Oito

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BOM DIA. — Cumprimentei no dia seguinte, apoiada na porta da sala de aula. Algumas pessoas lançaram olhares animados em minha direção, prontas para responder, mas ao me ver ali, ignoraram-me. O que foi isso? Que falta de educação!
        — Poderia parar de bloquear a passagem? — Perguntou-me uma voz muito familiar.
        — Natsu! — Exclamei virando-me. — O que faz aqui?
        — Como assim o que faço aqui? Eu estudo nessa escola também, há mais tempo que você, esqueceu?
        — Não, não foi isso que quis dizer. — Respondi enquanto caminhávamos em direção às nossas mesas. — Eu quis dizer a essa hora. Você geralmente não chega poucos segundos antes do sinal bater?
        — Hee... — Ele se sentou. — Andou reparando em mim tanto assim?
        — Claro que não! — Enervei-me. — É só que é o horário em que começo a ser irritada.
        — Hun...
        Estranhei sua reação. Normalmente ele revidaria me irritando mais ainda. Ah, bom... Não interessa! Pelo menos terei paz.
        Sentei-me em minha carteira e na frente de meus olhos a semana passou voando. Natsu não me irritara nem um pouco naquela semana... O que ele estava aprontando? Na semana seguinte o mesmo fato se repetiu, a não ser pela manhã de segunda, onde ele me cutucou quando o professor Laxus entrou na sala e sussurrou para mim:
        — Hey, Lucy... Esqueci de lhe avisar, mas essa é a semana de provas. Boa sorte. — Sorriu, mostrando que fizera aquilo de propósito.
        — Eu sei. Mira me avisou. — Sorri de volta. Virei-me segurando a risada. Sua cara era simplesmente cômica.
        Mas, diferente de mim, as pessoas não pareciam incomodadas com as provas, e sim com algo que a seguia.
        Bom... Para mim tanto faz, tenho que me concentrar nas provas à minha frente.

