TRINTA E UM

106 13 4
                                    

A vida é imprevisível. E frágil.
Um momento, um descuido, uma escolha, pode mudar tudo. Ou acabar com tudo.

Garanto que essa pessoa rodeada por flores neste caixão preto lustroso, não pressentiu que naquela manhã tudo se acabaria. Que a sua história chegaria ao fim. Que o último capítulo do livro de sua vida, seria concluído. E exatamente por não saber, deve ter agido como em todos os outros dias de sua amargurada existência. Não posso afirmar como se seguiram os fatos que antecederam a sua queda, mas posso deduzir que talvez tenha tratado todos que passaram por seu caminho com frieza, ou gritado com a cozinheira por ter lhe servido o café "frio e sem açúcar", ou simplesmente ao acordar, se levantou de sua cama e tomou a fatal decisão de que aquele seria o dia em que finalmente expulsaria Brenda do palácio.

Teria sido diferente se ao invés disso, tivesse ido para fora apreciar o jardim, ou passado a manhã ao lado de Matthew. O filho esquecido e subestimado.
Se tivesse optado por tais coisas, teria evitado que o pior acontecesse.

Escolhas. Elas determinam muitas coisas.

E agora, não há nada mais que se possa fazer.

Rainha Angelique se tornará apenas uma lembrança de uma pessoa frivola e egocêntrica, que um dia conheci.

Aperto o ombro de Matthew, que está ao meu lado tentando conter o choro, enquanto observo à nossa frente, rei Ignatius que se apoia no caixão choramingando, enquanto pronuncia um discurso ensaiado.

- É com muito pesar que hoje vos falo- ele se dirige a pequena multidão a nossa frente- do acidente fatal que tirou a vida de minha amada esposa.

O silêncio aterrador que preenche o salão é intenso. Lembro-me como se fosse ontem, do baile que ocorreu aqui, no dia do meu aniversário. São duas situações tão distintas que compartilham do mesmo local, das mesmas pessoas e da mesma sensação estranha que tive aquele dia.

- Eu não tenho palavras para descrever o que sinto. A dor é tão grande que- ele se engasga e pausa por alguns segundos- me desculpem- respira fundo, enquanto Matthew vai para o seu lado lhe dar apoio.

Olho para meus pés, para disfarçar meu desconforto e impedir que as pessoas vejam minhas expressões. Não estou triste e nem sequer consigo fingir algum tipo de comoção por esta mulher frívola e superficial, que era a rainha Angelique. Nunca desejei sua morte, ou que algum mal pudesse lhe acontecer, mas o destino quis que fosse assim. E nada disso muda meus sentimentos.

- Uma água por favor!- Matthew indica para um guarda, que rapidamente o faz e sob o palanque com um copo na mão.

Observo o rei trêmulo que segura o copo e bebe alguns goles. Não sei se isso é uma encenação ou se ele realmente está abalado.

Ontem, quando lhe contei a história toda de Brenda e disse que ela havia fugido do palácio- como eu havia previsto- imediatamente ele me pediu para que não comentasse isso com mais ninguém, visto que Matthew já estava muito abalado e que ele iria resolver a situação e no momento certo, contaria para todos. Concordei, pois apesar de estar à par de tudo, como testemunha, não quero me envolver mais do que já estou envolvida. E analisando o que aconteceu, vejo que não será nada fácil para ele admitir sua culpa, pois se não tivesse se envolvido com Brenda, provocando a fúria da rainha, que jurou expulsa-la do palácio e que consequentemente acabou sendo empurrada e caindo acidentalmente da escada, nada disso teria acontecido.

Mas como eu disse... escolhas.

Rei Ignatius é o único culpado direto pelo o que está acontecendo. Ele provocou tudo isso. Então, nada mais justo do que arcar com as consequências. Todos os que estão presentes aqui no salão, aguardam ansiosamente por uma explicação para a morte precoce e tão inesperada da rainha.

Em Busca da CoroaOnde histórias criam vida. Descubra agora