Não tive qualquer sinal de Aaron ou Saelor durante o todo o dia que se seguiu. Não vi nem falei com ninguém durantes várias horas — exceto serena, que me trouxera as refeições e um belo vestido branco com uma cintura justa e renda no lugar das alças caídas sobre os ombros, para por após tomar um banho quente. — Passei todo o tempo no quarto, provando devagar o que era capaz de fazer. Fazendo algumas chamas trêmulisar entre meus dedos, a água da banheira flutuar em gotículas e algumas das flores sobre a escrivaninha crescerem mais alguns consideráveis centímetros. Não sabia como fazia tal coisas, apenas desejava e sentia em minhas veias os meus dons.
E isso ainda era ridiculamente assustador.
Durante todo o dia, meu quarto fora iluminado pela luz que passava pelo teto de vidro. Achei estranhamente curioso o fato de que o sol quente e ofuscante não entrava e abafava o quarto inteiro. Uma brisa fresca e família entrava pela janela e brincava com alguns cachos de meu cabelo solto.
Estranhei o fato de Saelor não ter aparecido pelo manhã, então lembrei de minha breve discussão com Aaron, e então me ocorreu que ele havia tido uma conversa com seu irmão também. De qualquer modo, era melhor assim, afinal, eu não queria sucumbir a ninguém.
O sol se pôs, já estava começando a pensar que minha presença era um pouco irrelevante para todos. Ninguém me queria aqui pelo simples fato de minha presença os agradar. Eu não passara de mais um fardo que teriam que carregar. E o pior de tudo, não poderia ir embora.
Estava prestes a sair do quarto e me aventurar pelos vastos corredores do palácio quando Aaron entrou subitamente. Me fazendo dar um pequeno salto para trás com um susto e um grito contido na garganta, antes que ele esbarrasse em mim.
— É tão difícil assim bater? — Perguntei irritada.
— Não — ele respondeu indiferente.
— Porque então não o faz?
— Não acho necessário.
Aaron vendo minha irritação, sorriu de canto e deu de ombros. Era incrível como ele em alguns poucos minutos conseguia me irritar.
— E se... e se eu estivesse a me vestir? — argumentei furiosa. Aaron tinha que seguir alguns limites, mesmo que eu fosse apenas uma refugiada em sua casa.
— Nada que eu já não tenha visto em outras mulheres — ele revirou os olhos como deboche.
— Você é um desgraçado! — Falei sem papás nas língua. — Jamais me compare com quaisquer outras de suas imundas "façanhas"!
— Façanhas? Assim você me ofende, doce Calyn — falou fingindo indignação. — Um homem como eu, não precisa fazer muito para conseguir a mulher que queira.
— Me poupe dos detalhes sórdidos! — disparei com certa irritação. — Você me dá nojo, seu cretino!
— Tenha dó, é o máximo que pode dizer? Ora, já me chamaram de coisas muito piores.
Fechei as mãos em punhos ao lado do corpo com tanta força que as unhas feriram minha pele.
Argh!
— Diga logo o que você quer! — bravejei.
— Além da sua ilustre companhia? — Ele sorriu e um lampejo de diversão passou por seus olhos, e me odiei por achar aquele brilho maravilhoso, ao ponto de fazer qualquer um suspirar.
Porque alguém tão bonito tinha que ser tão cretino assim?
— Sem rodeios Aaron, fale logo ou saia do meu quarto! — falei com a raiva queimando em minhas maçãs do rosto, fazendo-me corar ridiculamente.
Seu semblante ficou sério de repente, ele endireitou a postura e pude ouvir seu coração bater mais rápido. Vê-lo tão imponente a minha frente, sem o habitual ar de deboche em seu rosto quase me fizera estremecer.
— Os emissários chegaram nesta mesma manhã — ele disse sério — Saelor está com eles desde então, e só agora mandou-me leva-la até eles.