✩✩✩

        Era quarta-feira antecedente das duas semanas de provas trimestrais. Erza, Mirajane e eu descemos as escadas e fomos até o enorme refeitório, em busca de proteínas. A semana anterior tinha acabado comigo. Fiquei surpresa ao constatar a muvuca que o lugar estava. As pessoas corriam de um lado ao outro, algumas carregando lanches e conversando animadamente, outras com a expressão desesperada.
        — Ara, havia me esquecido, mas já estamos nessa época, não é mesmo? — Perguntou a albina para Erza, que confirmou com a cabeça.
        — Hun? Que época? — Indaguei para elas.
        — Ah! É mesmo, você não sabe. — Murmurou Erza. — Você percebeu que não tivemos muitas atividades para nota, certo?
        — Bem... Sim... Até cheguei a estranhar...
        — Isso é por causa do evento após as provas. — Explicou Mira.
        — Evento?
        — Sim! Após as provas trimestrais a escola viaja conosco até a montanha, onde temos várias atividades extracurriculares.
        — Isso parece muito legal! — Exclamei animada, pagando a moça da cantina pelo meu melon pan.
        –— Também temos atividades que envolvem a matéria aprendida durante o trimestre. — Apontou Erza.
        — Nossa! Viagem para a montanha... — Uma leve visão do meu lar apareceu diante dos meus olhos. Balancei a cabeça, jogando essa memória para longe de meus pensamentos. — Mas qual montanha?
        — Bom... Para falar a verdade visitamos duas montanhas, entre elas está o monte Hakobe.
        — Monte Hakobe?! Lá não é conhecido por sempre estar frio?
        — Sim!
        — E a outra montanha?
        — É a montanha Sakura.
        — Sakura?! Ela é tipo... Conhecida como a montanha mais bela de Fiore, pois na primavera fica totalmente tingida de rosa por causa das cerejeiras! A escola tem autorização para ir tanto lá quanto ao monte Hakobe?
        — Sim. — Responderam ambas.
        Senti meus olhos lacrimejarem.
        — Estou tão feliz de ter vindo para essa escola! — Um garoto de cabelos cor de areia esbarrou em mim.
        — Ah! Desculpe-me!
        — Não é nada... Tudo bem... — Quando ele partiu virei-me para a ruiva e a albina ao meu lado. — A viagem parece tão boa! Por que então há tantas pessoas com expressões desesperadas?
        — Bom... A viagem também é famosa internamente por ser uma oportunidade para se declarar. A escola fez proveito desse boato e decidiu que os alunos devem ir em duplas. Um garoto e uma garota.
        — Ah! Droga! — Exclamei. — Minha maravilhosa viagem às montanhas...
        — Não se preocupe, Lucy. — Disse Erza. — Você é mais popular do que pensa! Milhões de garotos tentarão lhe convidar!
        — Mas não quero ir com um estranho...
        — Então por que não vai com o Natsu? — Sugeriu Mira.
        Engasguei com o suco que estava tomando.
        — O-o quê? — Limpei minha boca. — Ir com o Natsu? Por quê?
        — Ara... Ele é a pessoa mais próxima de você que é do sexo oposto... — Observou. Parei para pensar nisso. Droga! Ela estava certa! — Então por que não ir juntos?
        — Mira... Não acho uma boa ideia. — Observou Erza com a mão apoiada no ombro da albina. — Eles iam acabar tentando se matar. E Natsu podia fazer parecer que Lucy sofreu um acidente e sumir com ela no meio da montanha. É mais seguro ela ir com outra pessoa.
        — Sério? — Murmurou a albina para si mesma, os olhos azuis demonstrando decepção. — Mas eles iam ficar tão fofo juntos...
        Como? Mira realmente devia repensar seus conceitos a respeito de nós dois! Fora que Erza estava certa e ele poderia... (engoli em seco)... Dar um sumiço em mim.
        As palavras de Lisanna realmente me fizeram pensar a respeito disso...
        É claro que acreditava que títulos não significavam nada... Porém essa minha crença estava se mostrando errada ao ver o quanto Natsu era privilegiado na cidade. Devia ser assim no país todo...
        É estranho pensar nele como um mafioso... Digo, quantos mafiosos fazem um drama mortal por causa de um galo inexistente? Quantos mafiosos deixavam passar quando uma pessoa que podiam matar com um simples comando, os deixava inconscientes?
        … Pensando bem, acho que finalmente descobri o porquê de me chamarem de estranha.
        Embora, olhando pelo mesmo ângulo, Natsu parecia muito mais estranho do que eu!
        Suspirei pesadamente. Deveria me preocupar em achar um par. Estranho... Era como se fosse um baile... E por falar em baile...
        — Hey, Erza, Mira. — Chamei-as enquanto nós três subíamos as escadas.
        — Sim Lucy? — Perguntou Mira.
        — Temos algum evento como um baile?
        — Sim! — Sorriu. — Como adivinhou?
        — Bem... É só uma dúvida que surgiu... — Olhei para as pessoas ao nosso lado, que conversavam animadas. — Quantos eventos teremos nessa época do ano?
        Mira e Erza se entreolharam.
        — Bom... — Começou Erza. — Temos o acampamento nas montanhas...
        — E o baile de fundação da Fairy Tail...
        — Também temos o festival de Magnólia...
        — E não podemos esquecer do aniversário do Natsu. — Observou Mira.
        — O aniversário do Natsu? — Indaguei. — Por que ele está contando como evento? Estou falando de eventos atuais... E que um grande número de pessoas possa participar.
        — O aniversário do Natsu é bem no começo das férias, se não me engano... — Pensou a albina. — E é um evento gigante! Se não me engano, é um dos dias que os pais do Natsu voltam para o país. Além de ser o dia onde tentam escolher a melhor pretendente para ser a mãe da máfia. — Riu.
        — Tentam? — Observei.
