Capítulo 17 - Fome

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Em mais uma manhã de sol forte e calor intenso, Betinha caminhava pelas ruas do movimentado centro gritando "Vassoura! Olha a vassoura! Promoção". De repente, Betinha apenas se lembrou dos R$1.000 que havia recebido pelas fotos que tirou, lembrou como havia dado todo o dinheiro para Cachorro Brabo e se sentiu imediatamente muito infeliz por isso. Ela andou mais um pouco, com o monte de vassouras que carregava, se tornando bem pesado. Olhou para cima, para o sol tão brilhante que cegava e assim começou a se sentir tonta e mais tonta até que desmaiou. Ela caiu no meio da rua e um carro freou violentamente para que não passasse bem em cima dela.

Betinha não fazia ideia de quanto tempo havia ficado desacordada. De repente ela foi despertando devagar com um monte de gente ao redor dela, parando o trânsito e algumas mulheres iam salpicando gotas de água bem gelada no rosto dela, molhando a sua nuca e os seus pulsos. Betinha já levantou preocupada com as suas vassouras, com medo que tivessem se aproveitado para roubar as suas mercadorias, mas tudo estava ali. Ela nem fez pausa para descansar. Precisava continuar a andar para vender e fazer dinheiro. Agradeceu a todos que haviam a ajudado, mas rapidamente seguiu o seu caminho, até porque ela sabia porque havia desmaiado. Completava 24 horas que ela não comia absolutamente nada, já que agora realmente não havia qualquer comida em sua casa. Betinha desmaiou de fome, mas seguiu em sua batalha porque era necessário.

O que também movia Betinha era a esperança de dias melhores. Mas especificamente, ela estava com altíssimas esperanças para o novo trabalho que a agência de modelos de Robert Munsh havia dado para ela e que aconteceria naquela noite mesmo. Betinha foi convidada para ser modelo em um desfile de moda.

Às sete horas da noite, Betinha se despediu da mãe e seguiu para o ponto de ônibus tão distante. O desfile estava marcado para nove horas da noite. Eldora ainda ficou ali de pé em frente à porta acenando para Betinha, se despedindo da filha de quem tinha tanto orgulho. Quando Betinha desapareceu de vez virando a esquina ao fim da rua, Eldora fez o movimento para entrar em casa, mas foi quando dois motoqueiros vieram fazendo muito barulho e pararam bem em frente à porta dela.

— Vem com a gente, Dona Eldora. Quietinha, comportadinha. Ninguém aqui vai falar duas vezes – o motoqueiro com a voz sinistra e capacete disse para ela.

— Vocês estão vindo a mando do Cachorro Brabo? – Eldora ainda perguntou.

Os homens logo cumpriram a promessa de não repetir a ordem e o que o segundo motoqueiro fez foi erguer a metralhadora que escondia e apontou para Eldora.

Ela então levantou as mãos e, apavorada, sentou-se na garupa da moto. Foi embora com eles. Seguiram lá para o alto da colina, para o casarão de Cachorro Brabo. Tábata, a vizinha fofoqueira que tomava conta da vida de todos, havia visto tudo do cantinho de sua janela.

Era só a primeira vez que Betinha desfilava na vida, mas ela se saiu tão bem, se divertiu tanto, posou perfeitamente para fotos e recebeu elogios das modelos tão profissionais e já com anos de experiência.

Ao fim do desfile, todas as modelos só se preocuparam em correr atrás dos fotógrafos para conseguir mais fotografias suas, mais exposição na mídia, mas quando Betinha viu aquela mesa de bufê cheia de comida montada nos camarins dos bastidores, o que ela fez foi correr até a mesa e começou a devorar mini pastéis, bolinhas de queijo, pedacinhos de frutas. Sentia tanta fome, comia com tanta pressa que até corria o real risco de se engasgar.

Quando Robert Munsh se aproximou dela para dar o cheque de seu pagamento pelo trabalho no desfile, Betinha se sentiu envergonhada.

— Está tudo bem? – Robert a perguntou.

— Sabe o que é, senhor Robert? É que... Poxa, eu fico assim até com vergonha de pedir para o senhor, mas seria possível... Seria possível que o senhor deixasse que eu levasse uns dois pasteizinhos desses para a minha mãe?

O coração de Robert Munsh se partiu naquele instante e ele lutou para não mostrar lágrimas, porque entendeu pela primeira vez a situação pela qual a jovem passava.

— Quer saber, Betinha? Vamos fazer melhor. Eu vou buscar um caixinha de isopor e nós vamos montar uma boa refeição para você levar para a sua mãe, com tudo o que tem direito, um pouco de cada coisa dessa mesa.

— Obrigada, senhor Robert – Betinha agradeceu emocionada.

O celular velho de Betinha tocou nesse instante e ela foi para fora do grande teatro onde o desfile aconteceu para atender. Ela não podia acreditar que era a trapaceira Tábata que a telefonava.

— Você perdeu a noção do perigo, sua vagabunda? Depois do que aprontou pra cima da minha mãe, como ainda tem coragem de me telefonar? – Betinha brigava ao telefone.

— Cala essa boca, sua irritadinha, porque é sério o que eu tenho pra te falar. Escuta. Acabei de ver dois capangas do Cachorro Brabo levando a tua mãe. Obrigaram a velha a montar na moto e levaram. 

Agora enquanto Betinha estava de pé ali fora, muda com aquela notícia chocante, ainda usando o lindo vestido preto do desfile com volumosa saia rodada e transparência no decote, foi quando Dalton chegou ali. A sua empresa era uma das patrocinadoras do grande desfile. Como ele não se interessava pessoalmente por tais eventos, fez questão de chegar quando já tivesse terminado. Agora ele estava a pouquíssimos metros de distância de sua amada. Tudo o que Betinha precisava fazer era se virar de costas para que eles finalmente se vissem novamente depois de todo aquele tempo.    

Vestido usado por Betinha

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Vestido usado por Betinha.


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Os Corações Sobreviventes - Capítulo 001 a 200Onde histórias criam vida. Descubra agora