Capítulo 27

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Após abotoar as ombreiras, eu prendi as medalhas coloridas na lapela do casaco. Quando verifiquei diante do espelho do banheiro, quase não me reconheci. A roupa ficou impecável, e com o cabelo alisado a gel eu parecia mesmo um príncipe.

Imaginar a empolgação do Maikon ao me ver dissipou minha angústia. Nós dançaríamos no baile de formatura e, por uma noite, viveríamos o nosso próprio conto de fadas. O amanhã era o amanhã.

Enquanto eu lutava para vestir minhas botas longas, ouvi uma batida na porta. Eu me apressei em esconder a mala sob a cama e destranquei a fechadura. Era o papai Gabe.

"Uau, é um prazer conhecê-lo, majestade." Gabe prestou reverência, com um olhar divertido e impressionado. "Além de desenhista, meu filho é um grande costureiro."

"Obrigado, papai. Acha que o casaco ficou muito curto? Não quero parecer indecente." Eu me torci, tentando olhar para minha própria bunda. A legging branca apertava os músculos nos lugares certos.

"O Maikon vai ter um infarto." Ele riu, me conferindo várias vezes enquanto eu desfilava no quarto. "E acho que você também. Um certo sobrinho meu não economizou nas rendas e veludos. Alisson nem conseguia falar no telefone."

"Não conta, não conta! Nós prometemos surpreender um ao outro." Falei, borrifando meu melhor perfume de hortênsias e limão enquanto procurava as abotoaduras. "Perdão pela correria, estou quase atrasado e ainda preciso passar no Maikon."

"Eu sei. Vim oferecer um transporte mais rápido." Ele disse.

"Ah, agradeço a carona, mas prefiro ir andando. Meus colegas..." O tilintar de uma chave ganhou minha atenção. Quando olhei ao papai Gabe ele brandia um molho de chaves na mão, com um sorriso vitorioso.

Meu queixo caiu. Aquelas nem eram as chaves da Mercedes dele.

"A Ferrari azul do papai Dylan? Ele não me deixa nem tocar no volante." Falei, segurando o peito de emoção. "Não posso, ele iria descobrir."

"Foi o Dylan quem sugeriu, na verdade. Ele concordou que os príncipes mereciam uma carruagem."

Eu peguei as chaves, sem acreditar. Eu chegaria ao baile dirigindo a Ferrari? Maikon se jogaria nos meus pés e nunca mais levantaria.

"Sinto que tem dedo seu nessa história." Falei radiante, apreciando o peso das chaves no meu bolso.

"Eu lido com aquele peixe há dezoito anos, Hian. Já aprendi quando puxar o anzol." Papai Gabe piscou pra mim, deixando o quarto. "Só não corra demais. Ainda não quero encontrar seu corpo num pântano em chamas."

"Pode deixar." Eu ri, acenando a ele.

Droga, a bondade do papai Dylan só serviu para abalar minha convicção. Mas eu não podia mudar de ideia, meu futuro com o Maikon dependia daquilo.

Agoniado, eu peguei meu passaporte, meu celular e todos os documentos e guardei nos bolsos. Àquela hora meus pais costumavam se recolher ao quarto, então eu tirei a mala de seu esconderijo e carreguei para fora, silencioso como um gato.

Carregando a mala com todas as minhas forças, consegui descer a escada sem emitir um som. Do lado oposto da sala avistei a porta de entrada, e a minha liberdade.

Assim que dei o primeiro passo, porém, ouvi um ronco baixinho que gelou meu sangue. Pelo visto papai Gabe não brincava com suas ameaças, papai Dylan estava mesmo dormindo no sofá.

Na ponta dos pés, eu atravessei aquele espaço grande demais, buscando pisar nos tapetes onde fazia menos barulho. A mala pesava cada vez mais e logo meus braços cederiam. Eu não podia demorar.

Ondas em Rebentação (AMOSTRA)Onde histórias criam vida. Descubra agora