        — Sim. — Respondeu Erza. — Natsu sempre dá um jeito de se livrar das pretendentes, sempre apontando algo que não gostou nelas. Mas acho que esse ano ele não tem escapatória...
        — Como assim?
        — No último aniversário dele, os pais deixaram claro: ou ele escolhe a noiva dele nesse aniversário, ou eles iriam casa-lo com qualquer uma que achassem boa o suficiente.
        — Não consigo imaginar a reação dele.
        — Ele praticamente desmontou diante dos pais.
        — Mas o aniversário dele é um grande evento mesmo?
        — Sim. Você se sentiria honrada só de receber um convite!
        — Mas... Mas... Eles são a máfia!
        — Bem... Eles não são malignos nem nada assim... Pense neles como uma máfia do bem.
        — É difícil relacionar essas duas coisas...
        Ambas riram.
        — Acho que você será convidada, Lucy.
        — Eh? Por que pensa isso?
        — Simplesmente pelo fato de você ter conhecido Áries e também por ser a estranha dos boatos.
        — Realmente, Lucy. Você é estranha.
        Suspirei fortemente.
        — Agradeceria se parassem de me chamar assim.
        Subimos rindo. Fiquei para trás, pois fiquei com sede e quando voltava para a sala, trombei em alguém.
        — Desculpe. — Pedi.
        — Não, tudo bem... — Disse ele. — Lucy!
        Olhei para ver quem era. O salvador!
        — Loki! Estuda aqui?
        — Sim. — Sorriu.
        — Espere! Antes das perguntas que quero fazer agora, lhe pergunto: como sabe meu nome?
        — Quem não sabe seu nome, Lucy? — Perguntou sarcástico.
        — Ah... Verdade.
        Os boatos... Eles me perseguem!
        Ele riu.
        — Você é engraçada. — Afirmou.
        — Sério? — Indaguei animada. — Não me acha estranha?
        — Também.
        Minha animação foi pelo ralo. Suspirei. Sempre acabava assim...
        — Hey, hum... — Começou ele. — Você tem par para o acampamento?
        — Eh? Não...
        — Então... Quer ir comigo?
        Olhei-o surpresa. Loki estava chamando-me para ser seu par no acampamento de uma semana? Uma semana inteira com meu salvador?
        Aquele Loki?
        Bom, talvez não fosse tão ruim....
        — Você não recebeu outros convites? — Indaguei.
        — Bem... Sim... — Respondeu vagamente. — Mas ninguém com quem eu quisesse ir realmente.
        Senti minhas bochechas esquentarem.
        — Quer ir mesmo comigo?
        — Sim.
        — E-então... Tudo bem. — Sorri.
        Ele devolveu o gesto.
        Nesse momento o sinal tocou, dando início a nova aula.
        — Tenho que ir. — Afirmei o óbvio.
        — Eu também. Até logo, Lucy.
        Saí correndo até a sala sorrindo bobamente. Que sorte! Não precisei fazer nenhum esforço e ainda iria passar um tempo conhecendo melhor meu salvador! Lucky!
        Entrei na sala saltitando até meu lugar. Natsu, Erza e Mira me olharam alarmados.
        — O que foi? — Perguntei.
        — Lucy... — Começou Mira, mas Natsu terminou por ela.
        — Sua loucura tomou conta totalmente de você?
        Apliquei-lhe um tapa na cabeça.
        — Não é isso, idiota! E já disse para não usar essa palavra para se referir a mim!
        — Pensei que fosse caipira...
        Dei-lhe outro tapa.
        — Ai! Qual é seu problema?
        — Você. — Encarei-o nervosa.
        — Aconteceu algo bom, Lucy? — Perguntou Erza desviando minha atenção do rosado às minhas costas.
        — Bem... Sim! — Soltei, voltando a me animar. — Consegui um parceiro para o acampamento!
        Elas sorriram.
        — Viu? Disse que arrumaria alguém fácil! — Exclamou Mira contente.
        — E quem é o sortudo? — Indagou Erza.
        — Você quis dizer o azarado, certo? — Meteu-se Natsu, porém o ignorei:
        — É o Loki! Acho que vocês não o conhecem...
        — O sem sobrenome? — Indagou Erza, surpresa.
        — Eh? Sim... O conhece?
        — Tem alguém que não conheça?
         — Como assim?
        — É melhor tomar cuidado, Lucy. — Avisou Mira.
        — Como assim? — Indaguei novamente. — Tomar cuidado com o quê?
        — Não adianta avisar, Mira. — Disse Natsu intrometendo-se novamente. — Ela simplesmente é tapada demais para entender.
        Nervosa virei-me para trás, pronta para lhe dar outro tapa, entretanto fui pega de surpresa quando este desviou e segurou meu pulso com força. Puxou-o fazendo nossos rostos ficarem próximos. É claro, estava totalmente ciente que a sala toda nos encarava, mas por incrível que pareça, descobri que os olhos de Natsu eram de uma incrível coloração ônix que entrava perfeitamente em contraste com o cabelo rosáceo e a pele alva.
        — Me chamou de tapada?
        Ele suspirou fortemente.
        — Só estou destacando uma de suas características.
        — O quê?
        Movimentei minha mão livre em sua direção, porém ele repetiu o gesto e agora fiquei ainda mais próxima dele. Partilhávamos a mesma respiração, praticamente. Minha cadeira caiu e meu corpo estava totalmente inclinado sobre a mesa. Ambos estávamos levantados. Ele encarava-me com voracidade... Com raiva... E algo a mais, como pude perceber.
         — O que vocês dois acham que estão fazendo na minha aula? — Indagou a professora Charles, que possuía um alvo cabelo, olhos castanhos, e vestia uma roupa que te fazia perguntar: “como ela não está com calor?”; fazendo-se presente.
        Notei o olhar de todos e corei. Natsu largou meus pulsos e se sentou. Arrumei-me em minha cadeira e pedi desculpa à professora. Antes da voz dela voltar a preencher a sala, ouvi um sussurro do rosado:
         — Estou cansado disso.
        O quê? Eu é que estava cansada!
        Que saco! Qual o problema dele?

