Quando Aaron entrou em meu quarto avisando que estávamos de partida, o sol não havia nem ao menos surgido no horizonte; os animais noturnos ainda espreitavam entre a penumbra da noite. Me levantei em um solavanco e vesti as muitas peças de roupas que Serena deixara para mim ainda naquela noite. Um vestido azul celestial, com renda brilhante no lugar de suas alças, justo sobre minha cintura; um par de botas escuras e um manto quente para a noite, — com capuz — da cor preta. Achei exagerado, mas ela tinha uma ideia de que eu devesse ser respeitada a partir de então, e se as pessoas não me reconhecessem pelo rito, teria que reconhecer minhas roupas nobres.
Bobagem.
Por volta de doze cavalos nos esperavam, todos prontos para serem montados. — Tentei procurar por Saelor, para o agradecer por tamanha sua bondade em permitir que eu vá até minha família, mas não o vi em lugar algum. — Aaron guiava o grupo, ditando ordens e mandando que todos estivessem alertas enquanto percorria as estradas ainda escuras. O único som que ouvira foram dos animais da noite e o relinchar de nossos cavalos.
O sol surgiu sobre o horizonte quando finalmente chegamos em Susan. Paramos para da água aos cavalos e esticar um pouco as pernas. Mas Aaron parecia mais impaciente ao decorrer das horas, menos de trinta minutos depois já estávamos seguindo o caminho até meu vilarejo. Vingor.
《■》
Jamais pensei que um dia ficaria nervosa ao entrar em minha própria casa. Mas tudo estava diferente, eu estava diferente. — Descemos dos cavalos a frente da pequena casinha de madeira. Tantas risadas, esperanças e sonhos compartilhados por uma família grande, e mesmo tendo suas diferenças, unida. Tanto amor, tanto carinho que meus olhos marejaram enquanto eu dava os poucos passos que me separava de minha família.
— Espere.
Aaron me impediu de continuar, segurando firme em meu braço enquanto analisada detalhadamente com o olhar cada parte minha casa.
— O que foi? — Indaguei.
— Para uma casa de família grande, tudo está muito quieto não acha? — Ele franziu a testa.
— Não seja tolo, é cedo — revirei os olhos. — Eles ainda devem estarem dormindo.
— Não em um dia de feira, Calyn? — brandeou apertando meu braço me puxando para mais perto de si.
Por mais que eu custasse a admitir, ele estava certo. — Pitter estaria preparando a carroça para ir até Susan, Gael implorando para que ela e Lucyn fossem junto, Mamãe derrubando Schrader da cama para cortar lenha, papai chamando o vizinho mais próximo para o acompanhar até a cidade é assim por diante. — Silêncio é uma palavra que os Cleuycks nunca chegaram a conhecer.
— Choel, verifique.
Aaron comandou e o mesmo guarda — com uma espada em mãos — abriu a porta de minha casa sem dificuldade e entrou. Em poucos minutos diversas suposições passavam por minha mente. Eu nunca me perdoaria se algo acontecesse a eles por minha culpa. A falta de qualquer barulho embrulhava meu estômago.
Silêncio e mais silêncio se seguia, me deixando cada vez mais desesperada.
Já caminhava na direção da casa — com Aaron praguejando atrás de mim, — quando Choel voltou com uma expressão indescritível no rosto.
— E então? — Aaron e eu dissemos em uníssono.
Mas Choel apenas continuou nos fitando, porém seu olhar parecia nos atravessa, estava distante.
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Sétima Filha - Beijada
FantasiEm um rito antigo, comemorado em toda Wareehon, uma garota de cada um dos sete reinos é beijada pelo dom sagrado de suas terras e levada como um presente divino aos recém coroados reis. Com o dever de gerar os próximos governantes. Fortes, saudáveis...