um | d e s p e j o

9.9K 680 1.2K
                                    

Nova York.

"A cidade que nunca dorme."

"A terra das oportunidades."

Nunca me senti tão enganada.

Vivendo dois anos sozinha em um pequeno apartamento em East New York, no Brooklyn, separada por exatos 563 quilômetros de meus pais, concluí que a vida adulta é bem menos divertida do que pintam por aí.

Não existem convites para festas muito loucas em fraternidades diariamente, nem dezenas de melhores amigos fiéis e perfeitos e muito menos uma poupança inesgotável.

Você tem que trabalhar nove horas por dia, seis dias da semana, para receber um salário de merda no final do mês. Você mesmo tem que lavar suas roupas e limpar sua casa. Você tem que decidir quando é hora de fazer compras ou ir ao médico. Você tem que pagar seu próprio aluguel e todas as outras despesas. E, além de tudo isso, tem que se sair bem na faculdade e lidar com os custos que ela acarreta quando você não ganha uma bolsa.

Coisas demais para lidar.

Falando em salário de merda, aqui estou eu, escorada no balcão da boa e velha "Big Bill's Burger".

— Ei, Lisa. Ajeite essa postura! — Bill, o proprietário da lanchonete, me chama a atenção enquanto caminha com urgência até a cozinha. — E sorriso no rosto, vamos. Sorriso no rosto!

Forço um sorriso para Bill, um homenzinho simpático, grisalho e gorducho, com um dos maiores corações que já conheci. Porém, logo que ele se afasta, apoio meus cotovelos novamente no balcão.

— Ei, sorriso no rosto, Lisa! Mostre como você é feliz em trabalhar na "Big Bill's Burger"...

— O melhor hambúrguer do Brooklyn! — Completo, teatralmente, a frase de Kim, minha companheira de trabalho e única amiga.

— E então, já falou com o Bill?

— Não. — Respondo de ombros baixos e começo a limpar o balcão. — Ainda não criei coragem.

— E com a senhora Bell?

— Não há muito mais o que falar. Estou há cinco meses com o aluguel atrasado, ela não pode esperar eternamente.

— O que ela te disse?

— Que se eu não conseguir o dinheiro de, pelo menos, três meses de aluguel até sexta, ela não terá outra opção senão me despejar.

— Queria tanto poder te ajudar, Lisa.

— Eu sei, Kim... Eu sei. Mas fique tranquila, eu darei um jeito. Eu sempre dou um jeito.

— Por que não liga para seus pais?

— Quando decidi sair de casa, prometi que me viraria sem a ajuda deles.

— É uma promessa estúpida. Sabe disso, certo?

— Se não fosse estúpida, não seria eu a prometê-la.

— Nisso você tem toda razão.

— Uau! Que bela amiga eu fui arranjar! — Ironizo. — Em minha defesa, senhorita Cooper, tenho a dizer que eu estava indo muito bem até seis meses atrás.

— Ah, é claro que estava.

— Olhe só, está sendo irônica! - Jogo nela o pano que estou usando.

ImperfeitosOnde histórias criam vida. Descubra agora