✩✩✩

        Na volta para casa, na sexta-feira, Erza, Mira e eu passamos no mercado, comprando todos os suprimentos necessários para a ida até o acampamento na montanha Sakura. Partiríamos no sábado de manhã, então todos ficaram ocupados nas compras e afazeres para a manhã seguinte.
        Loki se encontraria comigo na entrada da escola, de onde o ônibus particular — sim, particular — da escola nos levaria até o monte Sakura.
        Estava tão animada!
        Mal sabia o que me esperaria no dia seguinte...

✩✩✩

        Acordei no dia seguinte um pouco atrasada. Droga! Droga! Mil vezes droga!
        Meu celular piscava mostrando que havia recebido uma ou várias mensagens. Provavelmente era de Loki. Levantei-me da mala que estava fazendo. Lembro vagamente de estar a arrumando quando cai no sono. Os pacotes com lanches e bebidas estavam prontos, então tomei um banho rápido. Terminei de arrumar a mala e saí trancando muito bem meu apartamento.
        Lá fora estava um forno... Ou nem tanto assim. Como a temperatura em Sakura é um pouco mais fria do que em Magnolia agasalhei-me com um casaco fino, mas que esquentava até demais. Caminhei o mais rápido que pude em direção a escola, onde pude ver um enorme ônibus laranja claro com o nome Fairy Tail escrito nas laterais estacionado.
        Ouvi o ônibus dar engate e corri apressadamente até onde o diretor Makarov, Erza e Mira se encontravam. Eles estavam supervisionando os alunos e seus pares. Mira e Erza — a ruiva além de representante de classe — eram assistentes do diretor em todo evento escolar, e mexiam nas bolsas dos alunos fiscalizando seus pertences. Mira e Erza analisaram a minha rapidamente e deixaram-me passar chamando pelo próximo a ser fiscalizado, e então fui até o diretor e sua assistente, uma garota de cabelo castanho chamada Cana que parecia muito jovem para ser a secretária do diretor.
        — Bom dia, Lucy. — Saudou-me Makarov.
       — Bom dia. — Respondi.
        — Onde está seu par? — Indagou Cana gentilmente.
        — Ah! — Lembrei-me das mensagens. — Um segundo!
        Puxei meu celular do meu bolso e comecei a ler a única mensagem de Loki que havia ali, mas que me deixou em choque.
        “Lucy...”; dizia.
        “Sinto muito. Queria muito ir acampar, porém surgiu um compromisso de última hora que era inadiável! Será que poderia me perdoar? Desculpar-me-ei apropriadamente quando voltar à cidade.
Novamente, sinto muito.
Loki
        Senti com se estivesse no Polo Norte, em meio a uma tempestade de neve.
        Minha preciosa... Viagem...
        Senti lágrimas brotarem em meus olhos.
        — Ele... Não vem... — Afirmei, a voz entrecortada.
        Makarov encarou-me com o rosto analítico. Passou os dedos em sua barba, alisando-a.
        — Isso vai ser um problema...
        — Makarov, meu par não vem. — Afirmou a pessoa atrás de mim.
        — Bom, acho que não tem jeito. — Respondeu ele com um sorriso. — Façam um par vocês dois! — Ordenou.
        Virei sorrindo, pronta para cumprimentar meu novo parceiro de viagem, no entanto o sorriso se fora tão rápido quanto chegara.
        Oh não! De todas as pessoas, por que logo ele?
        Eu iria viajar... Com Natsu?
        As lágrimas mentais começaram a cair, e em meu ínfimo gritava:
        MINHA VIAGEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEM!

Meu Estranho MafiosoOnde histórias criam vida. Descubra agora