Um frio estranho passou por minhas entranhas, as chamas entre as velas do quarto oscilaram. Aaron me lançou um sorriso que não chegou a seus olhos.
— Tome cuidado doce Calyn, atirar fogo em um palácio também é considerado uma afronta a vossa Majestade — zombou.
— Ora seu... — tentei xinga-lo mas ao me lembrar que não saíra ofensiva como pretendia da primeira vez, me calei.
— Isso, poupe seus xingamentos, não aconselho gasta-los comigo, ainda precisará de toda sua raiva e força quando encontrar-se com aqueles... — bufou sem completar o que iria dizer — Vamos logo.
Minha garganta estava se fechando cada vez mais. Não sabia o que viria em seguida a esse encontro. Haveria uma guerra por minha causa? Seria arrastada até outro reino? Seria possuída a força por qualquer um dos outros reis? Saelor fora hospedeiro, e acolhedor. Mas e os outros?
— Posso me recusar a ir? — Indaguei, me sentindo péssima por ter que perguntar algo de meu interesse a ele.
— É evidente que não — ele cruzou o quarto até à porta. — Ande Calyn, não seja covarde — e lá estava o ar de provocação novamente.
— Eu não sou covarde! — Rebati seguindo seus passos largos e rápidos corredor á dentro.
— A não? Pois para mim, não passa de uma ovelha assustada preste a entras em uma toca de lobos — Aaron riu com escárnio. — Está até de branco! — Sua risada me fez querer chuta-lo em um lugar que não seria nada agradável.
— Não me provoque, Aaron — murmurei entre os dentes cerrados e franzi a testa em sua direção.
— Jamais faria isso, doce Calyn! — Aaron falou sarcástico e emitiu um estalo com a língua.
Eu não devia, era errado! Mas...
O encarei com os olhos semicerrados e invoquei, chamando no fundo de minha mente pela água, sentindo sua fria sensação formigar em minhas veias e apontei o dedo para o rosto de Aaron com raiva, convicta de que meus comandos funcionariam. E funcionaram. Aaron praguejou alto quando água surgiu do nada, bem diante de seus olhos e se chocou contra seu rosto o deixando como um gato escaldado. Ele cerrou o maxilar, seus cílios ficaram grossos com as gotinhas de água que os juntara, seu cabelo preto-azulado se grudou na testa, molhado. A água fez com que sua pele brilhasse a luz das tochas do corredor.
Praguejei baixinho com a doce visão do pecado, mas continuei com um sorriso vitorioso entre os lábios.— Ótimo truque Calyn, — A boca de Aaron se contraiu em uma linha cruel. — Quando quiser brincar com água novamente, seja mais cordial e me chame para sua banheira em seu quarto.
— Canalha.
Aaron gargalhou, finalmente caminhando até a outra ponta do corredor, o qual terminava nas grandes portas da sala do trono.
Foi então que eu percebi.
Oque quer que esteja me esperava la dentro, seria muito pior do que eu estava preparada minutos atrás e ao me provocar e fazer minha raiva aflorar, Aaron estava de um certo modo, me preparando. Amaciando o terreno para o que se seguiria.
Segurei uma série de praguejamentos ao constatar que eu estava de fato menos assustada e, levemente relaxada.
Maldito Aaron benfeitor idiota!
Ele ainda sorria para mim quando disse sem emitir som algum: De nada.
Puxei o ar com força os forçando a entrar dentro de meus pulmões e espirei devagar para manter a calma quando vi as tocas oscilaram um pouco.
As grandes portas se abriram, revelando um rei de expressão severa sobre um trono e seis outros homens, todos voltados para a porta, olhando diretamente para... mim.
Ergui a cabeça e caminhei em suas direção.
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Sétima Filha - Beijada
FantasyEm um rito antigo, comemorado em toda Wareehon, uma garota de cada um dos sete reinos é beijada pelo dom sagrado de suas terras e levada como um presente divino aos recém coroados reis. Com o dever de gerar os próximos governantes. Fortes, saudáveis...