá tudo bem¿ Por que você não foi ao trabalho, hoje¿

Fez-se um longo silêncio.

- Becca, eu sei que você tá em casa, mas entendo que não queira me ver. Eu não sei se eu fiz alguma coisa, mas se fiz, desculpa. Não tive intenção. Achei teu colar no banheiro, hoje. Acabei de passar por debaixo da porta. Eu to indo. Te espero no restaurante, amanhã.

Ela foi até a janela e o observou entrar no carro e desaparecer. Não acreditava que tinha vindo até sua casa para devolver o colar e se desculpar ... por algo que ele não tinha feito! Vê-lo, mesmo à distância, fez seu coração disparar. Desceu a escada correndo, para pegar o que ele tinha deixado, tropeçando em um dos degraus e rolando até o chão.

- Merda ... – praguejou.

Achou o colar dentro de um envelope. Arrependeu-se de tê-lo jogado fora, ao pegá-lo em suas mãos. Fora estúpido. Poderia não saber de onde ele vinha ou o que significavam aqueles sonhos, mas pelo menos aquilo parecia valer um bom dinheiro. Colocou de volta no pescoço e resolveu que ele ficaria ali, a partir daquele momento.

No dia seguinte, quando o horário de trabalho se aproximou, Rebecca não sabia o que fazer. Teria, obviamente, que enfrentar aquela sensação de humilhação em algum momento, mas não tinha forças. Conseguia apenas chorar. De frustração, principalmente. Por que a vida tinha que ser tão estranha¿

Nem se deu ao trabalho de trocar de roupa e ir à estação de metrô - seria como no dia anterior. Em seu guarda-roupa, pegou uma caixa de chocolates belgas que guardava para situações de urgência – como aquela – e se afundou debaixo das cobertas, comendo todos os bombons em pouco tempo.

Todas as Estrelas Cairão do CéuOnde histórias criam vida. Descubra agora