Capítulo 38

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Sentir Vitória se afastando do meu corpo e sumindo da minha vista foi doloroso num nível que eu não sei explicar ainda, uma semana depois de tê-la visto sendo abraçada calorosamente por Jaffar. Tudo em mim doía, meus olhos não ficavam secos por mais do que algumas horas na sala de cirurgia, mesmo que eu tivesse diminuído em 50% minhas cirurgias naquela semana. Bárbara tinha praticamente se mudado para minha casa e ela e Luana não me deixavam em paz um segundo sequer enquanto estávamos lá.

Eu queria sumir desde o momento em que Vitória me virou as costas. Tudo o que eu queria era que ela tivesse ficado, mesmo que em silêncio. Só...ficado.

Por sorte eu não tinha me encontrado com Jaffar ainda, talvez porque tinha decidido evitar o quarto de Ana Beatriz enquanto alguém estava lá com ela, e ainda agradeço por isso porque eu tinha jurado pra mim mesma que acertaria pelo menos um soco naquele rostinho.

"Pensamentos assassinos outra vez, Ana Clara?" Bárbara me puxou pelo braço, me levando direto para um dos quartos de plantonista naquele corredor. 

Babi sempre soube ler minhas caras e bocas, principalmente minhas caretas. Respirei fundo, evitando revirar os olhos. Olhos estes que tinham olheiras fundas e escuras, me fazendo parecer algum tipo de zumbi. Pelo menos eu tenho certeza de que Vitória está melhor do que eu, porque ela sempre está.

"Você e Luana poderiam fazer o favor de me deixar em paz?" Falei deixando transparecer o quanto eu estava irritada.

"Se paz significa querer causar estrago na cara de alguém ou passar horas chorando na cama, então não, não vamos te deixar em paz." 

A voz dela era calma e firme ao mesmo tempo, confortava o pouco do que tinha restado do meu coração. A falta que Vitória me fazia era como sentir um imenso buraco no peito, o qual eu não tinha ideia de como preencher. 

"Eu não aguento mais, Babi." Me rendi às lágrimas outra vez, minha voz quase sumindo completamente."Eu não consigo viver num mundo sem Vitória Falcão." 

Eu sentia meu rosto sendo molhado, minha boca seca e meu corpo tremendo dentro do abraço de Bárbara. Era como se meu mundo desmoronasse toda vez que meus pensamentos retornavam à Vitória.

"Shhhh...Calma, Ana, calma." Ela sussurrou me apertando mais contra ela. 

"Ela não sente minha falta? Ela já esqueceu de tudo que a gente viveu nesses meses?" 

Meus soluços ficaram mais altos, porque minha dor parecia triplicar todas as vezes que essas perguntas surgiam.

"As coisas não funcionam assim, meu bem." Era impressionante como ela conseguia manter a calma, talvez porque não estivesse doendo nela.

Me odiei no instante seguinte por ter pensado aquilo, Bárbara já havia passado por algo muito pior do que aquilo, ela tinha perdido a pessoa que ela mais amou em toda a vida e eu nem mesmo conseguia me imaginar vivendo num mundo onde Vitória realmente não existisse mais. Meu coração doeu, me encolhi.

"Por que você não vai falar com ela?" 

As palavras me atingiram em cheio. No meio do meu caos, eu nem tinha pensado em ir atrás dela, porque simplesmente não parecia a coisa certa a fazer, porque ela não tinha vindo atrás de mim. E ela parecia bem...Ela parecia não se importar...

"Está pensando muito outra vez." Bárbara chamou minha atenção.

"Acha que devo ir na casa dela?" Perguntei, sentindo a esperança súbita me atingir.

"Claro que não! Não pode ir atrás de Vitória parecendo um zumbi, assim ela vai achar que você está morrendo sem ela."

Estreitei os olhos. Como assim, não? Não consegui acompanhar a linha de raciocínio dela. Babi sorriu.

"Eu estou morrendo sem ela."

"Você só acha que está, mas ó, seu coração tá batendo normal, nenhum sinal de alguma doença fatal.. Então você vai tentar se manter o melhor que conseguir durante alguns dias e depois ir atrás dela."

Suspirei pesado

"E se até lá ela me esquecer e decidir ficar com ele? E se ela desistir de esperar que eu vá atrás dela?"

Despejei tudo de uma vez, sentindo as lágrimas voltarem a molhar minhas bochechas. Podia sentir que estava olhando para minha melhor amiga com a melhor cara de desespero que eu tinha.

"Aliás, por que não pode ser ela a vir atrás de mim? Afinal foi ela quem causou tudo isso!" Não dei tempo para que ela respondesse.

Talvez minha linha de raciocínio tivesse sido afetada por tudo isso.

"Para de esperar que as coisas aconteçam do seu jeito, Ana Clara, porque isso não vai acontecer com Vitória. Tudo bem que você seja insegura, ou que tenha ciumes, mas não seja orgulhosa. Não seja burra!"

Parei de falar e até prendi a respiração enquanto as palavras dela alcançavam meus ouvidos. Ela estava certa. Talvez tenha sido esse o único motivo em que eu realmente tenha parado para pensar racionalmente, como se tivesse sido atingida por uma onda de vento frio.

"Tudo bem." Disse mais pra mim mesma do que para ela, que me encarava em expectativa. "Luana me indicou a professora dela para fazer terapia, acho que vou aceitar."

Pude ver Bárbara sorrir aliviada, me abraçando em seguida. Pude me sentir mais leve, o que eu sabia que não duraria muito, mas duraria o suficiente para que eu conseguisse ir atrás da ajuda.

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